segunda-feira, 31 de março de 2014

Problemas Urbanos


                As cidades não são feitas dos degraus que compõem a rua em forma de escada ou da perfeição dos arcos dos pórticos, ou ainda das lâminas de zinco que recobrem os tetos. As cidades são feitas das relações entre as medidas de seu espaço e os acontecimentos do passado. Assim Marco Polo se refere  a Zaíra, uma das cidades invisíveis de Calvino.

                Visitando recentemente algumas cidades italianas, percebi a dificuldade de se compreender essas relações, nesse caso a numeração dos prédios em suas ruas. Em Turim, o hotel em que minha prima e eu estávamos hospedadas ficava no número 166 da Via Ormea. Pelo mapa que nos preocupamos em adquirir logo ao chegarmos à cidade, podia-se observar que a rua era longa, mas a partir do ponto onde estávamos, número 2, a distância a percorrer não seria mais do que duas ou três quadras. Aos poucos fomos percebendo que a estranha numeração inclui letras que podem chegar ao alfabeto inteiro a cada número, dependendo de quantos complementos um prédio possua: loja, sobreloja, garagem, apartamento. Isso nos fez andar cerca de uma hora na mesma rua até encontrarmos o nosso número, a essa altura tão desejado.

                Acostumadas que somos ao sistema métrico da numeração na maior parte das cidades brasileiras, não sabemos os motivos que determinaram outras escolhas em outros tempos. E apoiadas nesse conhecimento, comentamos com um motorista de taxi, ainda em Turim, a dificuldade que tivéramos para nos localizar na cidade, acrescentando a informação sobre o sistema brasileiro muito mais fácil de entender. O homem se ofendeu, disparando que os brasileiros mal chegam e já se põem a criticar o que encontram (ou melhor, o que não encontram), pensam que são os sabidos e eles os ignorantes. Concluiu com uma enérgica preleção sobre a facilidade deles para localizar um endereço – entre duas ruas conhecidas, por exemplo, razão pela qual ele não se deixa enganar por falsas informações daquilo que não existe. Depois disso, ficamos bem quietas e assim permanecemos até descer do taxi.
                Dias depois, em Roma, novamente chamamos um taxi por intermédio da recepção do hotel – na Itália o atendimento é feito somente por chamada, de maneira que se o turista estiver na rua sem um telefonino, está perdido. Nosso destino era uma igreja pouco conhecida dos roteiros turísticos onde aconteceria um espetáculo de canto lírico, fincada no meio de um quarteirão localizado na zona norte da cidade e que, felizmente, nosso condutor não teve problema para encontrar. Falante e educado, o autista nos deixou em uma esquina próxima, mas teve a gentileza de nos explicar que sendo ímpar o número procurado, estaria em ordem crescente, enquanto a numeração do lado oposto seria par e decrescente. A confusão em nossa cabeça aumentou ainda mais.

                Porém, na volta para São Paulo, me movimentei a pesquisar o assunto. Descobri que o tema faz parte dos estudos da Geografia, modernamente da Geografia Urbana, que inclui a divisão espacial das cidades e sua identificação para uso oficial, por exemplo, para a correta cobrança dos impostos e taxas e distribuição de correspondência pelos correios. No entanto, cada país ou cidade escolhe seu método. Na Inglaterra as residências recebem nomes, em Nova Iorque os endereços são orientados pelos pontos cardeais, de modo que é fácil saber se fica do lado norte ou sul da cidade, em Brasília a divisão é feita pelo número do terreno dentro de uma quadra e essa dentro do lote. Outros sistemas também são encontrados, mas o que prevalece no ocidente é a numeração pelo sistema métrico.

                O que impressiona é que no velho continente ainda persistam sistemas criados há séculos, como o indecifrável método de numeração dos imóveis nas cidades. É possível que em Turim e em Roma o sistema seja o mesmo de Veneza, onde a numeração das casas ocorre a partir do edifício mais importante ao seu redor, o que pode justificar que os números do lado ímpar sejam crescentes e do lado par decrescentes. Tudo começa e termina no mesmo ponto, ou com o mesmo nome. Sei que em nosso passado colonial essa questão foi resolvida mais ou menos dessa maneira, quando se deu numeração às residências no centro do Rio de Janeiro a partir do Paço Imperial, edifício que primeiro abrigou os fazeres administrativos do reinado de D. João VI no Brasil. Acabei sabendo também que atualmente as câmaras municipais de Portugal se encontram em fase de modificação do modelo de endereçamento, adaptando-o ao sistema métrico.

                Para compensar, no mesmo velho continente é raro se encontrar um telefone público, até para chamar um taxi. Ou se tem um telefonino, ou se está perdido no meio da Via Ormea!

Dalva Bolognini

Poderosa


Estava, como de costume, sentado a uma mesa de um famoso restaurante carioca, no Leblon. Gosto de me sentir um médico, ou um psicólogo, e fico observando os gestos, a postura, o comportamento e a conduta dos humanos que me acompanham, mesmo que distantes, nas refeições. Essa é uma espécie de experiência laboratorial que costumo realizar em locais públicos, sempre com um olhar crítico. Naquele dia, chamou-me atenção, primeiramente, uma criancinha muito linda, que tinha certeza ser autista. A pobre criança, totalmente indefesa, era maltratada por seus pais, que a faziam comer forçosamente, sujando a roupinha da menina. Um absurdo!

Fugindo dessa realidade imunda, olhei ao redor, procurando mulheres para examinar, até que visualizei um ser de outro planeta. Loira, com idade variando entre 20 e 25 anos, ma-ra-vi-lho-sa! Olhos verdes, corpo delgado, seios volumosos, mas não pareciam ser “siliconizados”. Falava como uma tagarela. Parecia sentar-se à minha frente, de tão alto que falava. Estava acompanhada de outra mulher, com quem interagia com entusiasmo. Levantei-me e esbocei dirigir-me à mesa delas. Parei. Resolvi terminar minha refeição. Continuava olhando com olhos de sedutor. De repente, nossos olhares cruzaram-se por milissegundos. Banquei o cortês, ela virou o rosto.

Aquela mulher me enlouquecia, me empolgava. Não podia ficar parado lá, sem fazer nada. As duas continuavam conversando. Nem pedi a sobremesa, e sim, a conta. Tive a ideia de pedir ao garçom que deixasse um bilhete naquela mesa, que ficava bem em direção diagonal, a uns cinco metros de distância da minha. Hesitei, achando que era coisa de filme, e as mulheres de hoje detestam clichês. Momentaneamente, as duas trocaram carícias. Seguravam de maneira confortável as mãos, numa atitude íntima. Terminaram as saladinhas. Eu já estava suando, primeiro por causa daquela situação, depois porque havia comido só comida gordurosa.

Levantaram-se. A companheira dela nem era lá aquelas coisas, mas era até bonitinha. Tinha cabelos castanhos, olhos escuros e média estatura. Pasmem! Quando a poderosa virou-se de costas, fiquei paralisado, como se uma serpente tivesse me envenenado. Não sabia dizer se a parte detrás era melhor que a frontal, e vice-versa. Acabei dando nota 10 para tudo aquilo. Após me levantar, apertei o passo e comecei a segui-las. Deixaram o restaurante e pediram que seu carro fosse trazido. Por um momento, distraí-me e comecei a trocar ideias com o cara do estacionamento. Fiquei feliz quando soube que o Botafogo havia ganhado o jogo da noite anterior, que não pude ver, devido aos trabalhos universitários.

Quanto me virei, atentando novamente a elas, me vi num dilema: não sabia se vomitava ao lembrar os mandamentos bíblicos e toda a intolerância da religião cristã quanto a desvios do divino, ou se ficava feliz por respeitar a pluralidade natural do sistema. Julguei ser a segunda opção mais prudente e consciente, em pleno século XXI. Eram duas mulheres maduras que traduziam, naquela hora, um amor intenso num beijo que colava suas bocas com Super Bonder. No início, desmoronei, porque os costumes dos séculos XVII e XVIII dominavam parte da minha mente. A outra parte era controlada por uma vontade incontrolável de mostrar que todos têm seu valor, independentemente de se sentirem atraídos por homens ou mulheres. O carro delas chegou, e foram embora. Estava muito apaixonado ainda. Minha mente discutia com meu coração, um duelo que parecia não terminar. Sem alternativas, sentei-me desolado no chão.

Felipe Cassar

quinta-feira, 27 de março de 2014

Lançamento do livro "A nova fase da lua"




Lançamento do livro A nova fase da lua — escultores populares de Pernambuco, de Flávia Martins, Rogerio Luz e Pedro Belchior. O livro traz depoimentos e registro fotográfico de 85 escultores, de suas obras e das condições em que vivem e trabalham, em 13 municípios que representam as grandes regiões de Pernambuco: Metrópole, Mata, Agreste e Sertão. Uma reflexão sobre a produção artística a partir da palavra dos escultores, da observação direta da pesquisa e do diálogo com outras referências institucionais e bibliográficas.

Trova


Tantas coisas boas na vida
eu já pude desfrutar.
E agora depois da lida,
A trova vou degustar.
Valter Mota é leitor-colaborador, tem poema publicado no desafio poético da edição #33, e é distribuidor do jornal Plástico Bolha na penitenciária de Tremembé - SP. 

quarta-feira, 26 de março de 2014

Fotografias e quarteirões


Pelas nossas fotografias
Observo um amarelo fecundo
Comendo as bordas
Afinal, envelhecemos juntos
Moramos na mesma casa construída
No mesmo palacete moribundo
Aqui, portanto, Tom Zé
Aprendo uma mensagem importante
Que  o mundo é infinito
É propulsor, molécula
Espaço espacial do zênite
Do orgasmo, das viagens
Dos Pêndulos Vociferantes

Ah, como vociferam as horas!

E de cada verdade te faz absoluto!!
E te geras uma mecânica orbital
Somos mesmos donos de nossa cabeça...
Ao nascimento, uma surpresa
Uma evolução seguida com sábia ventura
Neste enlace absoluto, o cético vacila
Questiona-se, há algo além do precipício?
Certamente que existe, há sempre outras vidas
Perpetuando-se, criando-se, exasperando-se

Não é mesmo assim que apregoam os religiosos cientistas?

Na base do cerne desta questão
Facas medulam, lâminas entrecortam entre si
Questões como cortam os salames
Temperados no limão da verdade
Afirmativas, declarações, assertivas
Derrubam-se com a mesma facilidade
Que migalhas de um pão envelhecido
Sob a geladeira, a esperança
Do alimente fecundo, a fome saciada
A verdade velada, a vida guiada

Pelas nossas fotografias, observo tua voz
Tuas músicas encenam a paisagem que teço
Aranha sobrenatural e poética
Sob as alamedas dos meus quartos
Te sigo resoluto, completo
Pelas ruas, quando caminho
Certo que há mais que uma vida após o quarteirão



Rafael Magalhães tem outros textos publicados no blog e no jornal Plástico Bolha!

terça-feira, 25 de março de 2014

Sarau "Da boca pra fora"



Em sua primeira edição de 2014, o sarau "Da Boca Para Fora" homenageará o poeta Manoel de Barros.

Os convidados desta edição serão os poetas João Pedro Fagerlande, Lucia Helena Ramos, Rodrigo Santos e Romulo Narducci.

O evento terá micorofone aberto no final. Traga seus poemas!

Leia mais informações sobre o evento na página do facebook: https://www.facebook.com/events/741992982486854/747103775309108/?notif_t=plan_mall_activity

Até amanhã


amanhã tu vai. leva junto
teu romantismo frank booth
e dedo mindinho a única parte
em que sobra amor. queria aninha ficando
comigo e narrar melhor o vácuo nas garras
do namorado. problema é que aninha não curte
ser aninha. vai pra máquina do tempo ouvir
algum hit dos anos oitenta filme de terror em
dose dupla na apresentação do zé. queria comer
uma palavra sobre os exércitos do crack mas estou
pouco musical num mês tão engarrafado. os amigos
viajam por meses namoradas por milênios cachorros
pelos segundos em que o rabo não cansa tivesse eu
o fôlego dos psicopatas. os pastores dizem ô drummond
meu filho sai desse corpo que não te pertence que os poemas
desse moleque gabriel graças a jesus também não. minha parte
consciente fica ofendida e quer briga mas drummond
que é morto forte e rei não me dá bola. porra carlos.

fim de semana tu vai. com um facão debaixo do braço
e uma máscara de halloween pra dar susto em todo mundo
que todo mundo te incomoda demais. olha beleza sim
mas depois não me venha pedir receita de microondas
ou aquele disco emprestado. vai mesmo embora que deus
proteja. se for pra fazer o seppuku faz direito não faz
esguelha com os comprometidos anota o telefone de casa
não morde ninguém se te chamarem aceita tá com calma
que recusa pode ir sem sangue por favor tua memória
é mesmo uma bosta.

Gabriel Resende dos Santos

segunda-feira, 24 de março de 2014

Abraço a Praça



O jornal Plástico Bolha esteve presente no Abraço a Praça, que aconteceu no dia 21 de março, na praça XV de Novembro, no bairro de Marechal Hermes, Rio de Janeiro, em homenagem ao Dia Internacional da Poesia. Diversos autores do Brasil todo puderam enviar seus versos para a festividade e, literalmente, abraçaram a praça em nome da poesia e da conservação dos espaços públicos.

Veja mais fotos do evento aqui.

Obrigado ao pessoal do Poeme-se e à Su Noguchi! Parabéns pelo evento!!

Viver


Viver
é discutir o indiscutível
inadequado e lírico
inexata exatidão
rajada de impossível.

É se entrevar
manipular estorvos
e conquistar montanhas
passo a passo
tropeçar
e do tropeço refazer o espaço.

Viver é se afogar
e em fogo renascer
no berço brando do amor
e desse amor
tantas vezes morrer
quantas for dado.

Dada Amorim

Águas furtadas, exposição de Laura Erber




quinta-feira, 20 de março de 2014

Ajude o Arranco de Varsóvia


O grupo Arranco de Varsóvia pede ajuda via crowndfunding para lançar seu CD. O Arranco apresenta: Andrea Dutra, Cacala Carvalho e Elisa Queirós — grande amiga do Plástico Bolha! —  nos vocais e Paulo Malaguti Pauleira no vocal, piano e arranjos. Ajude o grupo através do link: http://catarse.me/pt/arranco

Os escritores sempre se enganam


Quando nasce um escritor? Seria no sentido literal da palavra, quando ele é expulso do útero de sua mãe e grita o mundo a plenos pulmões? Ou seria o contrário? O escritor nasce quando dá a luz a sua cria, sua criação, cuidadosamente organizada em folhas de madeira de reflorestamento prensadas e impressas com a ordem do caos de palavras que ele encontrou? Afinal, o escritor é cria ou criatura? É uma antítese de dois? Uma aberração contra a ordem natural do universo?

Faço perguntas, mas a verdade é que eu sei a verdade. Sempre considerei essas ponderações de suma importância, embora nunca tenha perdido a noite pensado sobre isso. A verdade foi iluminada na minha cara, me atingindo como uma bala bem no meio dos olhos. Eu me questionei: Como pude não ter visto isso antes? O qual cego pude ser ao fechar os olhos só porque estava escuro?

A catarse veio enquanto eu lia. Era um livro pequeno, sujo, já velho, de título interessante e o mais importante, de segunda (ou terceira) mão. É bem sabido que os livros adquirem a sabedoria daqueles que o leem e sugam a daqueles que o escrevem. Pois bem, assim como a felicidade, a revelação vem de súbito, matando de susto os de coração frágeis. Quando me dei conta, havia resolvido um problema que desde muito me assaltava. Eu finalmente entendi o momento em que um escritor nasce.

É claro que minha experiência deve ser levada em conta, foi só quando percebi o que estava fazendo que o mistério foi resolvido. Vejam bem, abram os olhos e os ouvidos, fechem a boca e escutem: Os escritores sempre se enganam. Nunca veem o mundo com os olhos, mas antes com a mente. Criam situações e coordenam toda a história em suas cabeças de vento. As pessoas deixam de ser o que são e viram personagens cheias de nuances que não passam de farsas. Os lugares admitem novas interpretações e significados. Nem mesmo o voo de uma borboleta passa ileso pelos escritores (ah, eles adoram voos de borboleta, tão efêmeros e etc.)

Então veio o medo. Olhei o espelho e vi aquele moço, tinha os olhos nervosos, tinha a boca querendo mudar de lugar, e tinha um brilho cansado, meio capenga, sem rumo. Era um escritor. Eu finalmente me reconheci como um, e a primeira vista, não gostei muito do que vi.

Além de escritor, eu também tenho a ousadia de colocar as palavras no mundo e esperar que cada um se vire com elas. Pai irresponsável, eu sei. Nem todo escritor tem a coragem (seria burrice?) de infectar o mundo com sua esquizofrenia nervosa. A maioria simplesmente morre de implosão, os outros, como eu, de explosão.

Admito que o principal motivo que leva um escritor a de fato escrever, é a vaidade. Ela embriaga o ego com palmas e afagos. É a que adrenalina atingi os atletas, é o hormônio que sobe à cabeça no clímax sexual, é pura biologia.

Escrever, afinal de contas, é aceitar o animalesco. Se fantasiar de carnaval e viver quarta feira de cinzas.

Thiago Amorim

Vala



uma carne apodreceu escondida
na vala, cova úmida, onde
olhudos e frios
os sapos fodem

carcaça inflada
encalhada na terra
como desgraça e espera
das feridas abertas.

não há boca que denuncie
a cena. Grite o som
dos furos que
espalham a morte

falta socorro a justiça do
cheiro que suja a mata
a pele faz a casa dos ascos
queima e molha

orgânico
decompõe a mesa bandida
história sem saída, humana
perdida.

Hanna Halm

quarta-feira, 19 de março de 2014

Lançamento do livro "Arquivos pessoais"



Daqui a pouco acontecerá o lançamento do livro Arquivos Pessoais — reflexões multidisciplinares e experiências de pesquisa (FVG, 2014), organizado por Isabela Travancas, Joëlle Rouchou e Luciana Heymann, a partir das 19h, na Livraria da Travessa de Ipanema. 

Desencontros


A uma certa garota

Ó Tempo! Sábio Deus que me atordoas e mutilas!
Por que, Senhor dos Senhores, agora conheci a ela?!
Depois do alvo luar da noite que não perfila
Na aurora dos teus anjos o meu coração ao dela...

Por que Tempo?! Deus com sua etérea magia
Me abandonaste e no meu peito fizeste bater
Um Amor que ela nunca corresponderia
E nem na infinita eternidade há de corresponder?!

Por que a mim corres tão lentamente devagar?!
Por que, nesta angústia de sonho febril,
Há de no meu sangue fazer-se apaixonar
Um amor que para mim é tão triste e vil?!

Por que a mim negaste até o último suspiro?!
Por que na vida me mantiveste a viver?!
Se por ela o meu sonhar não mais miro
E por ela hei de existir no meu morrer!

Guilherme Ottoni

terça-feira, 18 de março de 2014

O incrível álbum de Picolina, a pulga viajante.



Lançamento do livro O incrível álbum de Picolina, a pulga viajante (Peirópolis, 2014), de Laura Erber e Maria Cristaldi. Dia 23 de março, às 16h, na Livraria da Travessa de Ipanema. Imperdível!!

Mas ainda há música



Durante uma semana rimos na mesma cama. Dormimos na mesma cama. Durante uma semana ele me fez acreditar que era o francês mais nordestino que eu conhecia com sua leveza de alma. No vento dos seus cabelos. No verde dos seus olhos. Com os momentos em preto e branco. Durante uma semana ficamos acordados na mesma cama e ele me disse ser filho de um pássaro quando enterrei os dedos nos cabelos dele como se fosse encontrar peixes. A torre Eiffel. O rio Sena. Labirintos. Durante uma semana tivemos tempo para cachaça e vinho e amigos e música alta. O girassol secou. Os grãos, todos, viraram pães e massas e tortas. Durante uma semana ele foi uma caixinha de ferro antiga de uma feira de antiguidade qualquer que guardei segredos e poemas e fósseis e marcas. Durante uma semana ele foi um encaixe perfeito na minha cama com seus amores formando e sua paisagem humana delirante. Não sei quantas semanas depois ele é como um barulho que vai sumindo ao longe e não se sabe precisar o momento exato em que se deixa de escutá-lo. Mas ainda há música.

Franck Santos


Franck Santos é leitor-colaborador do jornal Plástico Bolha da cidade de São Luís - MA.