quinta-feira, 29 de maio de 2014

Manequins


ninguém lembra de dar cor
ao olho
do corpo de plástico

mudo e magro
sonham dançar a valsa fria
com os bonecos da loja ao lado

dormem em pé
como cavalos

parasitas sem presa
sobras de nossa pressa

possuem a agonia das pedras
sem mar

a mesma cor de pele
de pêssego

não envelhecem

depois da bomba
resistirão ao medo
de barata

Fernanda Tatagiba

terça-feira, 27 de maio de 2014

Distribuição da edição #35 do Plástico Bolha!


A edição #35 do Plástico Bolha já está nas ruas, linda e recheada de deliciosos textos!! Veja aqui a lista dos locais da zona sul e da Barra da Tijuca  onde o jornal foi distribuído. Em breve, em muitos outros pontos do Rio e de outros 12 estados!!

- Espaço Cultural Sérgio Porto, rua Humaitá, 63 - Humaitá

- Locadora Cavideo, rua Voluntários da Pátria, 446 - Cobal do Humaitá

- Papelaria Papel aos pedaços, Largo dos Leões, 81 - Humaitá

- Cinema Estação Botafogo, rua Voluntários da Pátria, 88 - Botafogo

- Estação Espaço de Cinema, rua Voluntários da Pátria, 35 – Botafogo

- Escola de Danca Angel Vianna - rua Jornalista Orlando Dantas, 02 - Botafogo

- Audio Rebel – rua Visconde de Silva, 55 - Botafogo

- Catsapa Escola de Musicais - Rua Visconde de Silva, 59 - Botafogo

- Biblioteca Popular de Botafogo Machado de Assis, rua Farani 53 - Botafogo

- Banca na Praça Chaim Weizmann, rua Farani - Botafogo

-Livraria Arlequim, Praça XV de novembro, 48 - Centro

- Paço Imperial, Praça XV de novembro, 48 - Centro

- Escola de Cinema Darcy Ribeiro, rua da Alfândega, 5 - Centro

- Casa de Cultura Laura Alvim, Av. Vieira Souto, 176 - Ipanema

- Universidade Cândido Mendes, rua Joana Angélica, 63 - Ipanema

- Cantinella Massas, rua Gilberto Cardoso - Cobal do Leblon

- Botequim Bate-papo, Rua Gilberto Cardoso - Cobal do Leblon

- Universo Orgânico, rua Conde Bernadotte, 26, lojas 105 e 106 - Leblon

- Casa da Gávea, praça Santos Dumont, 116 - Gávea

- Espaço Move, Av. Armando Lombardi, 949, Loja C - Barra

- Studio Betina Guelmann, R. Cel. Eurico de Souza G Filho, 99 - Barra

- Restaurante Vice-Rey, Av. Monsenhor Ascaneo, 535 - Barra

- Restaurante Nativo, Av. Lúcio Costa, 1976 - Barra

- Padaria Pomar da Barra, Pç. do Pomar - Barra

- Restaurante Spetto Carioca, Av. Olegário Maciel, 135, loja D - Barra

- Papelaria Rosgolim, Av. Olegário Maciel, 260 - Barra

- Mundo Verde, Av. Olegário Maciel, 519 - Barra

- Mundo Verde (MAP), Av. das Américas, 10200 - Barra

- Mundo Verde (Shop. Novo Leblon), Av. das Américas, 7607 - Barra

- Jornais e revistas Requinte da Barra (Shop. Novo Leblon), Av. das Américas, 7607 - Barra

- Espaço Expansão (Shop. Barra Square), Av. das Américas, 3555 - Barra

- IBMR, Av. das Américas, 2603 - Barra

- 100 % Video Store (MAP), Av. das Américas, 10200 - Barra

- Tabacaria Candice Cigar Co. (MAP), Av. das Américas, 10200 - Barra

- Jornaleiro Val (MAP), Av. das Américas, 10200 - Barra

- Livraria Alegria das Letras (Shop. Barra Garden) - Av. das Américas, 3255 - Barra

Vinicius e Cabral: diamantes camaradas


no embate das pedras
e no amor das gemas
duas joias raras
entrecruzaram-se
dois diamantes lapidados
raros homens
de barbas rarefeitas
uma pedra cerzida
de recife outra carioca
desalinhada, escapista
sempre escapando
ao garimpo dos sonhos
vazando pelos rios
tornando-se mercúrio
tomando o mesmo
sol de dois canos
estas duas pedras
mutuamente se ornamentam
se reconhecem
dois diamantes natos
lapidados no sabor
das auroras

Rafael Magalhães


Rafael Magalhães tem outros textos publicados pelo Plástico Bolha! Em nosso blog, jornal e também na recém-lançada Antologia de poesia Plástico Bolha (OrganoGrama Livros, 2014).

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Colabore com o Projetação



O Coletivo Projetação está arrecadando fundos, através do Catarse, para continuar projetando imagens e instigar o debate político pela cidade do Rio de Janeiro! Conheça melhor o projeto aqui. E faça a sua contribuição através do link: http://catarse.me/pt/projetacao

Luta contra a concentração


Não quero prestar atenção nela. Nem em nada do que ela diz. Muito menos em seus padrões exacerbados. Nem em toda sua filha da putagem. (Espero que não leia esse texto, enquanto passa o olho em minha mesa para ver se fiz, ou não, sua tarefa) Tampouco prestar atenção em Lourdinha que coloca em sua garrafa térmica o café que acabou de fazer.

Não quero prestar atenção nela. Não é nada pessoal, só gostaria de entrar em um mundo paralelo e imaginar aquele casal indie, que eu sou fã, tendo um dia bom, pelo simples fato de serem perfeitos um para o outro. Isso me faz imaginar como as pessoas reagiriam à minha morte. Apenas por realmente estar morrendo. Morrendo de tédio. Morrendo de vontade de sair da sala, descer as escadas, passar pela porta do SAA e ir em direção ao ponto de ônibus. Pegá-lo. E depois de dois pontos, solicitar parada (temos o melhor transporte coletivo do país) e aí, simplesmente parar. Parar e esperar (parece que só fazemos isso em uma vida); esperar até cessar o tráfico de carros em via de mão dupla. Caso contrário seria atropelada e aí sim, com a minha morte concreta, as pessoas iriam reagir como imaginei (ou não). Culpariam meus, pobres, fones de ouvido. Aceleraria a morte de D. Ana. Ao saber da minha morte, morreriam de desgosto. Iriam morar na praia com suas respectivas amantes. Eu morreria aos 16 anos sem esforço algum, sem ter concluído o ensino médio, sem ter encontrado um monsieur Duvivier para construirmos uma vida juntos, sem ter viajado para a Austrália, sem saber como se come com palitinhos japoneses, sem saber o nome dos palitinhos japoneses. Alguns diriam que morreu jovem e olhariam para o corpo estirado no asfalto com compaixão, outros fariam vistas grossas.

Ou talvez eu esperaria com êxito e não seria atropelada, nem morta,nem culpariam meus,pobres, fones de ouvido, nem aceleraria o processo natural de morte de D. Ana, nem morreriam de desgosto ao saberem de minha morte, nem mudariam para a praia com suas respectivas amantes. E nem eu morreria aos 16 anos sem esforço algum, talvez concluiria o ensino médio, talvez encontraria um monsieur Duvivier para construirmos uma vida juntos, talvez viajaria para a Austrália, talvez aprenderia como come-se com palitinhos japoneses, talvez saberia o nome dos palitinhos japoneses. Talvez eu não sairia da sala, não desceria as escadas,não passaria pela porta do SAA. Nem terminaria esse texto. Nem esconderia isso dela. Nem tentaria disfarçar sua tarefa não feita. Nem fingiria prestar atenção nela... Melhor eu prestar atenção nela! Tem mais alguns minutos.



Flavia Norberto é leitora-colaboradora do Plástico Bolha, e tem outros textos publicados aqui no blog!!

quinta-feira, 22 de maio de 2014

XV Feria del Libro de Santa Cruz de la Sierra



Começa hoje a XV Feria Internacional del Libro de Santa Cruz de la Sierra - Bolívia!! O Plástico Bolha e o poeta Lucas Viriato estarão presentes! Em breve fotos e notícias do encontro!! 

Poema de quando um dia fui criança


Pintei um pinto
Um pinto um pouco um
Um ponto perto da pedra
Que pedra pequena
De tão pequena, me pegou
Pintei a pedra poderosa
Poder que partiu

Pobre do pintinho
De pequeno pra ponto
De ponto à parte

Partido, que pedra podre
O pintinho padeceu sobre a pedra
e que pedra...

Luan Carlos Machado


Luan Carlos Machado é leitor-colaborador e tem outros textos publicados no blog do Plástico Bolha!

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Alegria


Amar é muito mais do que amar a pessoa amada. É amar tudo o que nos cerca e, de repente, prestar atenção ao lado positivo das coisas, enxergando além dos contornos. É se sentir tão bem que a alacridade escapa ao nosso corpo, por mais que tentemos contê-la ou dissimulá-la, ecoa pelos nossos sorrisos, brilha pelos nossos olhos e flui através da nossa felicidade. Escancara-se, desavergonhada, em tudo o que fazemos e ameaça contaminar quem estiver por perto. Essa alegria vem embalada em todo um entusiasmo incapaz de ser refreado, um júbilo que preenche, domina, sublima. E então somos jovens novamente. Não importa se estamos no meio, no início ou no fim da vida: somos jovens. Não há intenção, explicação, discriminação. Um raio de luz nos atinge de repente e uma vivacidade pueril nos deixa, relutante, estúpida e descaradamente de bem com o mundo. Imersas em uma beleza magistral, todas as insignificâncias circundantes, subitamente, se tornam perceptíveis e interessantes.

A alegria é o ímpeto de ser feliz falando mais alto, a poesia da vida que se materializa e transborda em explosões extáticas de maravilha e encantamento, deixando transparecer o nosso lado mais sonhador. A vida que escondíamos dentro de nós extravasa para a realidade e transforma dias comuns em fábulas deslumbrantes das quais sempre nos lembraremos sem nem bem saber o porquê. Dias diferentes o suficiente para se fazerem notar. Diferentes não por causa do tempo, da estação ou de qualquer coisa relacionada ao calendário, mas por nós. 

Lembraremo-nos dos dias que desperdiçamos brincando pela simples liberdade de fazê-lo ou perdemos refletindo, displicentes, sem jamais chegar a uma conclusão inteligível. Pensaremos justamente nos dias que passamos sem fazer nada, não por falta do que fazer, mas por falta de algo melhor para fazer. E, em verdade, é realmente difícil achar algo melhor a fazer do que aquilo que nos faz bem. Ser feliz, genuína e inegavelmente feliz, não é perder tempo, ao contrário, é otimizá-lo. Felicidade por felicidade, sem motivo algum - e, no entanto, por todos os motivos -, é a autêntica joie de vivre.

Bruna Romeu


Bruna Romeu é nossa leitora-colaboradora, e tem outros textos publicados aqui no blog!

terça-feira, 20 de maio de 2014

Antologia de poesia Plástico Bolha




Na última quinta-feira, dia 15 de maio, aconteceu o lançamento da Antologia de poesia Plástico Bolha (OrganoGrama Livros, 2014), no Astro Bar, o bar do Planetário da Gávea, Rio de Janeiro. Tantos autores e amigos presentes, reunidos para celebrar esses oito anos de história, fizeram do evento uma noite incrível! Obrigado a todos que compareceram! Veja aqui mais fotos da noite! 


Deseja adquirir seu exemplar? Entre em contato conosco através do e-mail: organogramalivros@gmail.com

quinta-feira, 15 de maio de 2014

É hoje!!!



É com muita alegria que convidamos todos para o lançamento da Antologia de poesia Plástico Bolha, hoje, das 17h às 23h, no Astro Bar, o bar do Planetário do Rio!! São 73 poemas, 73 autores, e oito anos de história reunidos em livro! A noite comemora também o lançamento da edições #35 do jornal e a chegada da OrganoGrama Livros, editora formada pela equipe do Plástico Bolha.

Saiba mais sobre o evento e confirme sua presença aqui!

O Astro Bar fica na Av. Padre Leonel Franca, 240 — Gávea — Rio de Janeiro.

Contamos com vocês lá!!

Ponto de Desequilíbrio


Frente ao teu descontentamento,
Tua decepção e meu não-envolvimento
Apenas me resguardo.
Que queres de mim?
Em movimento não-performático
Ante a tua saliva me calo!
Que dizer se meu circo é estático?
Não equilibro garrafas em posição de Yoga
Nem faço rir com meus olhos tristes e magoados
Confesso, a caixa de Pandora está aberta
Mas não há o que te servires dela
Estou há dois meses como Marina Abramovic
Quebrando o tempo e vencendo o cansaço
Dois meses encarando o nada,
E desejando o sábado.
Quanto mais te aproximas,
Mais eu me afasto.
Quero apenas seguir com a minha vida
E minha poesia perdida
Que a ninguém encanta
E nenhum coração balança
Apenas se acaba e tudo finda.

Lia Ferreira


Lia Ferreira é leitora-colaboradora do Plástico Bolha e tem mais trabalhos publicados aqui no blog!

quarta-feira, 14 de maio de 2014

Poema Bar


Melhor sofrer de amor no bar

rodeado de amigos
cerveja, violão e histórias pra contar

O amor é incolor
a gente pinta
com as tintas
que a alma dá

Os de paletó
visitantes da "Casa Rosa"
depositam suas mágoas
nas mulheres pagas
e se acham foda

Melancólicos sofrem em casa
numa fossa rasa
rádio Gradiente
pensamento doente
trilha down

O machão, que é o tal,
sofre
mas não perde a moral
continua esnobe
e a mocinha
amolece o coração nobre

Hay que sofrer
pero jamais com frescura
esta paisagem é efêmera
se atormentar é loucura

Pinte a dor, amigo
por um sorriso
deixe que o brinde
nos vingue

O acaso pipoca
nas lacunas da racionalidade
para dar alívio
e quebrar a vaidade

Porque, no fundo,
por amor
ninguém sofre
de verdade.

Thiago Mourão — Pocket Poeta.

terça-feira, 13 de maio de 2014

Fascinação


Vai a lua, vem o poema
Ela lá de cima se insinua,
Olha bela e tímida do céu
E a chance de falar com ela
São todas as chances que tenho
E é uma chance inesperada e bela
Mas tão provável e estranha
Embora não aconteça nosso
Tão esperado encontro
Dia e hora marcados outra vez
E lá vem a lua em seus encantos
A me convidar elegantemente
Tiro uma rosa do jardim do amor
Para que a ela seja ofertada
E ao ver a lua tão faceira e bonita
Sinto que perco a fala e a ação
E diante do deslumbramento
A admiro e fico quieto no canto
E mais uma vez a lua vai
Eu retorno íntegro ao poema.

Denilson Marques

O inútil Cê-cedilha


Sempre impliquei com o cê-cedilha e não entendo como ele conseguiu sobreviver à última reforma ortográfica. Se o trema foi eliminado, sem dó nem piedade, deixando as linguiças com o U exposto, por que livraram a cara do Ç que só existe pra confundir? Fui me informar de sua origem e não encontrei nada que justificasse a sua existência. No dicionário consta que é uma letra latina usada nos alfabetos das línguas alanesa, azeri, ligure, tártara, turca, turcomena, curda e zazaki. Só gente fina. Como se pode ver é de grande utilidade, vai que você encontra alguém que fala zazaki e precisa do Ç. Deve ser por isso que ele segue vivo no nosso alfabeto infernizando nossas vidas. O mesmo alfabeto que se modernizou incluindo os sofisticados estrangeiros K, Y e W que facilitaram a nossa vida e nos livraram de ler aberrações como fidebeque, daunloade e feicebuque, entre outras.  Fato é que ninguém explicou por que o Ç continua na ativa.

Tomemos como exemplo a frase “Vamos cassar os políticos corruptos”. Se ele for cassado com seus dois S, o político perderá o mandado e os direitos políticos, com amplas possibilidades de ser absolvido mais tarde. Agora ele for caçado com o famigerado Ç, estará extinto e nos livraremos deles para sempre. Tudo isso dentro da legalidade lexical.

Professores advertem seus alunos que uso indevido do Ç pode causar problemas e citam um exemplo clássico. Quando você vai ao cinema, você vai à cessão das dez, seção das dez, ou sessão das dez? Se você foi às duas primeiras, perdeu o filme. Cessão é o ato ceder alguma coisa, seção é a parte de um todo, logo só pode ser a última sessão, que tem a ver com a palavra latina sessio, ação de sentar, como nas salas de cinema. Complicado não é? Com a eliminação do Ç bastaria uma única sessão para os três casos, o complemento da frase é que diria qual o significado específico.

O barco que issar as velas conseguirá velejar? O Flamengo ganhará mais títulos apoiado pela nova nassão rubronegra? O pescador pegará mais siris se usar um novo pussá? As crianças dormirão em paz com as novas canssões de ninar? A Tradissão perderá pontos no desfile desfilando com esse novo nome? Vai continuar tudo na mesma para o povão que nunca se preocupou com essas nuances do nosso alfabeto. Nuances? Não seriam nuansses? Nuançes jamais.

Com a retirada de cena do Ç, quem terá mais trabalho será o S, que além de organizar os plurais, terá nova função ao lado de outro S. Eles atuariam em dupla, como o Cosme e Damião do nosso léxico, mas nada impede que eles se unam e apareçam como o Eszett do alfabeto gótico, um símbolo parecido com o beta grego. Pensando bem, aí pode complicar ao invés de simplificar. É melhor manter o Ç e deixar a voz do povo cuidar dele.



Fabio Bastos é leitor-colaborador do Plástico Bolha e tem outros textos publicados no blog e no jornal impresso. Confira!

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Vaga-lumes


se esse céu fosse seu
se essa lua fosse minha

e esse silêncio
essa rua vazia, nossos

por um minuto
mudo, estático,

seríamos apenas
olhos e ouvidos e tato

e no segundo seguinte
tudo se esvairia

em dias aprazíveis
de palavras dispensáveis.

Fernanda Tinoco Ramos


Fernanda é carioca e tem outros textos publicados no blog do Plástico Bolha! Confira!!

Angústia


Um relógio parado
É uma sepultura aberta
Que exala apenas a angústia
Dos corpos sem alma
Dos ponteiros parados.

Mauro José

Poema para o amanhã


Deixei de querer voar
Quando bati minhas curtas asas na pedra
Escorreguei no conforto do salário de carne
ou na pura e grossa bolsa de sangue
Vendi meus filhos ao acaso
e comprei um tobogã para escorregar
no lago dos problemas
Ontem eu vi gente comendo mato
E vi quem mata comer gente
Segurei pela última vez o viciado
que vendeu sua pureza
em troca do suspense
Deixei de querer parar o sangue
Fugi de ensaios medíocres 
e segui despreocupado
Não quero mais ter ilusão
Estou agora no sofá escrevendo um poema
enquanto uma borboleta busca o pouso
Ela procura à mesma coisa que procuro
aquilo que ainda não sei escrever
porque o momento é sublime
o seu pouso é delicado
ela pousa no pólen do poema
descansa agora sobre a folha
me pergunta sobre minha descrença
Digo-lhe que não quero mais voar com ela:
porque minhas asas ficaram pequenas
prefiro admirar o seu voo
não irei mais voar contigo
estarei amanhã distante
e não quero você comigo
No resto deste triste poema
A borboleta se foi
e o amanhã também

Ernane de Sousa

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Música e Plástico Bolha no Nativo!



Hoje a noite tem evento no Nativo Restaurante, na Av. Lúcio Costa n.1976, na Barra da Tijuca, com música ao vivo de Rodrigo Freitas Leite Pinto, Caroline Masioli e Guilherme Suarez. O evento acontece toda sexta-feira e tem a participação mais do que especial do jornal Plástico Bolha. A cada apresentação, é lido algum poema da edição e os jornais também estão a disposição para distribuição ao público. Não perca essa combinação perfeita de música, poesia e muito alto astral!

quinta-feira, 8 de maio de 2014

"Entre lobo e cão" de Claudia Roquette-Pinto



Na próxima quarta-feira, 14 de maio, será o laçamento do livro Entre lobo e cão (Ed. Circuito, 2014), de Claudia Roquette-Pinto. Vencedora do Prêmio Jabuti, com cinco livros de poesia lançados, Entre lobo e cão é a estreia de Claudia nas colagens e na prosa poética. O lançamento será na Livraria da Travessa, a partir das 19h. A Livraria da Travessa fica na Rua Visconde de Pirajá, 572 - Ipanema - Rio de Janeiro. 

Claudia Roquette-Pinto é um dos nomes integrantes da Antologia de poesia Plástico Bolha (OrganoGrama Livros, 2014), com lançamento marcado para o dia 15 de maio, no Astro Bar, o bar do Planetário - Gávea- Rio de Janeiro. 

São dois eventos imperdíveis!!

quarta-feira, 7 de maio de 2014

O concurso


As múltiplas escolhas estampadas no exame com que João se confrontava eram-lhe muito cruéis, seguindo o costume das decisões que a vida impõe aos homens. Foi a elas, supondo-se preparado pelas oito horas diárias de estudos, por meses e meses a fim.

Mas antes, brincou com a lembrança recém forjada da menina que entrara há pouco na sala e na percepção dos candidatos e do fiscal da sala. João já conhecia bem o que mais impressionava na moça, seu jeito de andar, e destoou dos competidores quando trataram de analisar aquela relutante contração de músculos que trocava suas pernas, acidentalmente levando-a para frente; o tropeço remendado de subidas e descidas em que progredia o palmilhar de seus passos, cuja coreografia teimava em inventar degraus sobre o plano linear do chão. Apesar do peso da caminhada, ela fez desfilar a mulher a quem João mais amou na vida.

Ela fora uma menina da escola, evidentemente, porque João não tinha tanta vida atrás de si para ter amado assim qualquer outra criatura. Ela era singela, meiga, do tipo de pessoa que se torna bem versada em todos os ofícios humanos que não enriquecem. Não fazia tanto tempo que não se viam pessoalmente, mas o vínculo virtual do facebook também nunca se estreitara muito: João apenas conhecia da sua vida o que ela muito zelosamente aprovava expor.

Mas o lapso foi momentâneo. João acordou com a estridência do apito soprado pelo grande e gordo fiscal, permitindo que os concurseiros pateticamente cometessem os erros necessários à repetição da ciranda intelectual no próximo ano. Fatalmente, foi seu caso. Apesar de não poder sabê-lo então, ele pressentiu o desengano à espreita quando entregou finalmente a prova. Tal momento, suas particularidades (a ríspida troca de olhares com os outros já de pé, a atenção do fiscal à ressonância dos passos sobre o assoalho da velha escola, o cheiro da manca amada ao ignorar-lhe no caminho até a porta), residiriam na alma de João enquanto ela se comprovasse a matéria mais sensível de seu corpo.

Saiu à rua, por causa da asfixia que o ar viciado da sala lhe causava. Tentava esquecer o desgosto da prova e da paixão antiga com quem cruzara. Sob o sol primaveril da Tijuca, encontrou o amigo do cursinho já liberto do papel de rival.  

— “E aí cara, como foi? O que achou?” O amigo abriu o interrogatório. João sorriu intranquilo, fazendo-se parecer inocente, em todo caso.

—  “É, mais ou menos, sabe? Acho que me saí melhor na parte histórica...”

— “Acho que fui bem”, interrompeu o amigo, “aquela de português, do Antonio Cândido, você colocou verdadeiro ou falso?”

— “Ah, que eu me lembre pus verdadeiro.” João estava certo do que marcara na questão, mas sua hesitação o defendia da voracidade do amigo.

— “Hum, acho que não hein? Eu e maior galera colocamos errado.”

— “Sei..., devo ter errado essa.”

—   “E aquela do PNB? Certo ou errado?” O inquisidor continuou até cansar de dar demonstrações de sua luz própria.

 —  “É, sei lá, de qualquer forma, agora é esperar pelo gabarito, acho que sai semana que vem já. Vou partir cara, a gente se vê por aí.” Ao que o amigo replicou com a tímida declaração de “abraços”.

João decidiu voltar pela São Francisco Xavier, mirando o metrô ao fim da rua, pretexto útil e muito convincente, ninguém nunca o contestara, pelo menos. Queria mesmo (como o miserável calor do asfalto queria subir à abertura do céu) era o conforto que só a placidez das palmeiras imperiais da igreja sabia por em seu espírito, com sua indiferença exemplar diante do tudo. Foi andando abobadamente até enfrentar a paróquia, cuja vegetação era mais tosca do que se lembrava. Não se impressionou, e virou-lhe as costas.

Normalmente, as convicções de João eram mais profundas do que a cena ocorrida ali na igreja deixava entrever, mas dessa vez ele se enganou de fato. Porque sua cabeça se empenhava em esquecer algumas memórias, as que ele levantava ressurgiam desmaiadas na nitidez. Avistou a boca do metrô e desceu suas escadas, contrariado. E o tempo corria, indolente como a vontade de João de voltar pra casa. Envelhecia-o. Mas como o melhor modo de se aproveitar a juventude é pelo seu desperdício, João não se preocupou muito com o provável (isto é, certo) fracasso na prova, as responsabilidades que os trabalhos da faculdade lhe empurravam, a falta de perspectiva profissional agradável, e o crescente custo de sua vida.  O viço das palmeiras sonhadas e o viço de sua juventude minguavam num mesmo par. Viver era um devir medonho, incerto, cujo desenlace é sempre (e é a própria) iminência da casualidade. Peculiar a ética da vida: acostumar-se com a chegada inelutável de um emissário fatalista, que ora porta boas e ora más notícias, a que chamamos futuro. Ser o destinatário do futuro, portanto, sob sua única forma real, realizada, o presente.

João finalmente chegou ao interior da caverna antropogênica. Comprou o cartão, inseriu-o na máquina metálica, e passou com o giro da roleta para a plataforma. Num banco de plástico azulado, encontrou sentada e só a menina coxa.

Ele não podia acreditar. Pensou, mesmo, que já sonhara situações menos improváveis do que a que se lhe apresentava.Experimentar uma situação como a que espantava João é estar à margem da própria existência: nada é mais substancial que o ar de que nossos pulmões arfantes se enchem, nada é mais turvo que a condução inocente dos acontecimentos. O coração fica de joelhos e clama pelo fim da biologia que o atribula; o silêncio se mostra como o barulho a intercalar os sons que nos testemunham na surdez do universo. Então decidiu falar com ela.

—“Oi! Como você tá? Quanto tempo hein?”

—“João! Oi!”, surpresa, alongou a interjeição, “Caraca, quanto tempo cara!”

—“Pois é! Não nos vemos desde os tempos da escola, não é mesmo? Quer dizer, na verdade não te vejo desde 2:30 da tarde, quando fazíamos a prova.” Por um grande descuido, soltou a última frase, que se acomodava na exclusividade do seu pensamento.

—“Você tava lá? Po, por que não falou comigo? Não fazia idéia que queria funcionalismo público também, você não estudou Economia na faculdade?” Um leve zumbido se avolumava na plataforma, anunciando a vinda do trem.

—“Haha, não cara, na verdade...” O retorno da presença física de pessoas longamente ausentes é a mais imediata força para a restauração sentimental do passado. Naquele caso, a retomada agravava-se tanto mais porque a presença física era débil: sua precariedade anatômica instilava em João o drama de confundir amor com piedade. Ela havia revitalizado a adormecida atração escolar, e João cogitava seriamente em confessar-lho. “Na verdade até pensei em Economia, mas sou covarde diante dos números, haha. Refugiei-me no Direito mesmo... cara, como é bom te ver, a gente tinha que marcar alguma coisa, sabe? Não podemos contar só com o acaso como anfitrião de nossas reuniões, haha” Disse-o, meio sem graça. E tomou mais coragem. “Por que não combinamos de sair um dia, pra relembrarmos os dias da escola?”

—“Ah, João, claro, vamos sim!” Foi o primeiro triunfo de João no desde que acordara. As palavras deram-lhe o alívio no qual a ânsia prazerosamente se extingue. “Quando você pode?”

—“Por mim, amanhã, sábado, é bom, tô livre. E você?”

—“Por mim tudo bem, faz o seguinte, pega o meu número, me adiciona no whatsapp, me manda uma mensagem e aí a gente combina a hora, o local, e tudo mais.” Logo que o acordo foi feito, o trem chegou à estação. João fez menção de embarcar nele após alegrar-se novamente com a disposição da interlocutora. Mas notou sua inércia.

—“Você não vai entrar?” Perguntou-lhe, consternado.

—“Não, na verdade estou esperando uma pessoa. Vou partir daqui com ela. Mas a gente se fala amanhã!” As palavras com que João contara para ser feliz agora o ressabiavam. Ela? Temia que o gênero empregado se adequasse somente ao substantivo, e não à pessoa esperada, cuja realidade (ambulante, com as pernas de quem pode se dirigir ao encontro de moças no metrô) burlava as regras da linguagem. Mas quis atribuir a razão da vigília ao pai, ao irmão, talvez, sabendo que, se fosse assim, a ocultação do nome teria sido suspeita, exatamente como foi. Resignou-se e se despediu da companhia para se esconder no trem vazio.

Alojado num canto em que ainda via seu desejo sobre o banco de plástico azul, João padeceu da verdade a que a lentidão do trem concedeu tempo para providencialmente surgir. Sôfrego, vinha caminhando pelo lado esquerdo da plataforma o grande e gordo fiscal do concurso, enquanto as portas do vagão se fechavam e a máquina começava a partir. Antes de perder o ângulo de visão, João observou que o fiscal se sentava no mesmo banco que ele escolhera para descansar e conversar com a manca. Antes de imergir na escuridão do túnel, viu a obesidade de um e a fragilidade da outra inclinando mutuamente os rostos na direção do que João passaria o resto da vida acreditando ser um beijo.

Filipe Novaes

terça-feira, 6 de maio de 2014

Cabelos brancos


A velhice mora nos cabelos brancos,
mas também nos olhares distantes de saudade,
onde os ossos já viveram demais 
e os corações já sofreram mais do que deveriam.

Vive dentro de cada solidão e angústia
que passa o corpo e a alma e a falta de 
melanina na cabeça; 
e a falta de mielina nos neurônios


Vive dentro dos sentimentos que passam calados
e dizem mais do que qualquer grito extirpado 
e forte; dizem mais do que qualquer outra coisa,
dizem mais do que minha poesia um dia quis dizer

Um olhar longe, de pedra, lacrimejante, 
com todas as histórias e todos os instantes
que um ser humano velho pode contar;
todas as angústias.

A velhice mora nos cabelos loucos,
mas também nas dores do corpo,
nas dores da alma;
nas lembranças amassadas dos diários,
nas poesias desgraçadas de uma vida

Mora longe essa saudade, e traz a velhice ao seu lado,
dá as mãos e carrega a solidão dia e noite
e espera a Catarata se alastrar
e espera o Alzheimer se mostrar
mas o amor, que hoje, velho, é solidão,
nunca morre, nunca finda, nos define:
homens de cabelos brancos, olhares distantes
e almas uivantes na solidão muda.


Galego é leitor-colaborador do Plástico Bolha da cidade de Salvador - BA, e tem outros textos publicados no blog do PB! 

PB contra o golpe — a poesia e o silêncio




O evento "Plástico Bolha contra o golpe — a poesia e o silêncio" aconteceu no dia 26 de abril como parte de uma série de eventos planejados pela Secretaria de Cultura do Rio de Janeiro para relembrar criticamente os 50 anos do golpe militar no país. Se apresentaram o grupo Movimento Territórios Diversos, o escritor Lucas Viriato e o músico Rodrigo Leite Pinto, além de participações surpreendentes do público, que também subiu ao palco para se manifestar. Veja aqui mais fotos do evento!

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Antologia de poesia Plástico Bolha!!




Reunindo 73 autores, 73 poemas e oito anos de história, a Antologia de Poesia Plástico Bolha chega para celebrar a longeva trajetória do jornal literário criado em 2006 por alunos do curso de Letras da PUC-Rio. O Plástico Bolha, que há muito expandiu essa fronteira para além dos círculos acadêmicos e para outras regiões do país, circula atualmente em treze estados do Brasil, de forma gratuita e independente. Agora, em parceria com a editora OrganoGrama Livros, chega a Antologia de Poesia Plástico Bolha, mantendo a tradição do periódico de reunir lado a lado autores novos e consagrados, sempre com a proposta de trazer uma amostra da nova produção literária para o público.

O evento comemora também o lançamento da OrganoGrama Livros, editora formada pela equipe do jornal, levando para o mercado editorial toda a experiência adquirida ao longo de oito anos no mercado independente.

Ainda está programado para a noite a leitura de poemas nas vozes dos autores e o lançamento da edição #35 do jornal Plástico Bolha, com entrevista exclusiva com Cleonice Berardinelli entre muita poesia.

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