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domingo, 10 de agosto de 2025

Brilho de Gregorio se expande no céu com Camões entre o humor e a poesia ✨✨✨



 foto de Raquel Pelicano


Gregorio Duvivier roça a língua de Luís de Camões (1524–1580) em monólogo que estreou em novembro do ano passado em Portugal, pátria do poeta nascido há cinco séculos, e que circula pelo Brasil desde fevereiro deste ano, estando de volta em agosto à cena do Rio de Janeiro (RJ), em temporada que se estende até 31 de agosto no Teatro Casa Grande.

“O céu da língua” é um solo autoral do ator e escritor carioca Gregorio Duvivier sob direção de Luciana Paes. Mas Gregorio não está sozinho em cena. Habita o palco com ele o instrumentista Pedro Aune, contrabaixista e diretor musical desse monólogo que transita entre a poesia e a piada.

Há momentos em que a apresentação soa como recital de poesia, com direito ao canto de “Livros” (1997), música de Caetano Veloso cuja letra tem versos alusivos aos da canção “Chão de estrelas” (1939), clássico da parceria do cantor e compositor carioca Silvio Caldas (1908–1988) com o compositor Orestes Barbosa (1893–1988).

Caetano também é, cabe lembrar, o compositor de “Língua”, tema de 1984 que parece nortear a viagem de Gregorio Duvivier pelo idioma de Camões com escalas na música e no humor. Até porque há momentos em que “O céu da língua” resvala no formato popular de um stand-up de humor mordaz, como “Z.É. – Zenas emprovisadas”, espetáculo de 2003 com o qual o ator pôs os pés na profissão.

No palco nu, à frente de imagens manuseadas pela irmã Theodora Duvivier, Gregorio mostra que a língua portuguesa está viva. E que línguas mortas podem ser reanimadas, trazidas da tumba diretamente para o papo de bar. Entre uma piada e outra com a reforma ortográfica de 2009, o artista põe em debate palavras ressignificadas, como “sinistro”. Nesse sentido, a peça é sinistra!

De início, Gregorio entra em cena recitando versos de Camões, poeta nascido há 501 anos em Portugal, quando surgia com Gil Vicente o teatro português propriamente dito e onde o monólogo do artista brasileiro cumpriu temporada consagradora.

Do solene ao coloquial, o fluxo verbal de Gregorio Duvivier mantém o espectador atento à trama e ao trema. Sim, trema! Que outro ator consegue discorrer sobre a desvalorização do trema na reforma ortográfica de 2009 sem entediar o espectador? Ou partir em defesa emocionada de decassílabos, o verso mais clássico da poesia de expressão portuguesa, composto de dez sílabas poéticas, que caiu em descrença para parte da poesia brasileira atual e costuma estar ausente de conversas de bar? Ou então enfatizar o quanto de repulsa é gerada pela simples menção de uma palavra como afta, dita em cena com toque de humor, mas sem perda de respeito pela língua-mãe? Aplausos para Gregorio, portador de um discurso repleto de ironia, sarcasmo e sentimento.

Em “O céu da língua”, o espectador é surpreendido pela palavra. Palavra orquestrada para a cena, já que Gregório assina a dramaturgia do monólogo, roçando sem pudores a língua de Camões, às vezes como poeta de um passado remoto, outras como humorista do stand up mais popular da temporada.

Contudo, não há apelações. Chega-se ao céu da língua em voo de brigadeiro, sem turbulências. As fricções são das palavras, convulsionadas pelo ator para expor a elasticidade de uma língua que, na realidade, extrapola Camões, sem apego ufanista a um idioma que fez travessia intercontinental até aportar no Brasil como imposição da coroa portuguesa. A senhora da cena é uma língua que descende tanto de Camões quanto de indígenas e de africanos escravizados, que a transformaram com sua cultura e sua riqueza linguística.

Dedicado a criar no palco “confusões de prosódias” e uma “profusão de paródias”, sem deixar de realçar a devoção à língua-mãe, Gregorio Duvivier roça o céu para quem defende a presença da poesia no teatro.




Mauro Ferreira

sábado, 26 de julho de 2025

A paixão de Nelson Rodrigues ecoa em cena na voz e na alma de Fernanda Montenegro

      


Nelson Rodrigues subiu no próprio conceito quando enfim entregou para Fernanda Montenegro a peça prometida, “O beijo no asfalto”, após oito meses de insistentes telefonemas da atriz para a redação do jornal carioca “Última Hora”, no qual o escritor cumpria expediente.

Quem conta esse episódio é a própria Fernanda no palco do Teatro Multiplan, onde a artista carioca fica em cartaz até este sábado, 26 de junho, com a leitura do texto “Nelson Rodrigues por ele mesmo”, antes de partir em turnê pelo Brasil. O espetáculo vem arrebatando multidões desde 2014, em apresentações alternadas com a peça em que a artista lê texto da escritora francesa Simone de Beauvoir (1908–1986), ícone do feminismo.

Essa passagem do texto “Nelson Rodrigues por ele mesmo” adquire humor involuntário, uma fina ironia, por ser contada pela própria atriz que protagonizou a ocorrência dramatúrgica. Escrita por Nelson em 1960, “O beijo no asfalto” chegou à cena em 1961 em marcante montagem dirigida por Gianni Ratto (1916–2005) para o Teatro do Sete, grupo integrado por Fernanda com Sergio Britto (1923–2011), Ítalo Rossi (1931–2011) e o companheiro de vida, palco e coxia Fernando Torres (1927–2008), entre outros dos grandes pioneiros do teatro brasileiro.

Quatro anos depois da estreia da peça “O beijo no asfalto”, Fernanda Montenegro cruzou novamente seu caminho profissional com o de Nelson Rodrigues ao estrelar, em 1965, o filme “A falecida”, dirigido pelo cineasta Leon Hirszman (1937–1987), a partir de outro texto para teatro escrito pelo dramaturgo com o rótulo de “tragédia carioca”.

Contudo, na leitura de “Nelson Rodrigues por ele mesmo”, essas interseções biográficas importam menos do que a habilidade extraordinária da atriz para captar todos os sentimentos do mundo impressos nas linhas e sublinhas do texto em que Nelson Falcão Rodrigues (23 de agosto de 1912–21 de dezembro de 1980) recorda trechos fundamentais da vida gerada no Recife (PE), mas vivida desde a infância no mesmo subúrbio carioca que pariu Arlete Pinheiro Esteves da Silva, nome de batismo de Fernanda Montenegro, nascida em 16 de outubro de 1929, há quase 96 anos.

Arlete virou Fernanda em cena, a partir de 1950. É com a técnica e a alma distintivas de uma atriz inigualável que Fernanda lê Nelson Mas ler é verbo insuficiente, impreciso, diante da imensidão da cena, do vasto mundo amplificado pelas palavras do dramaturgo na voz grave da atriz. Mesmo que o espectador desconheça por completo o universo da obra de Nelson Rodrigues, ele sairá do teatro com a percepção de que o escritor foi um espírito em desassossego,
atormentado, entre outras coisas, pela “visão já conhecida” do assassinato do irmão Roberto Rodrigues (1906–1929), falecido com 23 anos de idade. Então, Nelson tinha apenas 17 anos.


A sombra da morte permeou a vida de Nelson, aquele cujo destino parecia ser exaltar o pecado na escrita. Fernanda diverte o público ao contar do tema da primeira redação escolar do futuro escritor (o adultério), comove a plateia ao mencionar os retiros do escritor em cidades como Campos do Jordão (SP) para tentar escapar da sanha assassina da tuberculose e surpreende os espectadores ao realçar a vaidade aflorada do dramaturgo a partir da aclamação unânime com a segunda peça, “Vestido de noiva”, marco da modernidade do teatro brasileiro na encenação de 1943 orquestrada sob direção de Ziembinski (1908–1978).

Todos esses acontecimentos parecem ganh
ar vida na voz, no corpo, nas inflexões e nos olhares de Fernanda Montenegro. Não é uma leitura o que se vê e ouve no palco, mas uma intepretação enriquecedora da obra escrita pela filha de Nelson, Sonia Rodrigues, e apresentada em 2012 com a reunião de declarações do dramaturgo em entrevistas.

A seleção de Fernanda Montenegro torna ainda mais fina a costura da obra. Há princípio, meio e fim na transposição de “Nelson Rodrigues por ele mesmo” para o palco. Há sobretudo o ritmo dado pela atriz, senhora dessa cena aliciante em que desvenda obsessões e delírios de Nelson Rodrigues, cujas angústias dores e lágrimas podem até gerar na plateia nervosos sorrisos de ironia, como sugerem os versos da ária “Vesti la giubba” (1892), tema da ópera italiana “Pagliacci” ouvido em cena como espécie de prólogo para tudo que será lido pela atriz.

No circo de ilusões e horrores da vida, Nelson Rodrigues nunca foi um palhaço, mas um escritor de alma atormentada e assumidamente reacionária que se redimiu pela obra magistral, pela revisão da postura política (a partir da prisão e tortura do filho Nelson Rodrigues Filho na década de 1970) e que, no resumo da ópera, deu o máximo de si mesmo, como sublinha ao fim Fernanda Montenegro, dama da cena, ao alimentar a eternidade do escritor na magia do palco.


Mauro Ferreira


quinta-feira, 24 de julho de 2025

O chapéu de Beckett — Helena Martins (trecho)


          

Destaca-se com frequência na literatura sobre Beckett o seu apotropismo — seu decidido afastamento de toda linguagem figurativa: “Nada de símbolos quando disso não houve a menor intenção”, são as famosas palavras finais de Watt, muitas vezes tomadas como resumidoras do projeto literário do autor. Muitos outros exemplos de apotropismo confesso poderiam ser aqui evocados, entre eles este, bastante conhecido e registrado por Ackerley e Gontarski: “se por Godot eu tivesse querido dizer God”, afirma Beckett para um desapontado Sir Richard Ralphson, “teria dito God e não Godot” (2004, p. 232). Bem antes disso, em um ensaio de 1929, ele já manifesta com semelhante ênfase e explicitude o seu desinteresse pela alegoria, por sua “operação in­telectual tripartida”, incluindo “a construção de uma mensagem de importância geral, a preparação de uma forma fabulosa, e o exercício de considerável dificuldade técnica de unir essas duas dimensões” (GE IV, p. 502). E em carta a Thomas MacGreevy, de 1955, ainda protestando contra interpretações simbólicas e alegóricas de Esperando Godot, ele declara, aborrecido: “por que as pessoas têm de complicar uma coisa tão simples é algo que me escapa”.


Helena Martins



Se você gosta de Teatro e também quer simplificar a vida, basta ler o texto completo da professora Helena Martins, pulicado no número 26 da Revista Gragoatá, de Niterói, clicando
aqui!

terça-feira, 22 de julho de 2025

4 VEZES BECKETT — de Anésio Pereira Dutra

                                           



Eu vi a queimada grassando o papel,
sem lume, sem som,
sem busca, sem dor.
A forma fumaça
contorcida em pontas acesas
no rigor das feridas.
Lastro escuro, plenitude mortal.


Anésio Pereira Dutra

Parem de falar mal da rotina, com Elisa Lucinda


Peça fundamental da poeta e atriz Elisa Lucinda, no Teatro Municipal de Ribeirão Preto, SP, amanhã! Praça Alto do São Bento, Jardim Mosteiro. Não percam!

sábado, 19 de julho de 2025

Chico Diaz questiona os conceitos de loucura e sanidade no libertário fluxo poético do monólogo “A lua vem da Ásia” 🌙

 

“Louco é quem me diz... e não é feliz”, já alertaram Os Mutantes na balada de 1972. Monólogo teatral protagonizado por Chico Diaz, “A lua vem da Ásia” é a lúcida balada do louco deste ator de origem mexicana que vive desde 1969 no Rio de Janeiro (RJ), cidade onde a peça está atualmente em cartaz aos sábados e domingos no Teatro Vannucci, até 31 de agosto.

“A lua vem da Ásia” é adaptação ferina do homônimo segundo romance do poeta e escritor mineiro Walter Campos de Carvalho (1º de novembro de 1916–10 de abril de 1998). Publicado originalmente em 1956, o romance “A lua vem da Ásia”, escrito em primeira pessoa — sob a ótica de um narrador fictício que imagina estar em lugares como um hotel estrelado e um campo de concentração quando se encontra em um hospício —, questiona os conceitos de loucura e sanidade. Ali, no palco do teatro, Diaz mostra o quanto de lucidez pode haver na loucura. E o quanto de insanidade pode haver na suposta normalidade do status quo, capaz de criar hospícios para enjaular todos que se posicionam “fora da ordem mundial”.

No quadrado do palco, iluminado de forma tão delicada quanto poética por Rodrigo Belay, o ator dá vida e voz a um louco-são
que, com grau adicional de mordacidade (contribuição do ator ao texto de Campos de Carvalho), dispara torpedos políticos, tingindo o romance com o verniz da atualidade. Direita? Esquerda? Centro? Que caminho seguir? O narrador criado por de Campos de Carvalho segue os caminhos imprevisíveis e insondáveis da própria mente, ciente de que cada mente humana é uma ilha isolada, cercada de loucuras por todos os lados.

Adaptador do romance para o palco, Chico Diaz tem intimidade com o texto de Campos de Carvalho. O ator já encenara “A lua vem da Ásia” em 2011. A montagem ora em cartaz no Rio de Janeiro é uma segunda versão do texto trabalhado pelo ator para a cena. Em rotação pelo Brasil desde 2021, essa remontagem se afina com a quentura e a fricção de um país polarizado e em ebulição política desde 2016. Não há panfletagem em cena, mas o lucidez alucinada de Diaz sabe e aponta os caminhos a serem seguidos, com direito a uma saudação ao revolucionário marxista Che Guevara (1928–1967).

É preciso ter prévio conhecimento da obra de Campos de Carvalho para poder fruir, em toda a plenitude, essa adaptação cênica que concilia suavidade e surrealismo, tangenciando o universo do Teatro do Absurdo. A mente desgarrada do “ser insano” é a válvula de escape, o passaporte que garante amplo trânsito por um mundo sem fronteiras. Em essência poética, “A lua vem da Ásia” é uma volta ao mundo dentro da própria cabeça. E a moral da história é que a liberdade da loucura é a única possível rota de fuga que leva à sanidade mental.

Além de iluminar consciências com o tom provocativo do texto, a lira do delírio de “A lua vem da Ásia” é veículo para a exposição do talento sobressalente de Chico Diaz. Longe de qualquer traço caricatural, a máscara facial do ator realça a imensidão da imaginação do louco lúcido que encarna em cena. Nada sobra. Nada tampouco falta. Ajudado por figurinos que evocam a leveza e a liberdade que movem o suposto “doido”, Diaz é a imagem poética da precisão em cena, transitando com naturalidade entre a memória de alguns fatos e a invenção de outros fatos pela mente delirante do personagem.

Campos de Carvalho chegou a caracterizar a narrativa de “A lua vem da Ásia” como um “gigantesco grito lançado sobre a vulgar balbúrdia cotidiana”. No sanatório geral de 2025, o grito do poeta reverbera nas palavras de Chico Diaz no centro de um palco que representa o mundo livre e são da imaginação.


Mauro Ferreira

segunda-feira, 14 de julho de 2025

“Senhora dos afogados” realimenta no Teatro Oficina o fogo sagrado de Zé Celso 🔥🔥🔥

 
                                                         foto de Sérgio Fernandes


Na química da natureza, a água traga e apaga o fogo. Na combustão do teatro, na cena armada pela diretora Monique Gardenberg no palco-corredor do Teatro Oficina, as águas míticas de “Senhora dos afogados” trazem à tona e realimentam o fogo sagrado do dionisíaco encenador José Celso Martinez Corrêa (1937–2023), criador do Oficina e um dos mais relevantes arquitetos da cena teatral brasileira em todos os tempos.

Em cartaz no Oficina de sexta-feira à segunda-feira, na sede paulistana do teatro projetado pela modernista arquiteta Lina Bo Bardi (1914–1992), a encenação de “Senhora dos afogados” é a primeira produção do Oficina após o encantamento de Zé Celso, há dois anos, em decorrência de queimaduras sofridas em incêndio, numa trapaça da sorte que corroborou a presença do fogo como elemento de ascensão, crescimento e desaparecimento (físico) no destino do artista.

Um dos textos mais malditos da obra do dramaturgo carioca Nelson Rodrigues (1912–1980), “Senhora dos afogados” era um desejo, quase obsessão, de Zé Celso. Escrita em 1947, mas somente liberada pela censura em 1954, a tragédia mítica — assim classificada na dramaturgia desse escritor que deu contornos modernos ao teatro brasileiro em 1943 com a montagem de “Vestido de noiva” erguida sob direção do polonês Ziembinski (1908–1978) — simboliza no Oficina uma interseção entre o estilo orgiástico das encenações de Zé Celso e a arquitetura visual dos espetáculos de Monique Gardenberg, diretora que se vale de recursos audiovisuais para criar no palco imagens projetadas com forte aderência na mente do espectador.

O texto de Nelson está lá, íntegro, mas potencializado pela convergência desses estilos e referências aparentemente díspares. Na tela gigante colada numa das paredes, imagem das águas revoltas de um mar banham a montagem e refletem a agitação existencial da família Drummond, atormentada por mortes — todas relacionadas às águas do mar que levam os corpos inertes ali jogados para a eternidade — e desejos proibidos.

Não por acaso, uma canção pouco lembrada de Roberto Carlos e Erasmo Carlos (1941–2022), gravada por Wanderléa em 1969, reverbera na cena, no registro original da “Ternurinha”, e se impõe na trilha sonora pautada pela intensidade afinada com a alma das personagens. Nessa trilha, cabem tanto um fado — “Nem às paredes confesso” (1952), ouvido na voz referencial de Amália Rodrigues (1920–1999) e Anabela — quanto uma valsa dilacerada de dor, “Súplica” (1940), gravada por Orlando Silva (1915–1963) em período áureo.

Tudo se afina com o texto em que, na trágica trama familiar de Nelson Rodrigues, a ação opõe mãe (Dona Eduarda, personagem de Leona Cavalli, atriz que vive momento de consagração com a autoridade de ter sido revelada como a Ofélia de um já longínquo “Hamlet” encenado por Zé Celso) e filha (Moema, vivida por Lara Tremouroux, grande surpresa do elenco por manter a alta voltagem emocional do espetáculo nas muitas cenas protagonizadas por Moema) em jogo de amores, ódios e crimes que nem às paredes mãe, filha e demais integrantes da família confessam.

Paira na cena, com o olhar perdido e longe dos loucos, Dona Marianinha, a matriarca interpretada com maestria por Regina Braga. Dona Marianinha perdeu a sanidade por ação do filho, Misael, personagem de Marcelo Drummond, peça também importante nesse jogo de lances arriscados e passionais.

Na ação dominada por mulheres, há também o fantasma da prostituta assassinada na beira do cais, personagem de Sylvia Prado, e o luxuoso coro das vizinhas interpretadas por Cristina Mutarelli, Giulia Gam, Ligia Cortez e Michele Matalon. Com a acidez das línguas, as vizinhas simbolizam em “Senhora dos afogados” uma representação mais ferina do coro das tragédias gregas. Mas a tragédia acontece no Brasil de hipocrisias e conservadorismo.

Imersa na plenitude emocional do elenco, a encenação do texto pelo Teatro Oficina faz emergir o poder aliciante de um dramaturgo sem papas na língua e que se revela ainda e sempre poderoso na cena imagética de Monique Gardenberg, hábil ao reacender o fogo sagrado de Fênix-Zé Celso sem apagar a própria carga autoral como diretora.



Mauro Ferreira


A Lua Vem da Ásia, de Campos de Carvalho

 


terça-feira, 8 de julho de 2025

teatro — poema inédito de Lucas Viriato

quando estamos
no teatro contemporâneo
no melhor dos cenários
pelo feitiço de um período
não estamos no Rio
nem em Sampa nem em BH
não tem aqui nem acolá
quando estamos no teatro
estamos apenas

(estamos sempre
em Atenas)


Lucas Viriato

 

segunda-feira, 7 de julho de 2025

“Prima Facie” expõe a equação imprecisa entre cumprir a lei e fazer justiça, por Mauro Ferreira

                                                                 foto de João Caldas Filho


N
o centro do palco, no jogo cenográfico de cadeiras e mesas, uma cadeira se impõe, alocada bem ao alto, solene, soberana. A cadeira elevada na cena de Prima Facie representa a autoridade austera de um juiz, senhor da razão e das decisões sobre vidas alheias. É sobre a Justiça — ou melhor, sobre o desequilíbrio da balança imprecisa da Justiça — que a dramaturga e advogada australiana Suzie Miller discorre no texto que estreou em Sidney em 2019 e que, desde então, vem arrebatando plateias e conquistando láureas mundo afora, inclusive no Brasil.

A peça arrebatou plateias inglesas e norte-americanas em 2022. Em palcos nacionais,
Prima Facie se tornou um dos acontecimentos teatrais de 2024, impactando o público e alçando a atriz Débora Falabella ao topo do ranking das atrizes mais premiadas do ano passado. A ponto de o espetáculo continuar em cartaz com fôlego neste ano de 2025, no momento com sessões que vêm lotando o Teatro Clara Nunes, na cidade do Rio de Janeiro (RJ), em temporada que se estenderá até o fim de julho.

Em cena, sob a direção de Yara de Novaes, Débora é Tessa, advogada implacável na defesa de homens acusados de agressões sexuais contra mulheres que Tessa, impiedosa, descredibiliza diante de um tribunal geralmente masculino com a frieza dos profissionais puro-sangue do Direito.

O
turning point da dramaturgia de Prima Facie acontece quando Tessa deixa de ser a advogada calculista e invencível para virar a mulher vítima de estupro que busca justiça no tribunal, lutando para condenar o colega de trabalho que forçou uma relação sexual, usando inclusive a força física, no desenlace trágico de uma noite de bebedeira.

Quando o jogo vira e os papéis se invertem, Tessa personifica a própria “Girl on fire” do título da música de Alicia Keys, que se impõe na trilha sonora do espetáculo. É quando Tessa passa a sentir na pele e na alma machucadas os efeitos cruéis da equação imprecisa entre cumprir a lei (usando todas as brechas dessa lei para inocentar homens culpados, como ela sempre fizera com alardeado orgulho) e fazer justiça.

Quando uma mulher é ouvida em tribunal como vítima de crime de natureza sexual, a balança da Justiça pende sempre para o lado dos homens. Porque o sistema é patriarcal. Porque uma mulher terá sempre que provar inocência mesmo quando é ela quem acusa um réu já previamente absolvido pelas convenções machistas.

Algo tem que mudar, reconhece Tessa, dando a moral da história de
Prima Facie, quando a advogada tornada vítima tem a certeza de que o jogo está perdido para uma mulher que busca reparação judicial após ter sofrido um estupro ou qualquer outro tipo de agressão sexual. E, sim, esse jogo está sempre perdido quando o réu tem dinheiro para contratar os advogados puro-sangue da raça a que um dia Tessa pertenceu.

A cenografia soturna e imponente de André Cortez acentua o papel opressor da Justiça. Tessa, que antes apequenava mulheres no tribunal para não “chegar em segundo” (eufemismo usado por ela para perder uma causa), agora sente o peso de se ver minimizada, esmagada, pelo sistema que usara com força. Mas a indignação de Tessa a engrandece aos olhos do espectador, cúmplice da dor da personagem interpretada com intensa veracidade por Débora Falabella sem qualquer ranço de melodrama ou sentimentalismo.

E é aí que
Prima Facie se agiganta como dramaturgia. Ao fim de um jogo bem armado, o texto escancara as cartas marcadas de uma Justiça feita para absolver homens e condenar mulheres que, recusando o discurso intimidador da vergonha, se encorajam e ousam apontar o dedo na cara de estupradores e abusadores. Mulheres em busca de Justiça. E, sim, algo precisa mudar com urgência no sistema judiciário para que a balança não penda descaradamente para o lado dos homens mais ricos e mais canalhas.


Mauro Ferreira



Ficha Técnica

Texto: Suzie Miler
Direção: Yara de Novaes
Tradução: Alexandre Tenório
Cenário: André Cortez
Figurino: Fabio Namatame
Iluminação: Wagner Antonio
Trilha Sonora: Morris
Consultoria jurídica: Maria Luiza Gomes e Mateus Monteiro
Assistentes de direção: Ivy Souza e Renan Ferreira
Coordenação administrativa: Coarte
Assessoria de Comunicação: Pedro Neves e Lucas Viriato / Clímax Conteúdo
Produção Executiva: Catarina Milani
Direção de Produção: Edson Fieschi e Luciano Borges
Realização: Borges & Fieschi Produções e Antes do Nome


PATROCÍNIO: @ILOVEPRIO

quarta-feira, 16 de maio de 2018

Peça "O ateneu" de Carlos Wilson


A peça "O ateneu" está em nova temporada até o dia 30 de maio!



sábado, 5 de março de 2016

Medida por Medida, de William Shakespeare, no teatro João Caetano


"Permanece a convicção de que Shakespeare é de uma atualidade fascinante. Hoje tive a oportunidade de assistir à montagem de "Medida por Medida", uma das peças conhecidas como "dark comedies", do diretor Ron Daniels. Em linhas gerais, a trama da peça se desenvolve uma vez que Angelo, detentor temporário do poder legislativo na cidade, decreta a sentença de morte para Cláudio. Cláudio convoca, então, sua irmã - Isabela - para que convença Angelo de voltar atrás em sua decisão. Isabela vai até Angelo e este a propõe um acordo: caso ela transe com ele, a decisão seria revogada. Ao recusar a proposta de Angelo, Isabela é assediada sexualmente por ele, mas foge antes de Angelo ser capaz de forçá-la a fazer sexo. A cena seguinte coloca Isabela na prisão contando a Cláudio do ocorrido, o irmão por sua vez acha que ela deveria aceitar esse "pequeno pecado" para salvar sua vida. Em toda peça, a plateia é crucial para o desenvolvimento dos atores em cima do texto encenado. No caso de hoje, assisti a essas duas cenas vidrado no palco. Vi de um lado da plateia subirem gargalhadas enquanto Angelo perseguia Isabela com a clara intenção de estuprá-la. Conforme os gestos do ator faziam de Angelo quase que um pateta machista atrás de Isabela, as gargalhadas pareciam inevitáveis; foi então que começaram a surgir ecos de um riso nervoso - daqueles que não temos certeza se podemos ecoar. A cena terminou. Seguiu-se para a cena de Cláudio implorando a Isabela para fazer sexo com Angelo e permitir-lhe viver um pouco mais. Risos, fossem eles de qualquer tipo, pipocavam raramente. A seriedade das cenas começaram a ser percebidas. Não havia nada de engraçado ali. A resposta a isso foi o clamor da plateia quando, no final da apresentação, todas as luzes do teatro se acenderam e Isabela pergunta a nós (!!!) o que merecia Angelo em resposta aos seus atos: JUSTIÇA! Parabéns Ron Daniels, Luísa Thiré, Thiago Lacerda e grande elenco, vocês fazem jus ao Bardo! Que comecem os 400 anos da morte de Shakespeare com uma belíssima montagem brasileira, retratando temas cuja atualidade chega a assustar o espectador..."
Gabriel Leibold

E é assim que começamos as homenagens aos 400 anos do falecimento de William Shakespeare: com as belíssimas montagens das peças Medida por Medida e Macbeth, dirigidas por Ron Daniels e com participação de Thiago Lacerda, já consagrado por sua presença em Hamlet. Ambas encontram-se em cartaz no Teatro João Caetano, na Praça Tiradentes, do dia 03 ao dia 20 de março, nos seguintes horários:

Macbeth: quintas e sábados, às 19h.
Medida por Medida: sextas, às 19h; domingos, às 18h.

O valor dos ingressos para ambas as peças varia entre R$30 e R$60, e a classificação etária é 14 anos. Para maiores informações, acesse os sites:

Macbeth: http://www.ingresso.com/Rio-De-Janeiro/home/espetaculo/teatro/repertorio-shakespeare-macbeth/teatro-joao-caetano

Medida por Medida: http://www.ingresso.com/Rio-De-Janeiro/home/espetaculo/teatro/repertorio-shakespeare-medida-por-medida/teatro-joao-caetano

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Quero ser Fernanda Torres



"Quero ser Fernanda Torres"

Comédia - Monólogo
Texto e Interpretação: Tiago Maviero
Assistência de Direção: Henrique Haddefinir.

Apresentações nos dias 31 de Maio e 14 de Junho.

Aproximadamente 50 minutos
Classificação 16 anos

Sinopse
Quero ser Fernanda Torres

Narra a aventura de um rapaz que acordou, se olhou no espelho, e viu que havia se transformado na atriz Fernanda Torres. Animado com o novo corpo, ele decide sair pela ruas do Rio de janeiro. A peça flerta com a comédia de erros e de situação, em uma reflexão bem humorada sobre a troca de identidade, o que neste caso, inevitavelmente se transforma também em uma discussão de gênero na sociedade.

Local: Audio Rebel. Rua Visconde e Silva, 55. Botafogo.
Tel: 3435-2692
Às 20:30h. Entrada: R$15.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

"do artista quando jovem" de volta ao Rio

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Nova temporada da peça "do artista quando jovem", no Teatro Tablado. Para ver o programa ampliado basta clicar na imagem.
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terça-feira, 17 de novembro de 2009

quarta-feira, 21 de outubro de 2009