quinta-feira, 6 de junho de 2013

O copo está caindo...


O copo caiu. O trânsito estava insuportável como de costume. Elogios em meio um paraíso automobilístico, com a paisagem vibrante da cidade cinza. Chegou em casa e, com gotas de suor ziguezagueando pelo corpo adentro e afora, só pensava em tomar um banho, bater um prato de arroz com feijão e procurar sua mulher. Porém, o que encontrou foi uma louça suja, baratas rondando a mesa e uma pilha de contas. Sentou-se. Colocou gelo no seu copo de pinga. Ai que alívio. E fechou os olhos que se misturavam em meio aos delírios de um bicho cansado.

O copo caiu. Deu início a uma tremedeira, suor, suor, palidez, e aos poucos pernas, braços, corpo foram ficando fracos, bambeando e resistindo os últimos segundos. Era uma terça à noite. Não tinha ninguém em casa, pois já havia perdido todos os queridos por conta das agressões e surtos. E assim, foi perdendo os últimos motivos para continuar vivendo o que lhe restava. O copo caiu. Os gritos eram gritos de silêncio, ou pelo menos as almas que habitavam o prédio silenciavam os gritos do Homem. O socorro já lhe era inútil. O copo caiu. Assim já estava totalmente travado, agora todo o ódio e o rancor que guardara por anos tomava seu corpo e o imobilizava como uma criança sendo entrelaçada por um enorme rolo de fita isolante. O copo caiu. O copo quebrou, se estilhaçou e o Homem também caiu, quebrou-se e estilhaçou-se.

Felicio Dias

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