São tantas as portas; e quis abri-las. Pensei no que havia
por trás de cada uma delas. Sonhei com o que encontraria. Seriam êxtases? Ou
braços abertos prontos para me acariciar? Ou bocas ecoando palavras sem dor,
dizendo o ainda não pronunciado? Ou seriam alegrias sem fim? Eu não sei, nem
mesmo consigo lembrar, só sei que eram tão instigantes (as portas) que não
resisti e sai abrindo-as, saí girando as chaves nas diferentes fechaduras,
aberturas, olhos e impulsos, sempre em buscas desconhecidas. Eu queria descobrir,
saciar-me, se isso fosse possível - e é! – ás vezes é!... Algumas chaves me
mostraram imagens e distrações bem interessantes (eu provei!). Condensei-me sem
recusas, e, assim, germinei instantes; extraordinários momentos! Só que,
acumulado certo número de dias, meses e anos, a chama diminuía, e, outra vez,
eu, enlouquecido de interesse, pensava em outras portas, e logo a mochila se
refazia, e minhas passadas deslizavam rumo a outras portas, tantas portas,
desconhecidas portas...
As portas são infindáveis; não cessam nunca; escondem o
segredo que me faz perder os medos que me empurram para os abismos, para as
fantasias, para as noites em que me embriago sob as luzes estelares, nesse
vento forte que sacode meus cabelos e me carrega para o beijo de alguém que
amei, que amo, que já se foi para além de minha compreensão. E, ando devagar,
observando as imagens da cidade nos rostos perdidos; de todas essas pessoas que
velozmente passam por mim; as quais me enxergam sem me ver, as quais se vão
para algum lugar acreditando nunca terem cruzado comigo, pois eu não existo em
seus pensamentos coerentes, e, incoerentes vamos... Vou reformulando o percurso
dos prédios inertes que se exibem para olhos que olham e que pensam sobre a
cidade grande, cheia de gente no vai e vem se fim para qualquer lugar ou lugar
nenhum. Mas o movimento é frenético e frenético eu preciso também estar, mas
não quero estar, embora esteja, no entanto sigo em passos desconexos dentre a
multidão, e compro o bilhete do metrô neste dia que se mostra lento e, até
consigo um lugar para sentar, para olhar as pessoas conectadas e atentas
desatentas nestes mundos virtuais, mas ainda entre um clique e outro um casal
acha algum tempo para se beijar e se olham e sorriem e logo voltam aos seus
aparelhos e nesse grande aparelho atingimos outra estação, e pessoas entram e
saem e a norma educacional me diz que devo ceder o lugar, pois os mais velhos
já viveram um tanto de anos e seus ossos estão cansados. Então a velhinha olha
para mim e diz “obrigado” e vamos... Agora estou de pé, e ao meu lado a voz ao
telefone de alguém que diz: “estou quase chegando...” e, eu nem sei exatamente
para onde estou indo, mas o metrô não é infinito e logo eu terei que descer e
andar por outros locais... E noutra parada, nossos olhos se cruzam e seguimos
viagem nos inspecionando. Eu gostaria muito de saber o que se passa por sua
cabeça nestes instantes enquanto seus olhos me olham, apenas sei que seria
legal se trocássemos palavra quaisquer, afinal algum tipo de afinidade fluiu
entre nós, mas não há falas, não há palavras a nos aproximar, apenas meus
ouvidos que viajam nessa música que ouço no meu celular, enquanto você insiste
em me observar e me falar com olhos que dizem algo que, talvez eu até consiga
identificar. Nesse ínterim, atingimos outra estação, e você se prepara para
sair sustentando os olhos grudados em mim. Então você se vai, foge, desaparece,
mas permanece nos minutos seguintes percorrendo as linhas do meu pensamento, e
em seguida você se desfaz em nuvens; se evapora no imenso céu; esse céu que se
apresenta em variadas tonalidades; tons e redutos desconhecidos, e não detenho
os instrumentos para revelar-lhe; você se foi igual nuvens passageira que nem
mesmo conseguiu chuva formular, mas não, acho que gotas de você molharam o meu
ser, pois fico a pensar onde você mora e com quem se relaciona, e para onde
está indo, e também como seria se eu tivesse puxado assunto com você. Tais
suposições transformam o nosso momento em mágico e poético, em real e imaginário,
em possível e impossível... Subitamente o metrô me expulsa do seu vagão, diz
que devo sair ou refazer o percurso. Indeciso, posiciono-me na plataforma e,
observo pouco a pouco a movimentação eufórica. Mas não; preciso sair do mundo
subterrâneo e atingir a cor do sol; sentir o cheiro do ar livre; ver o
transitar dos pedestres; parar numa banca de revistas; caminhar sem direção.
Assim, minhas
passadas cruzam a orla, o mar ao longe acolhe meus olhos e sinto imensa vontade
de mergulhar. Sem pressa, envolvo-me na melodia das ondas, e danço nas águas do
mar...
Valdon Nez
Um comentário:
Páginas deste incerto livro que escrevemos pelas passadas do viver...
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