quarta-feira, 29 de setembro de 2010

TRANSBORDAMENTO — um poema de Roberto Corrêa dos Santos

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para o amigo Alberto Pucheu
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Não, não sai do poço a ideia.
Sábado, novembro, mil novecentos e noventa e cinco, morre, morre Deleuze.
Não, não se rompem o saber ou o movimento.
Seguem curvas os surfistas.
Doubles de interiores e exteriores.
Twistes e carnes para além dos corpos.
Ondas já antes e antes, e entre.
Deixar-se por elas agarrar-se.
Ido o mestre do surfe e do oceano, surfam aqueles sob o sol.
Face aos jovens em águas, ansiedade leve e júbilo.
Matéria e ritmo, outra maneira de pensar ali.
Frente a eles, disse o Surfeur, a filosofia está em causa.
Então porque esteve o rosto sorridente e a voz rouca, soube, de imediato soube.
Uma profundidade real na face sob ventos.
Correspondências há.
Que escrevam os que surfam.
Valham-se da arte dessa resistência.
Uma saúde precária naquele quase fim de hora? Não.
Ondas de Aquitânia tocam o apartamento em Paris.
Alguns números de Surf Session, Surfer's Journal .
Deluze lê e ri.
A cama do hospital navega.
Sonha-se com as velocidades por sobre azuis e verdes líquidos.
Tombam os organismos, jamais a vida.
E um homem, maravilhosamente exagerado na imanência do mundo, dorme.
Ondas e páginas, ondas em páginas.
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Roberto Corrêa dos Santos
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segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Poesia Brasileira: Processos e Percursos

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Poesia Brasileira: 1980 - 2010
Processos e percursos


Local: Auditório Pe. Anchieta (PUC-Rio)
Data: 29 e 30 de setembro de 2010
Horário: 14:00 – 18:30

Concepção e Coordenação Geral:
Júlio Diniz e Paulo Henriques Britto

Objetivo principal:
O Seminário Poesia Brasileira – 1980-2010. Processos e percursos pretende discutir tendências e transformações da poesia brasileira nas últimas três décadas, pensando a sua produção em diálogo com as tradições que a antecederam. Para que a discussão seja mais ampla e produtiva, convidamos poetas, pesquisadores, professores e críticos para debater a questão a partir de distintas percepções e leituras. Em diálogo com os críticos, os poetas convidados deverão refletir sobre seu próprio trabalho em relação ao de seus contemporâneos e ao dos poetas das gerações anteriores que são, a seu ver, os mais relevantes para uma compreensão do momento presente.

Programação:

29/09/2010 – quarta-feira

14:00 – 15:30
Mesa 1
Antônio Cícero
Eucanaã Ferraz
Ana Cristina Chiara
Mediação: Júlio Diniz

Intervalo

16:00 – 17:30
Mesa 2
Marcos Siscar
Marcello Sorrentino
Maria Lúcia Camargo
Mediação: Paulo Henriques Britto

18:00 – 18:30
Leitura de poemas dos seguintes autores:
Alice Sant'Anna
Ismar Tirelli Neto
Victor Heringer
Mariano Marovatto
Lucas Viriato


30/09/2010 – quinta-feira

14:00 – 15:30
Mesa 3
Heitor Ferraz
Fabrício Carpinejar
Alexandre Faria
Mediação: Ericson Pires

Intervalo

16:00 – 17:30
Mesa 4
Claudia Roquette-Pinto
Carlito Azevedo
André Monteiro
Mediação: Célia Pedrosa

18:00 – 18:30
Leitura de poemas dos seguintes autores:
Augusto de Guimaraens
Beatriz Bastos
André Capilé
Domingos Guimaraens
Dado Amaral
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domingo, 26 de setembro de 2010

Carroceiro — um poema de Raquel Naveira

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O carroceiro,
Homem-cavalo,
Puxa a carroça pela rua;
Será que dá dinheiro
Esse monturo de plásticos,
Papeis,
Cacos
E sucatas?

O carroceiro,
Cavalo-homem,
Chafurdou lixeiras,
Caçambas,
Em busca de metais,
Latas,
Restos de carros alegóricos,
Criou um mundo brasileiro
Que carrega às suas costas.

Lá vai o carroceiro,
Trotando,
Subindo ladeira,
Passando entre os carros;
Os olhos ardem,
O estômago pesa,
Engole fumaça,
Tudo nebuloso
Em meio ao chuvisqueiro.

Lá vai o carroceiro:
Bermuda,
Boné,
Camisa xadrez
Colada ao corpo;
Mal-estar
De viver assim,
Preso por ferros
A uma carroça,
Seu cativeiro.

Lá vai o carroceiro:
Dor nas pernas,
Nos joelhos,
Caminha rumo à favela,
Cortada por trilhos,
O trem passa,
As garrafas tremem,
Seu destino é de andadeiro.

Lá vai o carroceiro:
Empapado de suor
E gotas de esperança,
Logo virá a noite,
Quente,
Cheia de mosquitos
E sonhos de cachaceiro.

Lá vai o carroceiro,
Entre os entulhos
Esconde a faca,
A foice,
Porque há de se defender
Dos roubos,
Das armadilhas
Dos embusteiros.

Lá vai o carroceiro,
Disputa espaço
Entre as buzinas e as guinadas,
Ouve estranhas risadas
Que sobem dos bueiros.

Lá vai o carroceiro
Entre luzes
E gases,
O cheiro é acre
E escorre óleo no aguadeiro.

Alguém quase o atropela,
Xinga-o de maconheiro,
Ele cospe saliva verde,
Rumina a tristeza:
De quem será herdeiro?
Do homem?
Do cavalo?
Do tráfico negreiro?

Puxa carroça,
O carroceiro.
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Raquel Naveira
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sábado, 25 de setembro de 2010

A pequena chama — poema de Juana de Ibarbourou traduzido por Miguel Del Castillo

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Eu sinto um amor selvagem pela luz.
Cada pequena chama me encanta e me ultrapassa.
Não é cada lume um cálice que conduz
O calor das almas que encontra em sua jornada?

Algumas são pequenas, azuis, tremelicantes,
Iguais às almas taciturnas e bondosas.
Outras são quase brancas: lírios fulgurantes.
Outras, quase vermelhas: espíritos de rosas.

Respeito e adoro a luz como se fosse inteira
Uma coisa viva, que sente, que medita,
Um ser que nos contempla, transformado em fogueira.

Assim, quando morrer, hei de ser, a seu lado,
Uma pequena chama de doçura infinita

Em suas noites longas de amante desolado.
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Juana de Ibarbourou
("La pequeña llama", in Lenguas de diamante. Montevidéu, 1919.)
Tradução de Miguel Del Castillo
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Juana de Ibarbourou (1892-1979) foi uma poeta uruguaia incrível. Começou a publicar seus poemas apenas com 16 anos de idade, antes de se começar a falar em modernismo aqui na América do Sul. Embora sua poesia seja composta de sonetos, versos com métrica e rimados, Juana influenciou muito sua geração e seus sucessores, não apenas no Uruguai, mas em todo continente e na Espanha. O desnudamento sincero da alma — muito além de fórmulas prontas e pastelões — impressiona, ainda mais vindo de uma mulher naquela sociedade. Suas obras completas já foram editadas três vezes na Espanha pela Aguilar, e ainda assim Juana nunca foi traduzida no Brasil. Abaixo, o soneto original:
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La pequeña llama

Yo siento por la luz un amor de salvaje.
Cada pequeña llama me encanta y sobrecoge.
No será, cada lumbre, un cáliz que recoge
El calor de las almas que pasan en su viaje?

Hay unas pequeñitas, azules, temblorosas,
Lo mismo que las almas taciturnas y buenas.
Hay otras casi blancas: fulgores de azucenas.
Hay otras casi rojas: espíritus de rosas.

Yo respecto y adoro la luz como si fuera
Una cosa que vive, que siente, que medita,
Un ser que nos contempla transformado en hoguera.

Así, cuando yo muera, he de ser a tu lado,
Una pequeña llama de dulzura infinita
Para tus largas noches de amante desolado
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quarta-feira, 22 de setembro de 2010

2º Prêmio Paulo Britto de Prosa e Poesia

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O Prêmio Paulo Britto de Prosa e Poesia criado em 2009 chega à sua segunda edição. Como parte da programação da IX Semana de Letras da PUC, intitulada “Corpo, voz e estrutura em sala de aula e no palco", este concurso contempla os seguintes gêneros literários: CONTO, CRÔNICA e POESIA. Poderão participar estudantes de graduação e pós-graduação de toda a comunidade PUC-Rio.

INSCRIÇÕES

As inscrições serão realizadas até o dia 27 de setembro de 2010. O tema é livre e cada autor poderá submeter somente um texto por categoria. As categorias são: CATEGORIA PROSA (CONTO E CRÔNICA) e CATEGORIA POESIA.

Os textos devem ser inéditos e escritos em língua portuguesa, digitados em papel tamanho A4, em apenas uma das faces do papel e com as seguintes características:

PROSA: Os autores deverão utilizar fonte Times New Roman tamanho 12, com espaçamento 1,5 entre as linhas e todas as margens medindo 3 cm. Os contos não poderão ultrapassar o limite de 4 (quatro) páginas.

POESIA: Os autores poderão utilizar qualquer tipo de fonte, diagramação e espaçamento, desde que o texto não ultrapasse o limite de 2000 caracteres (sem considerar os espaços em branco).

É obrigatório o uso de pseudônimo, que deverá constar ao final do texto. Os textos inscritos nas CATEGORIAS PROSA E POESIA devem ser apresentados em 4 (quatro) vias cada.
Os autores que optarem por concorrer nas duas categorias deverão fazer a sua inscrição de forma independente, em envelopes diferentes. Os textos deverão ser entregues em um envelope grande e lacrado, identificado na frente com o nome do Prêmio e a categoria (PROSA ou POESIA). Dentro deste envelope os concorrentes deverão enviar um envelope menor, também lacrado, identificado na parte externa com o título do trabalho e o pseudônimo utilizado. O envelope menor deverá conter a ficha de inscrição como disposta no Anexo I, ao final do Edital. Não serão aceitos textos enviados por e-mail. As inscrições serão feitas somente no Departamento de Letras, no seguinte endereço:

PRÊMIO PAULO BRITTO DE PROSA E POESIA

Rua Marquês de São Vicente, 225
Edifício Padre Leonel Franca. 3º andar.
Gávea – Rio de Janeiro

PREMIAÇÃO

A ser divulgada.

PUBLICAÇÃO DOS TEXTOS FINALISTAS

Os textos finalistas serão publicados imediatamente no blog do Jornal Plástico Bolha e, assim que possível, no formato impresso em uma edição do Jornal Plástico Bolha. Os autores premiados com a publicação de seus textos deverão assinar um termo autorizando a publicação nos referidos blog e jornal e cedendo os direitos autorais para esta edição. Os direitos não são exclusivos e os autores ficam livres para publicar esses textos onde desejarem após a divulgação do resultado.

Outros itens poderão ser acrescidos à premiação, a critério dos organizadores do Prêmio e de eventuais parceiros ou patrocinadores.


COMISSÃO JULGADORA

Os textos inscritos serão avaliados por uma comissão formada por três professores do Departamento de Letras e por dois alunos bolsistas do PET-Let. A comissão é soberana e suas decisões são irrecorríveis, podendo inclusive decidir por não premiar os trabalhos inscritos.

RESULTADO

Os autores finalistas nas duas categorias serão comunicados até o dia 22 de outubro para que possam confirmar sua presença no local da premiação, que será realizada no encerramento da IX Semana de Letras, dia 28 de outubro de 2010.

DISPOSIÇÕES GERAIS

As inscrições implicam em plena concordância com os termos deste regulamento. Estão impedidas de concorrer pessoas diretamente envolvidas com a organização da IX Semana de Letras e com a organização do Prêmio este ano. Os inscritos que não atenderem às especificações deste regulamento serão desclassificados. Os textos enviados não serão devolvidos.
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terça-feira, 21 de setembro de 2010

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Viagem sonora — poema de Carolina Sims

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No dilúvio de águas frias,
Dançavam as medusas-da-lua, poetisas,
Leves em simetria radial,
Desiludidas em tamanho
Transbordamento.
A água longa que delas brotava,
Como lágrima desgarrada dos olhos,
Compunha poesias em meu mar infiltrado.
Que vendaval aquático percorre seus corpos
Transparentes;
Suas coroas de tentáculos prateados?
Somente sinos e estrelas cadentes,
Perfuravam suas rimas aquáticas.
Maré alta...
As medusas rasas, profundas, líricas,
Costuravam-se ao canto do mar, sem intento.
Sozinhas no burburinho do mar,
Entre peixes brilhosos e corais estrelados...
Na demasia de meu pensamento.
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Carolina Sims
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terça-feira, 14 de setembro de 2010

Mineirocarioca: Jornal Plástico Bolha em JF!

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Plástico Bolha fotografado por Thais Thomaz no Eco-Performances Poéticas de Juiz de Fora.
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sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Alguns versos por Ricardo Fernandes

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Não me embriago por incapacidade física
Não me incluo, por incapacidade ideológica
Reconheço na indignação, o cedro.
Na consciência, uma coroa.
O sentido é uma batalha.
A glória é parir o amor.
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Ricardo Fernandes
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segunda-feira, 6 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Versos eróticos — por Marina V. Medeiros

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In memoriam de Arnaldo V. Medeiros

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I.

Nas curvas do meu corpo
Tuas mãos tangem
Frêmitos pré-orgásticos
Tuas mãos abrem meu corpo
Para a entrada do teu
Tuas mãos
Donas do meu gozo
Cúmplices do meu desejo


II.

Meus lábios buscam teus beijos
E descem sôfregos atrás
Do jorro do teu corpo
Néctar do nosso desejo


III.

Nossa cama
Arena de nossos
Embates acrobáticos
Guarda os segredos
E o perfume
Do nosso amor


IV.

Dás à outra o que me pertence...
Uma sombra de culpa
Perpassou em teu olhar
Enquanto sussurravas: "perdoa".

Tuas mãos em concha colhem meus seios
E as brumas do ciúme e da mágoa
Esvaindo-se deixam ver
Teu membro hirto e fremente no qual monto
E num coito a galope
Tombo em teu peito arfante
Balbuciando: "amor, eu te perdoo".


V.

Nossos lábios presos num beijo ardente se separam
E tua língua, qual cobra ondulante, rasteja
Pelo meu corpo até a minha fenda aberta
Onde entra.

Teu membro pende qual teta enorme
Que empunho e, em movimentos rápidos de ordenha,
Faço jorrar teu sêmen que sugo
Com avidez.

Enquanto dois orgasmos
Violentos e simultâneos
Nos deixam semidesfalecidos.


VI.

Em fim.....
O casal de amantes
Entrelaçados com ternura
Seus desejos sexuais saciados
Sentem uma onda avassaladora
Invadir suas almas
De um profundo e imensurável amor.
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Marina V. Medeiros

Marina V. Medeiros é, na realidade, Marina Leão Teixeira Viriato de Medeiros. Viúva. 82 anos. Mãe de 8 filhos. Avó de 13 netos. Bisavó de um casal. Depois de viúva, resolveu botar por escrito as coisas que durante toda a vida pensou em escrever e não teve coragem.
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quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Lançamento de Idéias Lingüísticas

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Blow-up — texto de Paulo Henrique Motta

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Acordei naquele dia sem lembrar de nada do dia anterior. Caminhei até a sala. Vi minha mãe por sobre um monte de papeis de bala rasgados, bolas estouradas e doces pisoteados. Sua leveza me encantava. Era linda minha mãe. Dedicada e carinhosa. Pensou em todos os detalhes. Não hesitara em acordar cedo e limpar a sujeira que mais um ano da minha vida, que se arrastava, fazia em sua sala pequena. Estava tudo desarrumado e as coisas fora do seu lugar. Voltei meu olhar para o quarto, e meu pai ainda estava esparramado na cama. Olhei as fotos da noite passada por sobre a mesa. E chorei. Não consegui engolir o choro. Minha mãe encostou a vassoura na parede e alisou os meus cabelos, suave. Chorei de soluçar. Tentei respirar fundo para que o descontrole não rasgasse o silêncio da manhã. Mas meu pai despertou. Caminhou em minha direção. E me deu um tapa. Bem forte. A raiva que me atravessou o estômago não podia mais mudar a fotografia que eu tinha na mão. Ele seria para sempre a pessoa que ganhou o primeiro pedaço do meu bolo de aniversário.
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Paulo Henrique Motta
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quarta-feira, 1 de setembro de 2010