sexta-feira, 3 de abril de 2009

Pedaços, clássico do bolha por Isabel Wilker

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Nem sempre se sonha com a neve. Quando se sonha, nunca se sabe com o que — e se — se vai sonhar. Às vezes, à noite, sinto que ouço o barulho de suspiros e, ao comer suspiros, sinto o barulho de suspiros dentro da boca, dentro da mente, um suspiro do lado de dentro do ouvido. Mas nunca como suspiros. Quase sempre suspiro. Ah...(suspiro). Sabe, nem sempre se sobrevive à vida. Nunca sobrevivemos à morte. Sei que a chuva sempre chega primeiro — sempre primeiro como uma promessa. E quase sempre sobrevivemos à chuva. Nem sempre é possível se esquecer do silêncio. Se algum dia desejar esquecer alguma coisa, quero esquecer o barulho e não o silêncio, não o silêncio, quero sempre o silêncio. Quero sempre sentir o vermelho, o vermelho guarda-chuva vermelho. Água na pele é bom, mas só é bom quando é na pele e não na roupa. Sono sem sonho é como a morte — então acordar sem sonhos é como sobreviver à morte. Mas não é. Não é.
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