quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Homenagem à professora Claudia Castro

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por Claudia Castro
do departamento de Filosofia da PUC-Rio
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Comecei a ensinar ainda menina. Primeiro, para as almofadas de meu quarto de criança. Depois, quando apenas alguns anos me separavam dos olhos curiosos que tinha a minha frente. Passados quinze anos como professora nesta universidade, talvez possa perguntar: o que é ensinar filosofia? Há uma grande diferença entre o ensino que hoje realizo e minha brincadeira infantil de falar com as almofadas? Não seria esse prazer primevo a antecipação, já a elaboração da tarefa que um dia iria realizar e à qual dedicaria minha vida inteiramente? Hoje vejo que sim. Porque no trabalho de formação filosófica não é o conteúdo o que mais importa, aquilo que podemos chamar de saber e que traz consigo, freqüentemente, um poder mutilante e nefasto. Em seu sentido mais elevado, ensinar filosofia (se isto é possível) é, ao mesmo tempo, ter o privilégio de viver e suscitar uma experiência de parada, de interrupção no curso das atividades práticas e automáticas de nossas vidas, para que um pouco de ar fresco, livre, possa atravessar.
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Desde sua origem, os grandes pensadores concluíram que o pensamento puro é desprovido de utilidade. Ele é um momento de crítica, de indagação sobre o que somos e desejamos profundamente. E o professor enfrenta, a cada aula, o desafio de despertar esse sutil questionamento.
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Ensinar é, antes de tudo, amar. Entrar num movimento em que nos despojamos de tudo que nos caracteriza como um sujeito pequeno, “humano demasiado humano”, nas palavras de Nietzsche, e, nessa abertura, pensar-com, pensar junto aos espíritos com os quais o acaso nos colocou em relação. Espíritos que também se abrem para o pensamento que, de fora, os transforma, irreversivelmente.
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Assim, o trabalho do professor – que se inicia do zero a cada vez que ele adentra o espaço sagrado da sala, com as carteiras e a sua mesa, o quadro e o giz – se assemelha ao de um baloeiro que ensaia fazer subir um balão. Pois uma aula é como um balão. Se é boa, nos leva ao céu, para além de nós mesmos, até o reino mais perfeito da liberdade. Quando o balão consegue subir? Ele sobe se, inexplicavelmente, tanto o professor quanto os alunos, encantados com a magia misteriosa das palavras, tocam o insondável: a pergunta, sem resposta, sobre o sentido de nossas vidas.
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Publicamos aqui a coluna Aos alunos com carinho, da edição #16, como uma homenagem do jornal Plástico Bolha à professora Claudia Castro, do departamento de Filosofia da PUC-Rio, grande especialista em Walter Benjamin, que faleceu hoje pela manhã, no Rio, deixando muitas saudades em seus alunos.
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8 comentários:

Bianca disse...

Noticia muito triste recebemos hoje. No entanto, a honra de te-la conhecido foi enorme!
um beijo da aluna, Bianca

Unknown disse...

Claudinha, sua energia inspiradora permanecerá.

Mariana Velasco disse...

A Claudia foi a melhor professora que eu tive em toda a minha vida. Fico contente de um dia ter vencido toda a minha timidez e ter dito isso a ela. Não havia uma aula da Claudia que não fosse como um balão... tenho certeza de que todos os seus alunos compartilhavam esse sentimento.

Denise Vianna disse...

Ela agora mora só no pensamento,
ou então no firmamento,
em tudo que no céu viaja...

Agora ela é a chama da fogueira, brilhando como sempre, brilhando como nunca, além da materialidade...
Denise Vianna

daniela visco disse...

Fui uma grande amiga da Claudia ainda quando jovens, no segundo grau, momentos únicos que passamos juntas......marcados na minha alma!!! Agradecida pela sua existência minha querida amiga.....que sua alma esteja em paz e na luz todo o amor que houver nesta vida para vc neste momento de passagem....hari om tat sat

Maria do Socorro disse...

A Claudia ficará guardada para sempre nas minhas melhores lembranças.Uma profesora,uma AMIGA.

Rodrigo Verly Porto disse...

Para Cláudia Castro


Ela virou estrela

uma das mais brilhantes

ou está num planeta

de luz sempre constante

foi profa. na Terra

lecionava filósofos considerados malditos

mas extraía ensinamentos sempre artísticos

já me deixou saudade

mas sei que encontrará a felicidade

pois tudo com o amor fazia

e isso é pura poesia.

(Rodrigo Verlu Porto - um aluno)

claudinha disse...

Que notícia tão triste. Sem dúvida foi a melhor professora da minha vida. Estava pensando em voltar a estudar filosofia e deparo com essa notícia. Muita energia boa, força pra quem convivia de perto.