sexta-feira, 22 de junho de 2018

A mulher na praia



Todos os dias caminho no calçadão. Sempre muito cedo. Só consigo manter a decisão (minha) e a promessa (ao médico), se bato a porta logo que o sol aparece.

Somos uma turma pequena, quase sempre as mesmas pessoas que surgem das ruas perpendiculares à praia e andam de lá para cá, indo emboraquando chegam as babás e os bebês, as enfermeiras e os velhinhos sedentos de sol.

Foi na semana passada. Parei para tomar uma água de coco, e vi a mulher que ia na direção do Arpoador. A posseira de um território ainda desabitado.

A claridade me cegava, mas me pareceu uma mulher de meia-idade, com um duas-peças discreto, um chapelão exagerado para o horário.

Num exercício de imaginação, criei uma personagem. Uma mãe de família louca por um mergulho antes de enfrentar o tanque e o fogão? Uma executiva que aproveitava para se revigorar para inúmeras e inúteis reuniões? Uma professora que ia encarar alunos malcriados e rebeldes?

Não sei. Mas conto que, na manhã de sol acanhado, a mulher na praia deixou o chapéu na areia, tirou o soutien e mergulhou no mar azul. Um topless sem plateia.

O mergulho foi rápido. Eu ainda estava no quiosque quando ela saiu da água. Sacudiu o cabelo, vestiu de novo o soutien e voltou para o final do Leblon.

Naquela manhã, a mulher na praia se fez sereia. Uma sereia carioca.

Marilena Moraes