quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Hemingway e os lugares seus


Gabriel García Márquez diz em sua crônica “Meu Hemingway Pessoal” de 1981 - fácil de encontrar online - que só teve a oportunidade de ver Hemingway uma única vez, este já Nobel e nos finalmentes desta existência. Foi em Paris quando ainda não era o Gabo Nobel de Literatura.

Gabriel traz neste texto, dentre outras coisas, a ideia de que todos os instantes vividos por Hemingway, continuaram a lhe pertencer para sempre porque ele tinha um “inexorável poder de apropriação”, ou seja, que ele tinha a capacidade de tomar posse de certos lugares simplesmente por frequentá-los e mencioná-los em seus textos, pela força da sua passagem por eles. Deixava sua marca.

No entanto, essa ideia contradiz uma das minhas passagens favoritas do próprio Gabo no livro “Doze Contos Peregrinos” de 1992, um dos meus favoritos. No texto, ele diz que, inevitavelmente, depois de um tempo os lugares que haviam sido seus e sustentavam suas nostalgias eram outros e alheios. Gabo, 10 anos após o 1º texto, acha que até Hemingway está sujeito a isso.

Pensei nisso enquanto andava pelas ruas de Havana e fui aos bares que Hemingway mais frequentava na cidade quando morava em Cuba. Os famosos “Bodeguita del Medio” e “La Floridita”, onde ele gostava de tomar mojito e daiquiri, respectivamente, bares estes que foram também visitados por Gabo. Atualmente as biroscas não são mais biroscas e estão lotadas de turistas, grupos tocando “Guantanamera” e Buena Vista Social Club, cobrando preços acima da média nos drinks e celulares tirando fotos de tudo (o meu também, assumo).

E talvez esses lugares não sejam mais de Hemingway mesmo. Mas é realmente maravilhoso pensar no que ele fazia por ali enquanto tomava todas e fumava um charuto Cohiba, quais ideias teve, que contos iniciou e quantos rasgou naquelas mesas. Pensei nisso e acredito que, no final das contas, prefiro pensar como o Gabo mais novo, que talvez fosse menos amargo:
“Na realidade, Hemingway continua a estar onde menos se imagina 20 anos depois de morto, tão persistente e ao mesmo tempo tão fugaz como naquela manhã, que talvez fosse de maio, em q me disse adeus, amigo, da outra calçada do boulevard Saint-Michel.”

Afinal, como disse Hemingway: “o homem não foi feito para a derrota, pode ser destruído, mas não derrotado".


Eduardo Moraes

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