domingo, 2 de agosto de 2015

Tentação do Mar


I
Vem, barqueiro
atira tua vida
contra as pedras
Já não é teu coração
um estilhaço de madeira
mágoa e engano?
Vês alguma diferença
entre a morte e o mar,
o amor e a ingratidão?
Atira tua embarcação
contra a lâmina dos rochedos
Por que ainda resistes
se não encontrastes
nenhum continente
onde houvesse pureza
sequer uma ilha
que a compaixão habitasse?
Vem, barqueiro
desiste de tua procura
tua bússola é o diabo
—leva-te para a desgraça—
Atira tua vida
contra as pedras
Teu sono será eterno
terás um travesseiro de sal
e a água limpará teu abandono
Dormirás como um inocente
nascerás e serás vidente

II
Vem, barqueiro
joga-te ao mar
As ondas são impiedosas
e engolirão tua embarcação
como saturno comeu seus filhos
Não adianta remar
o mar é o útero
para onde retornará
feito criança indesejada
Teu balde é raso
jamais esvaziará teu medo
e as águas te inundarão
revelando tua traição
Vem, barqueiro
abandona-te ao corte
serás mais feliz
quando fores morte

Pedro Spigolon

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