segunda-feira, 31 de maio de 2010

Um novo poema de Bruno de Abreu

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com você eu poderia
rasgar ao vento
trajetórias de calendário
sem uma dificuldade
mórbida de apostilas
em espiral e listas
telefônicas
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Bruno de Abreu
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quinta-feira, 27 de maio de 2010

Édipo — um texto de Cacau Vilardo

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Eu costumava ir para o sítio dos meus avós em Vassouras. Lá, havia muitos garotos da minha idade e, mal eu chegava, eles já batiam palmas na frente do portão para pedir consentimento para irmos brincar. Jogávamos bola, fazíamos competição de cuspe à distância, subíamos em árvores, comíamos jabuticaba na propriedade da vizinha... e, às cinco da tarde, parávamos o que estivéssemos fazendo para ir à beira da estrada de terra esperar o coxo passar.
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O coxo era um velho cego que possuía pés tortos e andava apoiado sobre uma bengala. Seus pés se arrastavam pelo saibro da estrada, deixando um rastro largo até o seu simples casebre que ficava em frente ao sítio dos meus avós. Por covardia, eu nunca havia me aproximado dele. Diziam que, no passado, ele cometera crimes horríveis, vetados para os ouvidos de menores, razão pela qual minha solta imaginação me levava a cenas dos piores filmes de terror. O velho homem ignorava os que ousavam se aproximar dele e lhe dizer idiotices. Às vezes, parava e, junto com seus passos tortos, parava a minha respiração e a dos moleques de Vassouras. Uma nuvem de silêncio nos envolvia. O coxo virava em nossa direção e, pelos seus olhos cegos, ele nos enxergava. Era apavorante perceber as cicatrizes profundas que lhe desenhavam a face.
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Eu sentia um frio em minha barriga que ia subindo e sufocava a minha garganta. Minhas imóveis pernas tremiam diante da imobilidade do coxo. E, quando ele se mexia novamente, para voltar o seu caminhar arrastado, eu e os moleques nos mexíamos também, corríamos alimentados pelo medo.
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À noite, eu ia escondido para o quarto dos meus avós. Minha avó já deixava um pequeno colchão preparado para receber o covarde neto. Meus olhos se arregalavam até as pálpebras se renderem e se juntarem.
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Um dia, meu avô reuniu a mim e aos moleques e disse que estava na hora de nos contar uma história. Contou sobre um rei de pés tortos que, ao descobrir que havia assassinado o pai e se deitado com a mãe, furou seus próprios olhos e partiu para o exílio. Na mesma hora eu e os meus amigos nos olhamos com olhares falantes. O coxo! Eu quebrei o silêncio perguntando quando que aquilo havia acontecido. Meu avô riu e disse que a história era sobre um mito de mais de dois mil anos. Meu primeiro pensamento foi que o coxo possuía mais de dois mil anos, porém, meu segundo pensamento, aproximou-me da realidade, não há ninguém que viva tanto tempo. Uma dúvida começou a vagar pela minha mente, quem era aquele coxo?
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No dia seguinte, dei uma desculpa aos moleques, não estava com vontade de brincar. Fiquei olhando, do sítio do meu avô, o casebre do coxo. Imbuído de um impulso nada familiar, fui andando em direção à casa do velho. Assim que cheguei, abri a estridente porta, pisei na madeira barulhenta do chão e entrei. A porta se fechou. Levei um susto. Fui andando pela sala e vi uma foto de um bebê, ao lado, havia uma outra foto, a de duas meninas em pé e, logo depois dessa, havia uma outra, a do coxo. Aproximei-me para observá-lo melhor na foto.
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De repente, senti algo apertar o meu pescoço, era o velho que havia me imobilizado com uma corda. Comecei a chorar. O coxo apertou mais forte o meu pescoço e ordenou que eu parasse com aquele choro de menina. Em seguida, desafiou-me “Decifra- me ou te devoro”. O pavor se revelou em lágrimas atropeladas na minha face. O velho, mais uma vez, ordenou que eu cessasse aquele choro. Eu obedeci. Então, veio a pergunta enigmática “Que criatura pela manhã tem quatro pés, ao meio-dia tem dois, e à tarde tem três?”. Eu, sem conseguir raciocinar com a corda em meu pescoço, detive meu olhar sob as fotos. Elas dialogaram comigo. Foi então que percebi que o bebê da foto engatinhava com quatro apoios, as duas moças andavam com duas pernas e o velho se apoiava em uma bengala e em suas duas pernas. A minha boca soltou a resposta “O homem”.
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Senti a corda afrouxar. O velho, arrastando seus pés, andou em direção ao seu quarto. Fiquei ali esperando ele parar. Ele parou. Fiquei esperando ele se virar para mim e me enxergar através de sua cegueira. Ele se virou e me enxergou com seu olhar cego. Permanecemos em silêncio. Quando ele voltou a se mexer, eu não corri. Uma pergunta saltou pela minha boca “Qual o seu nome?”. O velho sem se virar, respondeu “ Édipo”.
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terça-feira, 25 de maio de 2010

AMANHÃ TEM CEP 20000, NO HUMAITÁ!

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ESPAÇO CULTURAL SÉRGIO PORTO
rua humaitá, 163 (fundos)
quarta – 26 / 05 – 20:30 – 5,00.
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MARIANO MAROVATTO
E AS MARAVILHAS CONTEMPORÂNEAS
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TEATRO DO NADA
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CRISTINA FLORES + GABRIEL FOMM
gabriel alves - guitarra e violão
gabriel damasceno - bateria e percussão
juliano pires - trombone e tuba
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CRIANÇAS INSUPORTÁVEIS vol. 2
(alice sant’anna / marília garcia / botika
domingos guimarães / dimitri)
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CHACAL
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EM LANÇAMENTO:
LAURA LIUZZI / LUCAS VIRIATO
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apoio Prefeitura Rio
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segunda-feira, 24 de maio de 2010

Ilustrador do Bolha ganha concurso da Folha!

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Extra, extra! Angelo Abu, ilustre ilustrador da capa do jornal Plástico Bolha acaba de tirar o primeiro lugar no concurso de caricaturas da Folha de São Paulo. Confira aqui as caricaturas vencedoras de Angelo e entre você também na campanha para que ele não troque o Bolha pela Folha!
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Seminário sobre Brasília no Moreira Salles

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clique na imagem para ampliar.
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sábado, 22 de maio de 2010

All-star — um poema por Beatriz Bastos

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Ainda calçada,
desfaço o cadarço,
lentamente.
Penso em pés
e gatos que fogem
por caminhos incógnitos.
– O hóspede italiano
e suas duas amantes
disseram que viriam
no mesmo dia?
Há no vinho qualquer esperança
senão desolação
e um ritmo que apenas,
palidamente, apreendo.
Largo a teia
jogo os cadarços
ainda não desfeitos
todas as estrelas
no chão.
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Beatriz Bastos está com um de seus poemas na capa da próxima edição do jornal Plástico Bolha.
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quinta-feira, 20 de maio de 2010

terça-feira, 18 de maio de 2010

Novo poema de Sebastião Ribeiro

ele batalha por ser invasivo
num continente ameaçado
sem reflexos à sua frente
numa lonjura sem sons
(onde pêlo algum meu pie)
se sustenta a espécie de mar
que não precisamos
conjeturamo-lo esticado porque
mesmo num cofo de tradições
nosso corpo é impreciso
e lhe digo não não preciso inventar
nada no lugar impresso de teu passado
fomos à praia desnecessariamente
azul algum te farás pronto
a cimentar meus pés
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Sebastião Ribeiro
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domingo, 16 de maio de 2010

POESIA CONCRETA (funk do pedreiro)

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Eu carrego telhas
observo suas calhas
cheiro pó de amianto
sou quem talha as palavras

abalo abalos sísmicos
gotas, infiltrações
cavo suas rachaduras
dou orgias em construções

sou o símio bárbaro
de barro no bafo
os meus dentes são de ferro
a minha viga de sarrafo

taumaturgo desse mundo
construído em meu andaime
armo minas mnemônicas
sou fetiche de madame

elevo as grandes pontes
onde cruza o poema
só não sei que letra falta
para ganhar essa morena

É o funk do pedreiro
É o funk do pedreiro
meu chiclete é concreto
o meu saco de cimento
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quarta-feira, 12 de maio de 2010

O poeta é um cisne

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O poeta é um cisne,
Ave imaculada
Cheia de poder e graça;
Nas noites de lua
Despe seu manto de plumas
E anda nu
Despejando sêmen e espumas.
O poeta é um cisne,
Druida vestido de branco,
Pontífice sagrado
Inspirado pela luz
Que incide no lago
Imagens distorcidas
Da realidade.
O poeta é um cisne
De celeste onipotência,
Transbordando audácia,
Seu canto amoroso
É prenúncio de morte
Para si
E para o mundo.
O poeta é um cisne,
Anjo elegante
Ligado por corrente de prata
A uma casta superior.
O poeta é um cisne,
Um nobre
Navegando
No reino infinito do espírito.
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Raquel Naveira
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domingo, 9 de maio de 2010

Curso "Cidades por escrito" no Moreira Salles

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Cheiro de cola, um texto de Paulo Vogel

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Ei, moço! Cadê Deus? Prá lá? Dobra às direita? Obrigado, moço. Assim cheguei, seu Juiz. Quando tinha mãe, ela dizia que Deus ajudava os pobre. "Reza, meu filho, que Deus ajuda." Quando ficou doente, magrinha, tossia, tossia, eu pedi pra Deus curá ela. Rezei, rezei, mas ela morreu assim mesmo. Chorei pacas, seu Juiz. Fiquei sozinho, nunca tive mais ninguém, nem tia, nem madrinha, nem irmã. Pai? Não senhor. Só padastro. Três. Tá vendo esse lanho aqui no braço, foi o Zé da Corda, tava bebão, me cintou legal! A fivela pegou bem aqui ó, só porque eu joguei terra nele porque eu tava com raiva dele porque ele tava gritando com a minha mãe. Oito, oito anos e sozinho. Invadiru o barraco e botaram eu pra fora: "sai pivete escroto, aqui não tem lugar pra você". Fui pra rua. É tão bonita a cidade na madrugada... As luzes... O silêncio... Um carro, outro carro, a sirene da poliça... Nem é comigo. Me escondo. Primeira noite drumi no banco da praça mas era muito frio. Depois, quando achei aquela igreja grandona, me achegava na dobra da parede, junto daquela portona, deitava e me cobria com papelão de caixa. O senhor já viu o tamanho daquela portona de madeira, seu Juiz? Puta duma portona, né não? Tinha outros meninos. Meninas também. Maria de Jesus. Vê se pode!? Maria de Jesus! Lá isso é nome de menina de rua? Bonita a Maria. Dez anos. Mais velha que eu. A gente dromia junto, abraçado, pra esquentar bem. Eu gostava. A fome passava. É, fome. Pensa o quê? Cumê onde? Mendigava dia inteiro. Levava até tapa na cara, "vai trabalhar moleque". Oito anos, eu, trabaiá!? Já se viu! Desse tamanho! O Juiz acha que nós tinha de trabaiá? Desviei do assunto? Descurpa. Tava onde? Ah! Já sei. Tava na Igreja, abraçado, eu mais a Maria de Jesus. O Meu Jesus, foi assim que dei de chamá a Maria. Meu Jesus. É que ela tinha cara de menino não, é que foi ela que me potregeu dos maior. O Chico Pinto tinha inveja d'eu mais ela. Queria drumi com ela também, mas a Maria nada que nada, só deixava eu. Eu e ela. Juntinhos. Sonhando em casá, tê filho, uma casa bonita. Sonhando, sonhando... e chorando. A noite toda, baixinho, pra ninguém ouvir. Se alguém batia na gente? Não, era só causa aquela dor apertada no peito que fazia a gente chorá. No princípio era dor de saudade. Saudade da mãe, do barraco, das brincadera de esconde-esconde nas viela do morro. Depois a saudade acabou. Veio a raiva. Raiva dos bacana entrando na igreja, roupa bonita, olhando pra nós, olhar de desprezo...e empurrando: "sai pivete". Todo dia, nas horas da missa, era aquilo. As pessoa iam chegando, subindo as escadas, a gente corria e pedia, "dá um trocado moço? dá um trocado dona?". Quase ninguém dava. Gente ruim, num vê eu assim todo sujo, rasgado e magrela. Qué dizê, fingiam que não. Entravam direto, assim, empinado, óh, bem desse jeito. Iam rezar pra Deus. Pedir o quê se eles tem tudo? Eu é que num tenho nada! Nem casa, nem cama, nem mãe, nem irmão, nem comida, nem roupa, nem vó, nem brinquedo, nem bola, nem bala, nem lápis , nem caderno, nem escola. Pôrra nenhuma. Um dia veio o Dunga, lata na mão, dizendo "cheira, cheira, legal, mó barato". Cheirei. Funguei fortão, bem assim, oh. Na primeira dá nervoso. Logo custuma. Fiquei parecendo voando, meio mole, o senhor sabe como é? Sabe não? É bom, pode exprimentar, tem perigo não. Aí eu peguei da lata e passei pra Maria "cheira Meu Jesus, é bom!", mas ela cheirou não. Nunca cheirou. Qué dizê, só dessa vez agora que o senhor já sabe. Naquele domingo, as véias chegando de bolsa, e nós já muito cheirado. Deu uma corage! Gritei pro Meu Jesus: "corre comigo." Ela correu. Eu na frente. Mirei bem a véia. A bolsa da véia. E zapt! Inda bem que a alça rebentou. Corri, corri. Meu Jesus atrás dizia "pára, pára, que não vem ninguém". Mas eu não parava. O medo. A cola. A raiva. A fome. A dor. A tristeza. O choro. Saudade da mãe. Veio tudo junto. Só parei quando pensei que tava cuspindo o pulmão. Maria de Jesus sentou no mei-fio. Sentei junto. Virei a bolsa da velha de boca. Esparramou tudo. Lixo. Dinheiro nenhum. Só umas moeda. Como diabo aquela velha véve só com moeda? Tanta corrida pra nada. E nem podia voltar pra Igreja. Dormir onde? Comecei a chorar. Meu Jesus mandou eu calar a boca. Mulher já mandou o Juiz calar a boca? Já!? E o Juiz calou? Eu também. Ela disse: "Sei d'um lugar. Vamo.” Era um prédio em cunstrução, bandonado. Um monte de pivetes. Ela foi na frente, preguntando "quem é o chefe?" Contou porque nós chegou ali, "só tinha moeda" e coisa e tal, "vocês fica ali naquele canto, mas só hoje, amanhã fora!". Meu Jesus falou "tá bom" e eu também disse de pensamento. Naquela noite nós choramo muito, muito, mas bem, bem baixinho que foi pra não dá mole. Dia seguinte a fome acordou a gente cedo. Saimo pra rua, tudo ainda fechado. Um botequim abriu. Ficamo na porta olhando o dono lavar o chão. Aproveitamo da água com sabão, lavamo perna, braço, rosto, barriga, costa - eu lavei a costa dela, ela lavou a minha. A gente ria. O portuga também. Aí ele preguntou assim: "Os putos queirem c’fé? É só esperaire a máquina isquentaire. O pão chega já já. Sentem cá." A gente sentou. Tomamo café. Com leite. Com açúcar. Com pão. Com manteiga. Ah! Como tava bão seu Juiz! "Que Deus lhe ajude", a gente disse. Por que é que a gente sempre diz "Deus lhe ajude"? E por que ninguém diz pra gente? Será que é por isso que nós não tem felicidade como todo mundo? É, talvez, né seu Juiz? As lojas foram abrindo. As pessoas andando pela calçada. Vi o ovo bonito na sacola da dona e lembrei que devia de tá perto da Páscoa. Perguntei pra Maria de Jesus quando é que ia de ser a Páscoa. "O Padre falou que é domingo." Que domingo? "Ora que domingo? Domingo, ora!" Meu Jesus sabia era nada. "Vamo preguntá." Preguntá pra quem, se a gente nem começa falá eles já dizem "tem trocado não”! "Então a gente pregunta pro portuga do botequim." "Então os putos não sabem? É domingo agora." Voltamos pra igreja. A turma falou que o padre dono da Igreja deu uns tapa no Zé Piche pra ele confessar, contar quem foi que roubou a bolsa da velha mas ele não disse nada. De noite, Meu Jesus contou pra turma que ia ser Páscoa no domingo. Todo mundo ficou alegre. Alegre de quê? Alegre, seu Juiz, porque Páscoa é coisa de criança, tem chocolate as pampa, tem aqueles ovão lindão. Eu gosto pra burro de chocolate! O Juiz, gosta? É fissurado que nem eu é!? Mas daí o Cabeça falou assim: "e quem é que vai dar ovo pra gente, pôrra"? Ficamo tudo calado e fumo saindo cada um pro seu canto de parede, triste, porque todo mundo sabia que ninguém ia dar ovo de Páscoa pra gente porque ninguém ia lembrar nem que nós existia. Aí o Cabeça deu aquela idéia da galera ir lá pro altar na missa do domingo de Páscoa. Ele falou assim: "A gente lá, eles não tem jeito de não vê nós. Aí eles vão saber que a gente existe." Eu ri. Achei engraçado aquela coisa dum bando de pivete, tudo mulatim, sujim, lá naquele lugar cheio de santo, de ouro, bem na frente do Deus, do padre besta e daqueles ricão com as barriga cheia de chocolate. O Meu Jesus também riu. O Zito é que deu de arregá: "olha, sei não, o padre filho de uma égua pega a gente, dá porrada, entrega nós tudo pros ôme, mais porrada, depois FEBEM". "Ele num tem cu", disse a Maria, bem alto e fazendo assim oh! com os dedo. Aí o Zito falou: "Tá bão, eu topo, mas tem que ser todo mundo doidão." Concordamo. Mas precisava dinheiro pra comprar cola. Pedimo pra caramba. Eu dei mais de vinte golpe do chorão. Sabe qual é seu Juiz? É aquele de ficar sentado na calçada, chorando e com uma caixa vazia na mão. As mulhé falam: "Tá chorando por que menino?" Aí eu digo que roubaram os chicletes que tava vendendo, que eu vou tê de pagá, que não tenho dinheiro... Aí elas ficam com pena, aí ... Tá bom Juiz, eu vorto pro assunto. Juntamo todo o dinheiro e demo tudo pro Cabeça. Deu pra ele arrumar 3 latas. Dava pra mais, ele é que ficou com o resto do dinheiro mas ninguém foi besta de reclamá, nem eu, que ele é mais forte. No domingo, perto da hora da missa, foi uma cheiração danada, seu Juiz. Aí, o Cabeça na liderança, nós fumo entrando na Igreja, bem degavarinho, pelos lado, assim, o senhor sabe né Juiz? Fumo chegando, fumo subindo os degrau do altar, o padre lá, falando de Cristo, de salvar o mundo, de dar pros pobres. Dar pros pobres! Só se for porrada. E o padre não parava de falar. Aí o Cabeça foi até o último degrau, chegou bem perto daquela mesa grandona onde fica aquele copão bonito de ouro, arriou o calção e mostrou a bunda pra todo mundo. O Padre nem olhou. Teve umas mulhé que fez oh! meu Deus! mas ninguém se mexeu não. Aí me deu aquela vontade de ficar nu. Tirei a camisa, depois o carção. Segurei meu pinto e mostrei pra todo mundo, pensando assim, aqui pro’cês oh! Depois procurei Meu Jesus. Tava deitada no chão, rindo às pampa, aquele rostinho tão bonito que eu gosto, aí me deu aquela vontade e me abaixei, cheguei bem perto e beijei ela na boca. Meu Jesus deixou. Daí me pegaram, me puxaram, me bateram, me arrastaram, me xingaram, me cuspiram, me levaram. Eu mais os outros. Ontem nós vimo na televisão. Sacanagem, seu Juiz, não mostraram a cara da gente. Eu queria que todo mundo visse nós na televisão. Mas eles botaram aqueles quadradinhos, o senhor sabe como é!? bem em cima da nossa cara. Como é que vão saber que era eu? Agora quando eu contar ninguém vai acreditar! O senhor acredita, não é seu Juiz?
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Paulo Vogel
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quinta-feira, 6 de maio de 2010

Poesia para o dia do trabalho ou para o mês do trabalhador

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apara nas costas um pedaço de folha
dez vezes o tamanho da sua vontade
é necessário não ser um operário comum
segure aos dentes um
tronco ecaminhe até a colônia

se fizer isso sem reclamar
há grande chance
de você ser uma formiga
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Paulo Henrique Motta
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quarta-feira, 5 de maio de 2010

Bilíngue: A alma encantada das ruas, na ABL!

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RIO COM GENTILEZA - Restaurção dos 56 Escritos Murais do Profeta Gentileza

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ROTEIRO DO EVENTO

Data: 6 de maio
Local: Rodoviária Novo Rio
Térreo (Setor de Embarque) e na Praça Gentileza
Horário: a partir das 10h


9h30 - “Pílulas de gentileza” - imagens de depoimentos colhidos ao vivo pelos alunos da SPECTACULU serão editados no local, em blocos, e exibidos em telão. Todo o evento será registrado pelas câmeras dos alunos da ONG sob orientação dos professores Daniel Evangelista, Coordenador do Curso de Fotografia Spectaculu e Centro de Artes Espaciais Vik Muniz; e Lílian Pieczarka, responsável pela Oficina do Olhar.

10h – Apresentação: “POR GENTILEZA” - espetáculo musical, teatral, mímico e de animação - com o Grupo Mimos. Texto de Josué Soares e Leila Carvalho. Nessa apresentação, Josué Soares e Leila Carvalho recriam ludicamente os ensinamentos do Profeta, emoldurados pelas músicas originais de Lucina e Mario Avellar.

10:45h – Participação da Escola Municipal Santo Tomás de Aquino que, sob orientação dos professores Daniele Bessa e Afonso Celso Teixeira, há mais de cinco anos desenvolve trabalhos sob a temática da Gentileza.
- Apresentação do Rap por Gentileza, com letra composta por alunos da escola;
- Apresentação de hip-hop, “Um duelo sem armas”

11h – CERIMÔNIA oficial de lançamento do projeto com entrega da primeira pilastra restaurada pelo projeto Rio com gentileza, com presença da Secretária Municipal de Cultura, Sra. Ana Luisa Soares da Silva; do Subsecretário de Patrimônio Cultural, Sr. Washington Fajardo; do Coordenador de Conservação e Projetos Especiais, Sr. Paulo Eduardo Vidal L. Ribeiro; da Gerente de Projetos da Subsecretaria de Patrimônio Cultural, Sra. Laura Di Blasi; Bia Caiado, representante da Secretaria de Cultura do Estado do RJ; Subprefeito do Centro, Thiago Barcellos; de integrantes do Conselho Municipal de Cultural; representante da Secretaria de Cultura do RJ; Zezé Motta, madrinha do projeto Rio com gentileza; filhos e netos do Profeta Gentileza; diretoria da ONS (Operadora Nacional do Sistema Elétrico), patrocionadora da restauração; e, a direção da SOCICAM.

11h30 – MENINAS DO NÓS – bloco de percussão feminino do grupo Nós do Morro, coordenado pelos músicos Wellinton Soares (ex-O Rappa) e Negueba.

A partir das 12h – Oficinas de cataventos e composição de livre poética em varal de tecido estendido no espaço interno da Rodoviária, sob orientação e acompanhamento dos professores e alunos da Spectaculu.

12h – LÍNOX & banda Organismo

12h30 Telão: exibição do curta PORR GENTILEZA, de Dado Amaral (2002) e do vídeo GENTILEZA, de Dado Amaral e Vinícius Reis (1994).

13h – MC’S JUNIOR E LEONARDO – pioneiros do funk carioca, autores do Rap das Armas e outros sucessos, e fundadores da APAFUNK – Associação dos Profissionais e Amigos do Funk.

13h45 - POETAS DO CEP 20000 – leitura do “Manifesto Gentil” - Chacal, Mano Melo, Cabelo, Pedro Rocha, Ericson Pires, Guilherme Zarvos, Justo D’Ávila, Éber Inácio, Botika

14h15 – BOATO – a banda de poetas, liderada pelo artista plástico Cabelo, volta a se encontrar exclusivamente para o show no evento Rio com Gentileza.
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terça-feira, 4 de maio de 2010

Peixinhos

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Que dia triste. Sonhei que ganhava um casal de peixes. Peixes pretos escuros. Nunca tive peixes nem sonhava como cuidá-los. Mas disseram que estes peixinhos eram simples, peixes de poça, só precisavam de um pouco d’água. Coloquei-os em uma bacia transparente. E coloquei uma planta. E estava começando a admirar a pequena beleza dos peixes pretos e escuros na bacia. Não levo mais que um minuto para começar a adorá-los. E chamo alguém para ver, pensando – ter peixes! Mesmo que sejam estes peixes pretos... escuros. E num apuro, como quem quer demonstrar amor por alguém que já se sabe amado, por um exagero, ou simplesmente porque sempre tive as mãos desajeitadas, resolvi tirar um pouco da água do aquário. Afinal, eram peixes de poça. Não sei como soube que morreu, olho de peixe morto é que não tinha. O peixe preto coloriu-se todo. De vermelho, verde, azul. O peixe morto embelezou-se, do preto do dia-a-dia, agora morto, encheu-se de cores. Para que nós, os vivos, soubéssemos. E foi assim, por esta estranha lógica, que soube, entendi, que quando peixe preto e escuro se apruma e colore, se faz visto, é que morreu.
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Beatriz Bastos
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Beatriz Bastos é autora de quatro livros. Esse aqui vem do recente "Da Ilha", da Editacuja
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Exposição "Eu não sou feito de ouro", em BH!

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segunda-feira, 3 de maio de 2010

sábado, 1 de maio de 2010

Acaso — poema de Fernando Brum

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Antes era um livro fechado
Um telefone desligado
Agora é vento na árvore
Varrendo toda a ilusão
Dos olhos acostumados

É poema perdido,
Lançado ao mar
Como a tarrafa
Que vai sem saber
Que recolhe o ouro do mar

Preocupação não há
Os peixes hão de vir
Caminham cegos
Ao seu destino quiçá
Que não sabem

E cumprem seu papel
Como os papéis do livro fechado
Na ânsia de serem lidos e entendidos
Nem que seja por uma tarrafa
Lançada sem saber
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Fernando Brum
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Fernando Brum é estudante de Desenho Industrial da Puc-Rio. Já tem um livro impresso pela CBJE, Camara Brasileira de Jovens Escritores, alem de ter duas participações em antologias, uma poética e a outra de contos, numa editora de Sao Paulo. Atualmente está preparando seu segundo livros de poesias.
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