sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Quem tem medo de Virginia Woolf



A peça "Quem tem medo de Virgínia Woolf" volta aos palcos do Teatro dos Quatro, no Shopping da Gávea, Rio de Janeiro. Com atuações impecáveis e uma ótima tradução do grande amigo do Plástico Bolha, João Polessa Dantas, a peça ficará em cartaz durante todo o mês de março. 

O Shopping da Gávea fica na rua Marques de São Vicente, Gávea, Rio de Janeiro - RJ.

Lançamento do livro Entre-Textos



Lançamentos do livro "Entre-Texto", de Luiz Otávio Oliani, e do Jornal Poesia Viva 50. Os lançamentos acontecerão simultaneamente, na Casa de Botafogo. Rua Ferreira Martins 40, Botafogo, Rio de Janeiro. 

Poeta em linha torta


minha poesia precipício salto alto afoito desafio
composta de ris(c)o condão desfalcada de siso

frequenta pé sujo museu restaurante de luxo
batuca na mesa sola cello partituras cadência

minha poesia senhores senhoras honorável público
dança gafieira dá baile de gala não é boca pequena

minha poesia é carpideira velha mulher moça fagueira
é cisco fagulha abençoada folia é controvérsia de rua

Márcia Abath


Márcia Abath é leitora-colaboradora do Plástico Bolha da cidade de Teresópolis - RJ. 


quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Lucidez


toda forma translúcida
de globo ocular
transcende luz
é cor caleidoscópica
que difusa o sol
tropical traduz
na pele do papel
a coloração costumeira
inventa outras
domina a lucidez
da palavra desencadeando
a prosa solta
feito dois feixes elétricos
duas cores, dois sentidos
em duplicata a dúvida
e a certeza pendendo secreta
na linha fina do horizonte
no anzol das constelações
azuis

Rafael Magalhães


Rafael Magalhães é leitor-colaborador do Plástico Bolha e tem textos publicados no blog e no jornal impresso.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Penalidade


A cobrança de pênalti foi autorizada pelo juiz. Adalberto deu três passos para trás e respirou fundo. Nesse instante, o peito arquejou e as pernas titubearam. De sofre, encarou a torcida, apreensiva pelo chute que indicaria o campeão da Copa do Brasil. Sim, caso a bola resvale na trave, na arquibancada ou nas luvas do goleiro, ocorrerá um homicídio no Maracanã.   

Adalberto avançou em direção à bola, caprichosamente alvejada na forquilha entre a trave e o travessão. O silêncio entre o momento do apito do juiz (priii) e o carimbo na trave (treeec) virou uníssono. Na arquibancada, vermelho se confundia com preto; e os pretos com os brancos, todos em polvorosa.

De repente, destruíram as grades, barreira entre a arquibancada e o gramado. Os torcedores correram na direção de Adalberto, acuado ao meio do campo. Cada qual com objeto na mão, os transgressores cercaram o atacante. Sem alternativa de fuga, pisou na marca de cal do centro do estádio, e observou as setenta mil pessoas avançarem, em passos candentes. Um pênalti perdido pode mesmo levar uma pessoa à morte? Sim, futebol é casamento: Se os últimos quarenta e cinco minutos forem marcados por angústia, de nada valeram os dez primeiros anos, de conquistas.

Muitos torcedores estavam munidos de bandeira, de sinalizador e até de coquetel molotov. Era uma corrida embrionária para chafundar aquele traidor. Adalberto observou que alguns manifestantes vestiam máscara preta, e se sentiu na pele de políticos fraudulentos. É, deve existir um inciso constituinte que garanta o direito do torcedor ao título de campeão. 

Um homem negro, alto e sem camisa se destacou na barafunda. Com as mãos livres, liderava o comboio, a cerca de dois metros de vantagem de um provável concorrente. Ah é, agora a cabeça do atacante vale mais do que a taça. Adalberto pôde enxergar o céu, límpido, semnuvem. Maldita trave!

Sem pestanejar, o homem acertou um cruzado de direita na cara de Adalberto, que ouviu a rede bramir o alarde da vitória (chuaaa). A bola se aninhou no esconderijo lateral da baliza. Indefensável. 

Embevecido, o atacante fitou a torcida, que hasteava bandeiras e lançava sinalizadores, ao coro de é campeão.

Hugo Pernet


Hugo Pernet é leitor-colaborador do Plástico Bolha e tem outros textos publicados em nosso blog!

O furor dos sexos


O furor dos sexos
A insanidade dormente
De se sustentar no penhasco do teu desaguar

O furor dos sexos
É o desespero cavalar que ofega coxo
Em muletas de teus membros abissais
Prelúdio da dança sideral

O furor dos sexos
O versejar trêmulo de sêmen de loucura
A fecundar o pomar da dor
Bendito de toda danação:

Ondas inquietas
Toureando a vida
E adorando o caos

Danielle Magalhães

terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Pow-emas e outros jabs líricos, de Edson Valente




Lançamento do livro Pow-emas e outros jabs líricos (Patuá, 2014), de Edson Valente.

O evento será realizado dia 27/02 a partir das 19h no Bar Canto Madalena - Rua Medeiros de Albuquerque, 471 - São Paulo - SP

A entrada é gratuita.


A minha poesia


a minha poesia é bem isso:
a criança no metrô
que monta sorriso
modelando as bochechas do vô

Julia Medina

Aonde é aqui


Ficaremos aqui.
Essa foi a recomendação deles.
(olha ao redor)
Ouço barulhos desse lado. Ouço tudo mas não ouço nada quando tento enxergar.
Certa vez eu ouvi de um conhecido que quando não se enxerga, não se ouve. Tem cabimento nisso será?
Tem lógica ao espaço em que percorremos, a rotina que nos prende, ao conformismo de ser alguém qualificado quando se chega ao um espaço como esse, branco-cego-surdo?
Acabei de pensar nisso:
O HOMEM É O ÚNICO ANIMAL QUE COMPRA
O HOMEM É O ÚNICO ANIMAL QUE MENTE
O HOMEM É O ÚNICO ANIMAL QUE SENTE, FALA E REQUER RESPOSTAS

Estou começando a gostar desse espaço.
Eu tenho minhas memórias. Eu sei que sou que sou eu que estou aqui, que estamos num espaço não definido, num ambiente em que não sei se vou poder voltar ao mundo real.
Eu ainda ouço música ao lado.
Posso até meditar!!!!!
Parece um sonho que sempre tive desde que era criança, quando fechava os olhos e me via num espaço branco numa imensidão anulada. Mas isso não é sonho; cheguei, abri os olhos, e calmamente percebi que isto parece um sonho mas não é exatamente como me sentia antigamente.
Tem cheiro, mesmo não sabendo qual é
Tem uma paz, mesmo eu sendo sozinho
Tem cabimento? Acho que no momento tem.
Tem um tempo que chego a imaginar que todos me olham, mas não preciso ter a necessidade de poder estar conectado ao olhar externo de vidas completas, de vidas cheias de memórias como a minha.
Isto é branco, é sem dimensão mas é com objetivo.
Qual é esse objetivo? -Eu não sei.

O que eu for criar, será feito, e o que será feito, será lembrado pelo os que passarem aqui.
Aonde é aqui?
- É quando se fecha os olhos.



Luan Carlos Machado é leitor-colaborador do Plástico Bolha e tem mais textos publicados em nosso blog!

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O sol invade


(soneto inglês com dístico alternativo)

Desvelam-se bocas cortinas resmas
em toda porta eis o gongo metálico
debalde retorcer as maçanetas
o dia é fórum inadiável

O devir se grava com britadeiras                                        
feito metralhadoras de horizontes       
e a multidão que por eles campeia
obra sem termo a fiação do instante

sendo a cidade - cega arquitetura!   
esta crina de fios lacerados 
e milhão de olhos. Em cada rua
vielas ocultas dão para o acaso

cedo (o fiscal de sombras nos devassa
o sonho nos arremedos da carne)

as vigas como raízes ou lanças
pelos campos da forma entrechocadas.



Guilherme Gonçalves foi o segundo colocado do Prêmio Paulo Henriques Britto de Prosa e Poesia de 2013, na categoria prosa, com o texto Uma noite em III tempos.  

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

O companheirismo


Saudações meu estimado amigo, lhe cumprimento agora com um toque sacana na nuca, e isto já lhe agradou!

Te saúdo com este gesto, porque eu já sou intimo teu, desde o dia em que você perto de mim passou!

Te cortejo hoje deste jeito, porque já temos uma certa camaradagem, desde o momento que nos vimos no museu!

Te aceno desta maneira, porque tu me reconheces, até de longe, desde aquele instante que perto de mim você apareceu!

Te cumprimento ousadamente, porque afinal nós já somos irmãos, desde o dia em que te apresentei aquele pitéu!

Te parabenizo frente a todos, pra explicitar meu orgulho por vosmecê, pois olha só: você cresceu!

Te critico discretamente, pois se trata de um auxilio meu, à sua estimada melhoria, ficarei venturoso ao te ver levantando um troféu!

Te elogio pelo seu empenho brilhante, pois quero ver você voando aos altos céus.

Vinicius Fadul

Lua


Vivendo à beira do abismo;
Eis que a casa tão pequena
Equilibra-se entre vendavais e cachoeira
Sobre a pedra escorregadia
De dia pedra e
À noite cachoeira.

Flavia Norberto

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

A borboletinha


É tão pequenina, tão pequenina aquela borboletinha.  E, ainda que tão pequenina, ilumina singularmente toda a rua. Há uma doçura inexplicável em sua luz. Uma luzinha branca, áurea, que vai freneticamente de lá para cá. Está perdida. Nos últimos momentos da vida. Mas a borboletinha não desiste.  Alça voo. Cai de novo. Tenta achar um rumo. E a rua, já escura, se ilumina com os caminhos que percorre pelo ar. Nunca antes vi uma borboletinha tão angelical. De onde veio este ser iluminado? E que maldade ir-se agora, deixando todo este mundo órfão de sua presença. Que presença divina. Ah, borboletinha, não vai, não. Tente mais. Plane novamente com esta candura que poucos têm. Mas ela não ouve meus pensamentos. Eu que estou ali, sentado na calçada, disperso da conversa dos homens. Com olhos apenas para este ser vivo que, ao mesmo tempo, resplandece e agoniza bem ali, diante dos meus olhos. Como é incrível ver que, nos últimos momentos de vida, a borboletinha conserva toda esta beleza divina. Como pode florescer tanta beleza, quanta beleza, meu Deus, minutos antes da morte? Como pode ser que, daqui a alguns minutos, esta luz misteriosa se apague? E por que esta morte doída, sofrida, que faz este pobre ser vivo cambalear, ziguezaguear tortuosamente pelo ar, um tormento que dói um pouco em mim também. Eu que estou ali, sentado na calçada, impávido, imóvel, só com os olhos para a doce borboletinha. Neste momento, eu só queria que ela tivesse força para voar mais alto. E, lá de cima, seguir rumo a algum canto, achar mais alguém que reconheça, como eu, seu encanto. Mas a borboletinha agoniza. Bate nos muros, postes, na árvore, no carro, tenta mais uma vez com um solavanco, ricocheteia, dá um tranco e despenca outra vez... Já está distante – e eu tento acompanhá-la, a despeito dos meus olhos míopes. Queria apenas que ela tivesse força para seguir. Ela se foi. A vida tem fim. Até para esta borboletinha. A morte tem mesmo a aspereza de uma lei, embora nem os lírios nem as borboletinhas nasçam da lei – como era sábio o mestre Drummond. Por que, como um sopro, morre toda esta indizível beleza?
Nunca, jamais saberei...



Rodrigo Cabral colaborou com o desafio poético do Plástico Bolha na edição #30. 


Pauliceia interditada


para viver na cidade
é preciso 
moldar a moda
e zerar a reza

por isso
transito na eternidade
vestindo a calma
ao pregar a pressa

Yasmin Nariyoshi


Yasmin Nariyoshi é leitora-colaboradora da cidade de São Paulo, e tem diversos textos publicados no blog do Plástico Bolha!

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Semana Plástico Bolha no blog do Noblat


Está no ar a semana Plástico Bolha! Durante toda essa semana, o blog do Ricardo Noblat apresentará poemas já publicados no jornal. Toda noite, às 23:30h, um poema novo no blog. A semana começou com o belo "Os ingênuos", de Augusto Guimaraens Cavalcanti. Veja no link: http://oglobo.globo.com/pais/noblat/posts/2014/02/17/os-ingenuos-augusto-guimaraens-cavalcanti-524008.asp

Continue acompanhando durante essa semana!

Laçamento do livro Gazetas Esportivas



Lançamento do livro Gazetas Esportivas (Editora Circuito), de Alex Hamburger.

Poemas-enredo de características 'satinianas', um tributo ao pioneirismo e atualidade de Erik Satie, precursor da folia canibal e um dos principais (in) formadores da arte contemporânea. É sintomático que um tal lirismo disruptivo aconteça como uma extensão da mostra "Abre Alas", evento inaugural da nossa festa mor. Ambos, lançamento e exposição, sob o compasso cambaleante de Chiquinha Gonzaga, permitindo-nos entoar: "ô, abre alas, que eu quero passar, eu sou da lira [ e do delírio ], não posso negar..."

Simultaneamente haverá uma performance e o lançamento do #4 da Revista Bólide ( Revista bólide ) de Curitiba, que traz poemas visuais do autor, dentre trabalhos de outros poetas.

Sábado, 22 de fevereiro, às 18h. Rua Gonçalves Ledo, 17, Centro, Rio de Janeiro.

O nome da coisa falta


a fome é o nome da falta
mas falta não é só fome
nos falta palavra exata
a falta é também nome
a coisa que só se fala
é coisa que não mais cala
a fala da coisa distante
a coisa distante da fala
que dista a exata distância
de um sonho que não se cansa

Salvador Passos

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Home sweet home


Na insistência de uma manhã improvável, toda calçada levaria finalmente ao abrigo enunciado por um portão carrancudo.

Na entrada, o silêncio ressentido da caixa de correio guarda testemunhos do mundo esquecido que contamina os segundos intranquilos de sua respiração.

Em seguida, decide-se entre o caminho de escadas surradas que ameaçam não suportar novamente o peso da sua insignificância ou a espera infinita do elevador, purgatório ambulante com botõezinhos brilhantes indiferentes ao seu destino.

Preferiu as escadas, apesar da escalada aos andares e o apoio áspero de um corrimão improvisado.

Semi-invertebrado, se arrasta pelo silêncio quase constrangedor de um corredor que se estreita mais a cada passo que vê passar o intruso da madrugada.

Duas janelas vesgas o observam num riso contido e sob seus pés, uma quantidade de incontáveis azulejozinhos insuportavelmente alinhados denunciam a assimetria dos seus passos.

Apática, a porta acompanha a campainha que romperia o silêncio anunciando o apocalipse, nãofosse o leve tilintar das chaves ao encontro da maçaneta de emoções enferrujadas.

Home sweet home, diz o tapetinho sujo e simpático à espera de uns sapatos massacrados.


Janina Daou tem outros textos publicados no blog do Plástico Bolha. 

Abrigo


Eu não me integro
só desintegro
minha razão.

Não tenho nicho
nem me encaixo
e quando a máscara cai
não há nada por trás.

Esse vazio pesa
vazio de ser tudo de dentro do muro –
quando pulo
parece um tiro no escuro.

Se vou se estou se fico
tanto faz o meu grito –
nada surge pra fora
nada excede o limite.

Sou o abrigo
de um grande perigo –
recipiente de pesadelos.

Susy Freitas

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Lançamento do livro "Tempo de aldeia"




A educadora e contadora de histórias Edith Lacerda abraçou anos atrás o desafio de lecionar para os índios Waimiri-Atroari, na Amazônia. Uma rica missão cujas lembranças se desenlaçam nas páginas desse fascinante livro. Tempo de aldeia: fios de memórias em terras indígenas traz o intercâmbio de ternura e conhecimentos entre o indígena e o urbano. Dia 18 de fevereiro, às 19h, na Blooks Livraria. Praia de Botafogo, 316, Rio de Janeiro - RJ.

Um beijo na estação


Tocava na rádio uma daquelas belas canções dos anos 80, dessas que me fazem recordar aquele tempo bom que eu nunca vivi. O locutor, com aquela clássica voz sedutora, narrou impecavelmente a dedicatória à namorada de um ouvinte, que, tão romântico, mandava um beijo para a sua amada e expressava o quanto sentia sua falta. Pensei que é sorte grande achar um amor assim, porque é sorte grande ter uma música só pra você, nem que seja ali só por aqueles três minutos e cinquenta e seis segundos. É só pra você e mais ninguém. E é difícil estar longe de quem a gente gosta, mas ser lembrado de surpresa por aquela pessoa que sabe que você, naquela hora, costuma sintonizar naquela estação, gosta de ouvir aquela música, e sabe ainda que você sempre canta o refrão nem que esteja apenas gesticulando a mudos lábios, isso sim é sintonia. E então eu fiquei imaginando que quem mais estivesse a ouvir a canção era apenas mais um, um figurino daquele ato, assim como eu. Naquele tempo ali, os protagonistas eram tão somente o casal, cuja entrada fora narrada pelo magistral locutor, e de repente me vi desenhando na mente a figura de um e de outro, compartilhando daquela breve música, tão eterna àqueles dois, que não estavam juntos em corpo, mas ainda assim dançavam juntos, no mesmo passo, um esperando pelo outro. Tudo a seu tempo.

Absorta em meus pensamentos, somente despertei ao chegar na minha estação, a seguinte. Retirei os fones. Descendo do trem, percebi o quanto minha imaginação conseguia tecer e enfeitar histórias tão bonitas quanto reais, especialmente porque elas já haviam acontecido. Sorri. E me sobreveio uma onda de satisfação singular, um bem-estar físico e mental, já que, em meio a tantas tribulações do dia, é sempre maravilhoso ter uma lembrança tangível e suave em mente para antes de dormir. E aqueles dois desconhecidos amantes seriam minha lembrança. Até então eu tinha dado somente quatro passos em direção à saída. A porta do trem fechara, mas uma delas, mais à frente, permanecia aberta, porque algumas portas na vida e nas coisas da vida são assim, elas não fecham, e a gente sempre pode voltar, embora nem sempre intencionemos isso. O trem, por fim, deu sua partida. E ali, recostado naquela abertura, um tipo interessante sorriu pra mim e me mandou um beijo, que de tão perto estalou dentro do meu ouvido e seguiu ecoando até que eu não mais pudesse ouvir o trem, longe longe. Talvez nem tão romântico, talvez nem tão enfeitado como eu poderia inventar, mas esse foi o meu beijo na estação, e foi nele que eu pensei até chegar ao meu destino, durante meus merecidos três minutos e cinquenta e seis segundos. Só meus, e ninguém mais sabia, mas era eu a protagonista.

Jorcianne Soares


Jorcianne Soares é leitora-colaboradora de Marechal Hermes, Rio de Janeiro - RJ. 

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Um poema de Clara de Góes


Não conto histórias nem estrelas.
Minto a mais não poder.
Violo correspondência
Imito assinaturas
Falsifico a vida todos os dias.
Agora, um anjo me reconheceu
E não larga do meu pé. Cismou.
Vai me salvar.
Esmeralda escaldada
Sem corcunda ou Notre Dame
Tenho lá, eu, mais o que
Salvar?

Clara de Góes

Liberdade, liberdade


Tensão no Oriente Médio. O âncora do telejornal faz cara de paisagem nublada ao ler a mesma notícia todos os dias. Se fosse tesão, talvez seu rosto ensolarasse. A burca queimasse. Mas não. É tensão. Com ene – de energia. Que não cessa nem com as últimas cinzas da bandeira virando pó. Com as estrelas apagando o céu. Com o vermelho escorrendo nas paredes.
Os manifestantes deixam as ruas nuas.

Dá vontade de importar essa gente. Essa massa. Essa paixão. Essa loucura. Essa religião. Essa ideologia. Essa revolução. Essa primavera. Essa tsunami. Essa força estranha que vem, sei lá, do enriquecimento de urânio, das barbas do profeta, do cuscuz marroquino, do quibe cru, das mil e uma noites, das xerazades, dos alibabás e seus quarenta ladrões, do gênio da lâmpada, do que não há sob o turbante do sultão.

Dá vontade de importar essa tropa de elite osso duro de roer para agir nos intervalos da novela. Para pegar um pegar geral pegar também você. Para berrar no funeral dos honestos. Sacudir os esqueletos da nossa festa pobre. Pisar a grama verde-loura da esperança. Decapitar as estátuas de isopor. Sujar o fairplay do dicionário de boas maneiras. Fazer um minuto de silêncio quando o volume da hipocrisia estiver no máximo.

Quando nossos tímpanos finalmente sangrarem uma coca bem gelada.
Aí talvez a tensão e o tesão aterrissem kamikazes por estas bandas – que mais parecem bundas. O âncora do telejornal faça cara de quem bebeu e não gostou do coquetel molotov. A paisagem nublada ensolare. A burca queime. O pó revire as últimas cinzas da bandeira. O céu desapague as estrelas. As paredes desescorram o vermelho.

E a liberdade abra as asas – solte suas feras sobre nós.

Fábio Flora

Incomunicação


É isso!
Vamos atingir a incomunicação
Eu no meu canto, sem o seu encanto
E você no seu mundo, sem me tocar fundo

Sou como um vulcão
E não quero entrar em erupção
Então me faz esse favor
Não vem com essa magia
Não vem com essa bruxaria

Não fala lindo
Não fala em sintonia
Não fala nada
Me deixe quieta
Não cresça em mim
É melhor assim

Não toque aqui
Não no ponto G
Ponto ser
Ponto fraco

Não vem me fazer ver
A mulher que não quero ser

Mulher forte?
Mulher independente ?
Mulher sem medos, sem receios?
Cadê?

Cadê aquela mulher
que viveu perfeitamente, até hoje
sem você?

Não, não
Sou como um vulcão
Não quero e não vou entrar em erupção
Por isso, é isso!
Vamos atingir a incomunicação

Carla Vilardi

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Coroa de leão


Dos reis, rainhas, reinados
Ele é o mais pra mim
Sem roupa, sem bala, sem nada
É o cara
É o cara
É o cara
Assim
Das musas, musos, luas e afins
É quem canta o amor em mim
A dor em mim
A balada
E se faço um quase culto visto tão babaca
Assumo intimamente o refrão
Ninguém resiste
Coroa de leão



Tiago Maviero é leitor-colaborador do Plástico Bolha, e tem textos publicados tanto no blog quanto na versão impressa do jornal!

O grito de Botika


“sem mais
o Rio é uma bosta”
                           Pedro Rocha

O estrago não abrange mais
o tamanho do susto,
nas margens, não sobraram
pedaços de madeira,
paus fincados na terra
para lembrar o que
existiu ali um dia.

O grito não é sobre
o cheiro da fumaça
que cega e lacrimeja,
o grito não é sobre
o rumor oculto que alimenta
o imenso reino de sombras
que cresce como um
dilúvio antes do fato.

O grito é muito mais
que simples temor,
angústia, desmedida.

O grito é o que não se curva
diante da desgraça, do domínio
enriquecido pela gula de uns,
enriquecida pela fome de outros.

O grito é o excremento,
o miasma que resta no corpo
quando a podre e crua comida
forma um banquete de vermes

O grito é o sal que escorre
pela carne exposta
e dói e treme e causa ira
e provoca e faz surgir o soco.

Eliminar a ameaça como quem
explode um vilarejo que resiste,
cuja lágrima vem da mesma fonte
do grito, ébrio, puro,
genuíno e entranhado grito
para o que conduz a ordem,
o progresso, a vigência, as hordas
de seguidores que arrancam
com os dentes a pele de quem
não tem mais como existir.

O grito é a própria cidade,
que sofre, perde seus órgãos,
cabelos, membros, sangue,
e se parece cada vez mais
com um deus de pedra,
rachado, puído,
esquecido no futuro,
entre plantas, musgos e lixo,
sem memória
feito uma aldeia vulcanizada.

Pedro Lago

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Poesia Viral


Na última sexta-feira, 07 de fevereiro, a equipe do Plástico Bolha esteve ao lado dos grupos Fora de Área, Assalto Poético e Poeme-se, no lançamento de Todos os Ventos, filme dedicado à obra de Antonio Carlos Secchin. dirigido por Eliza Morenno. Muito obrigado à Eliza Morenno pelo convite! 


Eliza Morenno e Antonio Carlos Secchin.


Tomé Lavigne (Plástico Bolha) ao lado de Bruno Borja e Lucia Helena Ramos (Fora de Área).

157


hoje eu descobri
que  ler no ponto
de ônibus
 te atrasa em 1 hora pro compromisso

te faz reparar nos mínimos
contornos dos movimentos de voo dos pássaros
em formatos um grande V no céu

sob nuvens de quase chuva

e que servem de recinto para os grandes
pássaros
dos quais eu nunca presto atenção
caso eu não esteja lendo
versos brancos no ponto de ônibus
e não esteja
atrasado.



Felicio Dias é leitor-colaborador da cidade de Duque de Caxias - RJ, e tem outros textos publicados no blog do Plástico Bolha. 

Voyager


      Quando vejo uma ínfima parte do nosso imensurável universo, percebo o quão pequenos e insignificantes somos no tempo e no espaço, não passamos de meros coadjuvantes neste espetáculo cósmico de 13,7 bilhões de anos. Senhores de si, cremo-nos o ápice da evolução, a primazia dos seres, esquecendo-nos de que somos apenas um elo nesta interminável cadeia de espécies, que entre evoluções e extinções, compartilharam ou ainda compartilham este mesmo pedaço de rocha errante.
      Sim, somos únicos sobre um aspecto, ao menos neste planeta. Somos seres providos de autoconsciência. Cientes de nossa finitude e capazes de estabelecer conjecturas, lançamo-nos ao desconhecido. A princípio para garantirmos nossa própria sobrevivência, e ao longo do tempo, para suprirmos as necessidades que surgiam à medida que cada grupo social evoluía e singularizava-se, transformando-se em uma sociedade com cultura, economia e organização política peculiares.
    Desbravamos territórios, apoderamo-nos de todos os habitats, alteramos significativamente a face do mundo. Entretanto esta busca frenética e incessante, que outrora impeliu-nos além das fronteiras, agora nos aprisiona. Guiados pelo consumismo descabido, mecanizamos nosso mundo material, nossas ações, nossas almas; perdemos-nos de nós mesmos, não olhamos mais nos olhos, não sentimos mais o toque, não ouvimos mais a voz. Somos 7 bilhões de vazio, solidão e silêncio, caminhando em um pálido corpo celeste suspenso no espaço.
     Prendemos-nos a mesquinhez, ao individualismo, substituímos valores por futilidades, julgamos e condenamos a cor, a escolha, o diferente. E assim seguimos. A cada passo um descompasso desenfreado rumo a um futuro corrompido por sistemas que nos fogem à compreensão, causando incertezas e desolação. E assim retrocedemos. A cada passo nos tornamos seres humanos desumanizados, desprovidos de sutileza, compaixão, altruísmo.
     Talvez precisemos olhar mais para o céu e além dele, para enxergarmos, com olhos mais humildes, dentro de nós. Talvez ainda haja uma esperança remanescente nesta “caixa de pandora”, esperando para despertar e florescer em nossos corações, trazendo-nos de volta a humanidade que nos é devida. Para que assim possamos evoluir, transformando cada passo em uma nova perspectiva, em um novo alvorecer, mantendo a verdade da mensagem dourada enviada aos confins da Via Láctea. Mais do que saudações, mais do que sons de ventos e beijos, mais do que sinfonias de Bach e Mozart, uma mensagem de que em algum ponto do cosmos existe ou existiu uma civilização “realmente” humana.

Liege Karyj


Liege Karyj é leitor-colaborador do jornal e tem outros textos publicados no blog do Plástico Bolha.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Plástico Bolha no Poesia Viral




Hoje será o lançamento do filme Todos os ventos, dedicado à poesia de Antonio Carlos Secchin. Após a exibição do filme, mesa de bate-papo com: Assalto Poético, Fora de Área, Plástico Bolha e Poeme-se, com mediação de Eliza Morenno. O evento será às 19h, no Centro Cultural Justiça Federal,  Av. Rio Branco, 241 - Centro - Rio de Janeiro/ RJ. Contamos com a sua presença!

O piso da minha alma


ressoam em meu cérebro
ecos de canções que eu
nunca escreverei jamais.

mas existem em mim
como acordes tangíveis
do que se aspira a ser.

à sombra do músico adormecido
eu vivi a minha vida inteira assim
disfarçado de poeta como se fosse

um andarilho dentro de casa.

Milton Rezende


Milton Rezende é leitor-colaborador do Plástico Bolha da cidade de Varginha/ MG.

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Lançamento do livro Esse Recorte



A Editora Patuá convida a todos para o lançamento do livro "Esse recorte", poemas de Rosalia Milsztajn. O evento será realizado dia 12/03 a partir das 19h na Pizzaria Guanabara, na Avenida Ataulfo de Paiva,1228, Leblon, Rio de Janeiro.  A entrada para o evento é gratuita e o livro estará à venda por R$ 35,00 (ATENÇÃO: pagamento apenas em dinheiro ou cheque). O livro já está à venda em nosso catálogo. As compras pelo site podem ser parceladas em até 12x. Aproveite! 

Infos: https://www.facebook.com/events/477196239050942/?previousaction=join&source=1

Rosalia Milsztajn tem diversos textos publicados no jornal Plástico Bolha!

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Viagens filosóficas



Ciclo de palestras coordenado por Helio Eichbauer no Espaço Tom Jobim, Rio de Janeiro - RJ. Mais informações do evento em: https://www.facebook.com/events/388590584611935/?fref=ts

A campainha


Os fios da teia tremendo
enquanto a aranha vem
devagar, no seu tempo

Sou eu com medo
esperando a campainha tocar
e transformar em susto todo o meu sossego

As meias no varal
pingando no chão de azulejo
Antes pingavam na grama do quintal
contando as gotas eu antevejo

Os fios
que formam a teia
ou as gotas
que caem das meias

Eu esperando
esses segundo irem embora
De repente: a campainha toca do lado de fora

Olivia B

terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

Exposição de fotografias Bauhaus




Exposição Bauhaus de fotografia no Distrito Federal. De 5/2 à 9/3, no Museus Nacional Conjunto Cultural da República, Esplanada dos Ministérios.  

Lembra-se de Kant discutindo tal questão?


- Tem me doido olhar para a mesa que você ocupava e não ver mais sobre ela a sua pasta preta.  
Esta frase, prenhe de emoção, fê-lo lembrar do fetiche da mercadoria, de Marx, pelo qual as coisas se personificam e as pessoas se coisificam. Ele a entendeu e sorriu de uma forma branda e terna. Estavam ali havia mais de uma hora, entre uma cerveja e outra, com tantas palavras já ditas, e somente no adiantado da conversação que ela se lembrou de lamentar sua ausência, sabendo que a mesma fora decidida em comum acordo  para o bem de ambos.

Fitou o seu copo de cerveja e depois fez o mesmo em relação ao dela. Pareciam, ele e ela, dois copos de cerveja com cerveja, que se esvaziam à medida que são levados à boca. Sabia que a frase dela só saíra àquele momento adiantado por que vinha sob o efeito da bebida. Não viria, cogitou, sem um acompanhamento prévio, sem uma causa, que buscasse fora de si, uma força que não era dela, que não havia em si, simplesmente por que não a possuía - a vida não lhe dera - e não a possuiria dali por diante; ela disso sempre soube, por isso em um certo dia resolveram chegar a um consenso, segundo o qual ambos perderiam, disso estavam razoavelmente cientes, mas o que mais lhes importava era perder o menos possível, e o que perderam não foi pouco, tal constatação estava incrustada na frase dela, pela qual metaforicamente a mesa era ela e a pasta ele, que não mais estava nem estaria sobre ela, tampouco o inverso acontecia e não poderia acontecer.

- Você sabe... Você sabe... - Ela tentou esboçar uma reação que os levasse a reconsiderar a decisão que haviam tomado em comum acordo.

Ele baixou o copo sobre a mesa, após ter bebido um gole longo, sem saber o que dizer nem o que fazer. Quis dizer-lhe aquela famosa frase em francês, que houvera se tornado célebre  como título e tema de uma não menos célebre canção: c'est la vie. Não a disse. Fitou-a como se fosse a primeira vez. E era após muitos anos. Quantos? Eles sabiam: doze. Verem-se após tanto tempo servia, no mínimo, descontando-se tudo o que viveram, como referência para ambos. Guardadas as devidas proporções, era como alguém encontrar um conhecido, com quem nunca fora além de um bom dia ou boa tarde, e reparar que ele lhe servia de espelho para verificar qual dos dois estava mais velho, mais gordo, mais saudável, etc. A comparação seria útil para si mesmo, como uma bússola interior. Ele está bem melhor do que eu, preciso me cuidar. Ou o contrário: como estou conservado, pelo menos em relação a ele, que deve dormir tarde, alimentar-se mal, levar uma vida sedentária... Vou continuar no caminho inverso ao dele. Mas com ela, ele não conseguia referenciar-se. Quantos anos passei dentro dessa mulher? O tempo o que é? É o homem como referência. Sem o homem não haveria o tempo, pelo menos para o homem. O homem não criou o tempo, tampouco o espaço. Lembra-se de Kant discutindo tal questão? Ela não interrompeu a viagem do copo cheio de cerveja à sua boca; entornou tudo e depois, como  não entendesse, perguntou: o quê? Por favor, não beba mais; chega! Você não manda em mim! Ele nunca teve a pretensão de ser o cabeça, ela sempre o fora mais. Sempre; há limitações para esta palavra. A rigor, parece que não há sempre, salvo nos dicionários.

-  Eu quero continuar bebendo!
-  Por que?
-  Porque estamos comemorando.
-  O quê?
-  O nosso reencontro. Você não se dá conta?
-  É evidente que sim!
-  Infelizmente?
-  Eu não disse infelizmente. Disse que é evidente que sim.
-  O que isso significa?
-  Não sei.
-  Então por que disse?
-  Tinha que lhe dizer algo; estamos conversando, não estamos?
-  E também bebendo!
-  Peço-lhe que pare de beber!
-  Por que?          
-  Você já passou da conta.
-  Tem me doido olhar para a mesa que você ocupava e não ver mais sobre ela a sua pasta preta.
-  Também me tem doido, mas...
-  Mas?
-  Eu não gostaria de falar sobre isso.
-  Por que?
-  Você sabe o porquê.
-  Então vou continuar bebendo!
-  Por favor!
-  Você não manda em mim!
-  Não se trata disso.
-  Então, o que é?
- Vamos embora!
-  Para onde?
-  Você sabe!
-  E depois?
-  Você sabe!

Vinicius Bandera

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Makula 5 anos!



Atenção na Guanabara! Nessa sexta-feira, 07/02, a festa MAKULA comemora 5 anos de existência e resistência afrosoundística in Rio de Janeura City. A festa será no ateliê Fixos Fluxos, na Lapa, e o convidado é muito mais que especial: mestre Mauricio Valladares (roNca roNca)*!
Infos: www.facebook.com/events/584739118284154/?fref=ts

Patologia urbana


Em vias duplas, Enchentes exaltam sem pudor que contrai o coração,

Transporte do bem e impecável que não capacitado se torna pecável,

Saúde tão bela que parece uma fera se a gente não zela acaba na tramela,

Cura em instante sem remédio constante em pleno estado fulminante.   


Charles Oliveira