segunda-feira, 28 de junho de 2010

ESTREIA DO PLÁSTICO BOLHA NO CEP!!!

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A POESIA PROPRIAMENTE DITA

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ESPAÇO CULTURAL SÉRGIO PORTO

QUARTA – DIA 30 DE JUNHO

20:30 – 5 REAIS

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FLASH BACK 70

UMA SELEÇÃO INESQUECÍVEL

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20:30 vídeo: O BEIJOQUEIRO de CARLOS NADER

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21:00: relançamento do livro

“MUITO PRAZER” de CHACAL

ANA KUTNER e PAULO JOSÉ falam ANA CRISTINA CÉSAR

MASÉ LEMOS – poemas seus e de LUIS OLAVO FONTES

MARIANO MAROVATTO – poemas seus e de CACASO

CRISTINA FLORES e CHACAL – poemas do MUITO PRAZER

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AUGUSTO GUIMARAENS por AUGUSTO GUIMARAENS

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21:30: a estreia do PLÁSTICO BOLHA no CEP

uma homenagem a JAMES JOYCE.

com

ANDRÉ CAPILÉ lendo passagem de Stephen Dedalus

MARIANO MAROVATTO lendo passagem de Leopold Bloom

ISABEL WILKER lendo passagem de Molly Bloom

e a banda CAFÉ IRLANDA.

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É nessa quarta-feira a estreia do Espaço Plástico Bolha no CEP20000! Para começar por cima, decidimos aproveitar o Bloomsday, que foi no último dia 16, e fazer uma comemoração tardia e uma homenagem a James Joyce. André Capilé, que organiza a Eco Performances Poéticas de Juiz de Fora, fará sua primeira leitura no CEP com uma passagem do personagem Stephen Dedalus, o artista quando jovem. Mariano Marovatto, prata da casa, encarnará Leopold Bloom, o personagem fictício sobre o qual mais se sabe na literatura. Isabel Wilker, poeta e atriz, que está em cartaz com a peça Cinema, em São Paulo, aceitou o desafio de encarar uma parte do monólogo de Molly Bloom e seus sims! Tudo isso ao som de muita música irlandesa com a banda Café Irlanda, que tem a participação do nosso autor, Henrique Meirelles.
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PLÁSTICO BOLHA + CEP = Venham conferir no que vai dar!
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Mais que aquático — de Luiz Fernando Priamo

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Vivemos a era de aquários
anunciada por um musical gringo,
crescem peixes que beijam o vidro
e saltam em busca de um outro lado.
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As possibilidades remotas
importam mais do que a morte.
Anúncios de ofertas, ofícios e sorte
apagam a vida do outro lado que sufoca.
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Por mais oxigenada que seja a meta,
as guelras não suportam esse jogo.
Para não ser mais um, um estorvo,
é preciso negar o que nos cega.
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Luiz Fernando Priamo
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sábado, 26 de junho de 2010

O amante arrependido

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Oh, mui bela, tu
que me enamoras!
Para atentares não o romper
dar-to-ia, se por outra
não se rasgassem
do meu peito as fibras.
Rouba ela, pois,
meu ar e tu
novo fôlego me dás.
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Bruno Papito Nascimento
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quinta-feira, 24 de junho de 2010

Fahrenheit 451: Quando o cinema de Truffaut encontra a literatura de Ray Bradbury

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Sua mão,
com um cérebro próprio, com consciência
e curiosidade em cada dedo trêmulo,
tinha se tornado ladra.
Montag sabia que isso era loucura, suicídio,
mas era também um começo.
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A primeira edição de Fahrenheit 451 apareceu no mercado de livros de ficção científica, antes de 1955, com o título de Fire man. É só partir de 1953 que o nome foi enfim trocado, simbolizando – como apontado logo no título da ficha catalográfica -, a temperatura na qual o papel do livro pega fogo e queima. Seu autor, Ray Bradbury, foi radicado no campo da ficção científica, e é este o livro que o lançou efetivamente no cenário, embora já tivesse escrito ficções anteriores.
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O romance se passa em uma sociedade futurista onde os bombeiros são chamados para queimarem livros, objetos proibidos pelo Estado. O protagonista Guy Montag exerce essa profissão há 10 anos, quando conhece uma menina de 17, Clarisse, que começa a lhe questionar a validade do que faz, a despeito do pensamento de todos que lhe cercam. Basta algum tempo e a jovem some junto com a família; Montag ainda presencia uma cena em que uma velha é queimada pelos próprios bombeiros junto a sua biblioteca. Toda a conjuntura leva Montag a assumir a leitura para si mesmo, a roubar livros, pouco a pouco, enquanto executa-os em seu próprio ofício.
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Há uma explícita relação entre 1984, de George Orwell, e Fahrenheit 451: Ambas as obras são compostas por enredos conspiratórios em que um indivíduo se vê despregar da multidão social e perceber o esquema manipulador que o envolve; uma já anunciada alegoria crítica ao esquema bipolar pós-segunda guerra mundial aonde imperavam a guerra fria e seu esquema de aparências. Há ainda de se pronunciar a respeito do escritor inglês Aldous Huxley e de sua obra Admirável Mundo Novo, também integrante deste gênero ligado a "romances de censura", mesmo ainda que tenha sido escrita antes da segunda Grande Guerra. Enquanto Fahrenheit 451 teve sua primeira versão lançada em 1953, Orwell teve sua obra vista pelo publico em 1949 e Admirável mundo Novo ainda antes, em 1932. É particular da narração de Bradbury, entretanto, uma maior força na entrega ao gênero ficção-científica do que no caso de Orwell. Enquanto 1984 usa a estrutura futurista para compor o cenário da sociedade controlada, e, fatalmente, endossar sua pontual crítica, Bradbury o faz mais preso ao ímpeto do fascínio pelo gênero: Ler Fahrenheit 451 não é de perto intenso quanto 1984.
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Mas é no filme de 1966 do cineasta francês François Truffaut que o enredo ganha permanente imagem, projeta-se para fora do livro. Mesmo não seguindo rigorosamente a trama de Bradbury, o roteiro criado consegue dar conta da idéia principal: Algo na ordem de um livro tratando sobre uma sociedade que queima livros a fim de mostrar quão essenciais eles são e quão agressiva é a censura. Truffaut faz isso por imagens, deixando as folhas de papel se queimar vigorosamente em slow motion, pagina por pagina, criando fascínio e repulsa: a forma atraente do papel se queimando em oposição ao estúpido ato de fazê-lo.
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Por fim Montag integra a sociedade secreta de estudiosos que, ao invés de portarem os livros, são eles mesmos as próprias obras. A fim de fugir da censura, os estudiosos se empenham em decorar seu exemplar, exercendo o papel de transmiti-lo até a morte. As imagens dessa sociedade idílica que fica nos rumos dos trilhos enferrujados dos obsoletos trens, de alguma maneira, superam a descrição de Bradbury, dão o tônus que o livro não consegue criar, muito por ser uma ficção científica dos anos 50 percebida por leitores do século XXI: O futuro do passado. E Truffaut recria o ambiente ficcional ao seu modo, sem a obsessão americana pela tecnologia, mas atento à mensagem interna da realidade desdobrada pelos absurdos fascinantes que a ficção se propõe a criar.
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Fahrenheit é, portanto, um bom livro a ser lido e percebido hoje: carrega intensa carga crítica e faz refletir sobre os processos em que estamos envoltos, talvez bastante avessos aos processos que imaginávamos que estaríamos há 50 anos atrás. Entretanto, assistir em seguida ao filme de Truffaut confere mais imagens à narrativa, talvez perdida nas lacunas das mais de cinco décadas que separamos nós do lançamento.
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No posfácio da versão brasileira da editora Globo, com a primeira impressão em 2003, Bradbury confessa que a única forma que encontrou de escrever o livro foi recorrendo a maquinas de datilografar movida a fichas: ao se inserir uma moeda, o cronômetro e seu barulho relógio contavam o tempo restante. Logo, um romance contra o tempo e de alguma maneira para ele. É o que Fahrenheit nos dá, uma denúncia de como correu o tempo há algum tempo atrás.
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Finalmente localizei o lugar exato, a sala de datilografia no porão da biblioteca da Universidade da California em Los Angeles. Ali, enfileiradas havia vinte ou mais velhas maquinas de escrever Remington ou Underwood, que eram alugadas a dez centavos por meia hora. Você enfiava a moeda, o relógio tiquetaquiava feito louco, e você datilografava furiosamente para terminar antes que se esgotasse a meia hora. (...) Terminei a primeira versão em cerca de nove dias . Com 25 mil palavras, era metade do romance que acabaria se tornando”. (Trecho do posfácio)
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segunda-feira, 21 de junho de 2010

ODE AO ARTISTA (Adeus a Saramago)

Artista! Oh, curioso, faminto de mundo! Eterno insatisfeito. Rebelde contra o destino fatal das possibilidades transitórias e limitadas do humano.

És um louco que se recusa a ser esmagado pelo cotidiano enfadonho e teima em rasgar o tecido da realidade. Mergulhador fáustico que só se contenta quando atinge as profundezas abissais daquela extasiante perda dionisíaca de si mesmo.

Antítese ambulante, por que insistes em domar a realidade? Por que crias aquela outra “realidade”, para além dos sentidos, tão verdadeira quanto teus sonhos? O mundo real não te basta?

Paradoxo invencível, como haveremos de definir-te?

Talvez o epíteto de “teimoso incorrigível” lhe caiba, por ora. Prometeu desvairado, que mesmo sob a ameaça (terrível) de grilhões, abutres e dores lacerantes, ousa descortinar e gritar a grandeza gloriosa da raça humana.

Serás tu ainda aquele mágico primordial, feiticeiro, pajé, xamã; sacerdote que conduzia a tribo primitiva por um mundo (sur-)real ainda inexplorado?

Bendito sejas tu, primeiro caçador a se disfarçar, assumindo a aparência de um animal para escrever o ritual da caça. Bendito sejas tu, primeiro homem da idade da pedra, a assinalar um instrumento com uma marca, com um ornamento, com um símbolo. Bendito sejas tu, místico primevo, que, entre sacrifícios e rituais de encantamento, deslumbrado e fascinado, ousou dar sentido a tudo que o cercava, ordenando o caos.

Artista! Mesmo que não possamos mais evocar (ou invocar) o (Sara)mago daquela primitiva sociedade tribal (será?), ainda assim tu és o porta voz de toda a coletividade pois, quando crias, és servidor.

Abandona, em êxtase, o teu ego para ser eco de uma experiência maior. Apropria-te da máscara coletiva que traz à lume aquele inconsciente comum a todos nós e dá voz a toda uma raça. A raça humana.

Artista: eis aí seu munus publico, sua missão social.

Talvez a única definição que me resta é aquela que repousa no famigerado vocábulo grego pharmakon. Palavra ambígua que encerra um invencível paradoxo, exatamente como tu artista, que te negas, peremptoriamente, a deixar-te abarcar por invólucros, rótulos ou definições (que só fazem limitar, dar um fim...).

PHARMAKON!

Simultaneamente antídoto e veneno. Eis aí toda a equivocidade do humano. É nessa corda bamba, entre causa da doença e cura, entre droga benéfica ou maléfica, que certamente te encontrarei, eterno equilibrista que cambaleias entre o real e a ficção.

Artista! És Fausto; és bode expiatório. Vítima sacrificial, salvador e perdição; médico e portador da moléstia (humana, demasiadamente humana...) do desejo de transcender.

Faze teu ritual medicinal; que sejas, agora e sempre, o nosso remédio contra uma vida medíocre.

Vai, incorrigível romântico! Estanca a ferida do átimo que foge e escreve nela a tua obra imorredoura! Concede importância ao comum. Torna desconhecido o familiar. Confere mistério ao corriqueiro. Dá sentido ao absurdo.

Alquimista tresloucado! Transforma o físico em metafísico e assim (só assim!), rouba a centelha mágica e nos conceda, diante de tudo que é mortal, aquela singela parcela do infinito... aquela que nos cabe por direito.

Vittorio di Salerno

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Vittorio di Salerno é aluno do curso de Artes Cênicas da PUC-Rio

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Morre o escritor português José Saramago — uma mensagem de Cleonice Berardinelli

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Em seu Diário, no dia 3 de Dezembro de 1935, escreveu Miguel Torga: “Morreu Fernando Pessoa. Mal acabei de ler a notícia no jornal, fechei a porta do consultório e meti-me pelos montes a cabo. Fui chorar com os pinheiros e com as fragas a morte do nosso maior poeta de hoje...” Hoje, agora há pouco, neste dia 18 de junho de 2010, chega-me pelo telefone a notícia de que morreu Saramago. Não tenho pinheiros nem fragas para meter-me entre eles e ir chorar minha profunda tristeza, mas posso, pelo menos, dizer que estou chorando a morte do maior ficcionista de Portugal, um dos meus mais queridos amigos...
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Cleonice Berardinelli
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Mensagem da nossa Mestra Cleonice Berardinelli, leitora e amiga pessoal do romancista, que, em nome do Departamento de Letras da PUC-Rio, manifestou o sentimento de todos pelo falecimento do escritor português, Prêmio Nobel de Literatura, José Saramago.
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quinta-feira, 17 de junho de 2010

quarta-feira, 16 de junho de 2010

(de um outono chato) — de Tiago Ramos

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Os dias passam
andam quadras
viram meses
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anos
festas casamentos
nascimentos
gêmeos siameses
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e num dia qualquer
(de um outono chato)
você retorna
insensato
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sua palavra me vem novamente
Na hora no instante
insistente
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eu bobo louco
insolente
me derrubo de novo
nos seus pés
solenemente
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Tiago Ramos
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Tiago Ramos é nosso leitor de Maringá, PR.
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segunda-feira, 14 de junho de 2010

Poema — de João Lima

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A face impressa na folha.
As pálpebras dormentes
a saliva o pelo a ruga
infiltram o poema.

Palavras devoradas
na sórdida mesa com restos
de madrugada fria
unhas e fios de cabelo.

O lápis risca a raiz
a cal o caminho mais
curto até o raio de sol
incrustado na gelosia.

O que é meu está guardado:
coração sujo encouraçado
relógio tictaqueando insuspeito
no fundo de uma gaveta.
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João Lima
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Lançamento do e-book "O eu se escreve"

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Lançamento do e-book organizado pela pesquisadora Daniela Versiani (FAPERJ) que conta com a participão de vários doutorandos do Programa de Pós-Graduação em Letras da PUC-Rio, como nossa amiga de bolha Laura Erber.
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domingo, 13 de junho de 2010

O sonho de milhões — de Adriana Kairos

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Pela manhã, o sol morninho pediu licença a cortina da sala. Curioso, entrou pra espiar. A cortina bailarina de rendinha branca dançava ao som da brisa faceira que entrava pela frestinha da janela. Durante todo o dia só se ouvia os sons da casa: o relógio da cozinha e o seu tic tac, a boa e velha geladeira com o seu motor pestanejando num liga e desliga constante.
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À noitinha o sol se despediu, cumprimentou a lua, que também quis entrar pra ver aquela casa tão bonitinha, com suas coisinhas todas no lugar e um gostoso aroma de pinho. Então de repente, como um general forte e imponente a porta se abriu, titilando o molho de chaves sentinelas. Chegou o dono da casa! Ele entrou e nem reparou que a lua o visitava. É que estava cansado. Arrastava o corpo como se um caminhão estivesse em suas costas, mas estava feliz, estava em casa. Respirou fundo e reconheceu o seu canto.
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Ligou o som e espalhou música por toda parte. Escancarou as janelas pra noite entrar sem cerimônias e a cortina bailou ainda mais. Assoviava quando entrou no banheiro. Banhou-se em chuva quentinha com pedrinhas cheirosas de espuma. Enroladinho saiu de lá. Abriu uma gaveta amiga, de onde tirou uma malha com um cheirinho bom de sol, e a vestiu como a um abraço.
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Foi a cozinha e fez um pouco mais de barulho; esquentou algo pra comer. Satisfeito resolveu fechar a casa outra vez, mas agora percebera a lua e a convidou pra ficar. Amanhã tinha que voltar ao batente antes de ver o sol entrar pela janela da sala.
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Pulou na cama quentinha, tão fofa quanto uma nuvem. Aconchegou nas cobertas como quem se aconchega aos braços da mãe. Mas esqueceu a janela do quarto aberta e um vento traiçoeiro açoitou seus trapos fazendo-o acordar debaixo de uma marquise da Avenida Presidente Vargas.
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Adriana Kairos
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sexta-feira, 11 de junho de 2010

Outros orientes — um poema de João Inada

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Sou mais um bebadossóbrio,
carrego o intragável sabor disso,
imediatamente estendido em
dobras, envolto por espelhos,
ferindo a contradição que
refui.
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Sendo outros que não plural eu,
outros ser-em-si com singulares três sous
plurigêneros, ou quase
nóselemim,
o dele ele no meio
embernado.
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Devir a ser-me-ei
um só nó de nós teu meu antes mesmo de
— estar
oculto no de si me,
meu nariz acenando
a deus.
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João Inada
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João Inada já publicou um poema no Blog do Bolha e também estará em nossas páginas impressas na próxima edição.
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quinta-feira, 10 de junho de 2010

FOTO-BOLHA: Leitor de Plástico Bolha em JF!

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Victor Hugo lendo o Plástico Bolha na Eco - Performances Poéticas, de Juiz de Fora - MG, em foto de Thaiz Thomaz.
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quarta-feira, 9 de junho de 2010

Jogatina — um poema de Thiago Diniz

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Quando mulecote mandava bem no War
Hoje se o assunto é Damas eu sou Pro
Esse é meu Perfil falo pouco mas não mudo
Cara a Cara não iludo nem me Ludo
Pronto pro Combate acompanhado ou só
Perspicaz com a mão domino o Dominó
Imagem e Ação se fundem com beleza
Se Gamão ou não o importante é a destreza
Não preciso ser Detetive pra ter a clareza
Que no Jogo da Vida as cartas estão na mesa
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Thiago Diniz
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domingo, 6 de junho de 2010

Noruega — um poema de Rafael Mantovani

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na Noruega é assim:
o sono chega de trenó,
desembarca em pernas curtas,
traz uma mochila, diz que vai morar comigo.

ele tem o rosto de um cachorro
e um rastro escuro na barriga —
todos os nomes de lugar
escritos numa única lista.
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Rafael Mantovani
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sexta-feira, 4 de junho de 2010

Batom, escova de dente e revolver

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Los Angeles é a maior cidade dos Estados Unidos em extensão com mais de mil quilômetros quadrados e uma população em torno de oito milhões de habitantes, grande parte dessa gente alucinada por cinema e Bete Pacheco orgulhosamente fazia parte do time das apaixonadas, mas não era uma fã qualquer. Salvadorenha bonita de boca carnuda, cabelos curtos e corpo perfeito, Bete se mudou para L.A. nos anos oitenta e com apenas vinte anos após um rápido namoro com Pepe Escobar, um conterrâneo que trabalhava como chofer numa mansão em Beverly Hills, arrumou emprego de babá na casa de um lendário diretor de tevê. Tinha um jeito irresistível de sorrir cerrando levemente os olhos enquanto levava a mão à boca escondendo uma charmosa covinha no queixo que encantava qualquer um. Isso aconteceu durante a entrevista na fabulosa mansão do tal diretor de tevê, após quinze minutos de conversa foi contratada e apesar de ser uma pessoa puxada pro sério, bastava alguns instantes em sua companhia para deixar qualquer um ansiando por mais tempo ao seu lado. Adorava discussões sobre cinema e sobre o modo de vida americano, seus contrastes de cultura credo e cor. Não tardou para descobrir que seu patrão era um gorila, grosso insensível e destrambelhado. Don Dantzig com seu estilo autoritário tinha fama de sádico destruidor de talentos e não havia um ator dirigido por ele que não tenha sofrido humilhações e vexames no set de filmagem, mas sem nenhuma explicação o carrasco judeu caiu de amores pela desenvolta diva de El Salvador apaixonada pelo cinema e pela cultura americana. Morena alta e muito bonita, Bete era dona de uma disposição para trabalhar típica dos imigrantes que abordam a America e topam qualquer coisa para conseguir seu sustento na terra prometida, encaram qualquer trampo de merda como se o destino do mundo dependesse daquilo, se agarrando ao menor compromisso como se fosse a ultima salvação. Possuía cultura pra dar e vender podia esticar uma conversa apaixonada sobre cinema por horas a fio e suas opiniões eram sempre abalizadas, na maioria das vezes recheadas de fatos que a maioria das pessoas desconhecia. Nas reuniões entre amigos contava para uma platéia admirada que enquanto filmava “Apocalipse Now” nas Filipinas, Brando se envolvera com uma nativa cujo pai fora inspiração para que ele desenvolvesse seu personagem, o sombrio e enigmático coronel Walter E. Kurtz, que o ator Martin Sheen sofreu um enfarte durante as filmagens e que Laurence Fishburne mentiu a idade para participar do filme, ele tinha então apenas 14 anos. Vaidosa e obcecada com sua higiene pessoal Bete sempre levava consigo na bolsa além da escova de dente e batom um revolver de brinquedo para se defender. Havia sido assaltada certa vez em uma madrugada quando descia do ônibus em Los Feliz e desde esse dia nunca deixava a casa sem esses apetrechos além de um spray de pimenta para se defender. Bilíngüe, lia tudo sobre cinema, adorava Chaplin e Elia Kazam, de Palma e Scorcese, entre seus atores preferidos gostava de mencionar Marlon Brando e Sean Penn, mas quem mexia profundamente com seu espírito era Mel Gibson. Para Bete não havia lugar pra mais ninguém em seu coração, ela pertencia a Mel e a ninguém mais, aqueles olhos azuis, o corpo malhado e o semblante austero lhe caiam bem e para Bete inspiravam um romance insano ao mesmo tempo em que a confortava. No hotelzinho da Avenida Figueroa no centro de Los Angeles, perto de Little Tokyo, tradicional bairro japonês onde morava, para Bete todo mundo era artista. O mastodonte ucraniano da recepção era chamado de Arnold desde o primeiro dia em que ela botou os olhos no cara e cismou que ele era uma copia fiel do Exterminador do Futuro, o faxineiro franzino de olhos azuis e dentes mal cuidados para ela era igual a James Dean, uma das arrumadeiras se parecia com Natalie Wood e a do turno da noite, Liz Taylor. O crioulo chefe de cozinha lembrava Denzel Washington, o guarda noturno Wesley Snipes, e a telefonista bocuda de pernas finas, Julia Roberts. Bete chamava a todos pelos seus nomes “artísticos” e a galera parecia gostar daquilo porque nunca houve reclamação. Passou a escrever roteiros e sonhava em entregar sua ultima criação, uma historia com o estranho titulo de “Os olhos corajosos de um católico beberrão” para o diretor de Coração Valente. Numa tarde de domingo Bete leva o maior susto de sua vida, quando buscava seu carro no estacionamento do Beverly Center enxerga Mel Gibson em carne e osso deixando o local pilotando uma Porsche prateada e decide segui-lo. Algumas quadras adiante o ator para no El Torito de Beverly Hills e deixa as chaves com o manobrista, Bete faz o mesmo. Àquela hora do dia o lugar estava deserto, depois de meia dúzia de margueritas e alguns shots de tequila ele deixa o restaurante mexicano e, chapado, toma o rumo de Malibu, só que na hora agá para desespero da proprietária Mel entra numa casa parecida com a sua e desaba no sofá da sala depois de esvaziar uma garrafa de tequila. Bete ficou por ali mais um tempo e quando viu o ator meio cambaleante entrar no carro da policia foi pra casa arrasada pensando que seu ídolo não merecia aquilo. No dia em que Mel Gibson finalmente iria ganhar sua estrela na Calçada da Fama, Bete acordou cedo, desassossegada não conseguiu se concentrar em nada desde a manhã até à hora em que tomou o ônibus para a Hollywood Boulevard no fim da tarde e quando chegou ao Teatro Chinês tinha uma pequena multidão de fãs esperando o ídolo australiano. Mel chegou cercado por um time de seguranças, recitou alguns lugares-comuns no discurso de agradecimento e antes que a multidão pudesse soletrar “A paixão de Cristo”, já tinha ido embora. A tarde caiu triste como um samba de Ataulfo Alves e Bete foi envolvida pela melancolia da noite que se aproximava, o céu cinza e poluído despachou uma garoa fina para contar àqueles mortais que o show havia acabado que era hora de tomar o rumo de casa e retomar a sua aborrecida rotina diária. Seu ídolo já havia sido adulado o suficiente e agora se dirigia a algum restaurante elegante na Sunset Plaza para festejar com amigos e familiares. Na volta pra casa Bete foi assaltada por um ladrãozinho rastaqüera que ao ver um carro de policia passar se desesperou e sem querer apertou o gatilho do Smith Wesson enferrujado. Bete morreu no local, ao cair na sarjeta sua bolsa se abriu despejando na calçada o batom vermelho sangue, uma escova de dente e o revolver de água.
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Sergio Mello
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terça-feira, 1 de junho de 2010

Eco - Performances Poéticas completa 2 anos

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O feriado bate à porta, mas a poesia não tem folga.
Dia 03 de junho, o Eco - Performances Poéticas completa dois anos
e traz para os palcos da cidade um elenco gringo:

Alice Sant'anna,
Lucas Viriato
e Os Sete Novos
[Augusto de Guimaraens Cavalcanti +
Domingos Guimaraens + Mariano Marovatto]

Além dos poetas cariocas, Pedro Paiva na discotecagem
e o clássico, esperadíssimo e insubstituível
MICROFONE ABERTO
(traga suas poesias!)

É na quinta, 03/06, 20h, no Mezcla.
ENTRADA FRANCA
EM JUIZ DE FORA!
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