sexta-feira, 20 de junho de 2025
Questio
O tempo
é um senhor
indefectível
e constante,
a perenemente
exigir renúncias,
demandar sacrifícios,
ordenar-nos
à sartreana
condenação à liberdade.
Como escaparmos então,
ao senhorio,
à escravidão do tempo?
Eis aí um problema filosófico
Thássio G. Ferreira
quinta-feira, 19 de junho de 2025
Dissolução
Nesse momento você magoou alguém,
Outro te feriu.
Assim segue o mundo.
Em combate,
Contra-ataque,
Conte todos os meus segredos.
Mas não esqueça,
Eu também sei o seu.
Quem machucar mais
Será o vencedor,
Ou perdedor.
Há perda pior que o amor?
Monique Nix
quarta-feira, 18 de junho de 2025
Aqui II
Ela foi-se.
Não há sombra de nuvem
neste solo ressecado pelo tempo
nem ar de lua no meu coração
naturalmente congelado em tua boca.
A fuga precisa dos olhos
para a firmeza do firmamento
já que sou humano
e pequeno diante das estrelas.
Edison Veoca
terça-feira, 17 de junho de 2025
Santa Teresa
Azul explosivo
verde lancinante
e o sol, onipresente,
halo
na cabeça da mulher escalpelada.
Cláudia Roquette-Pinto
segunda-feira, 16 de junho de 2025
workaholics
ás vezes um dos moveis
simplesmente estala
a pia pinga
a geladeira comunica seus
parcelados serviços
e no entanto os carros lá fora
se silenciam
dando caráter de grandeza
à vida inanimada que se gera aqui
dentro dos pequenos informes
enquanto o resto do mundo
dorme
Caio Carmacho
domingo, 15 de junho de 2025
Um poema de Thiago de Freitas Peixoto
A operação policial
foi um sucesso
dizia o jornal mais vendido:
12 mortos e 4 feridos.
Thiago de Freitas Peixoto
sábado, 14 de junho de 2025
Um poema de Clara de Góes
Entardece no Leblon
e os velhos se esquecem
pelos bancos nas calçadas.
Discutem os rumos da Copa
e da nação. Resolvem a vida
enquanto o tempo lança o arrastão.
Clara de Góes
sexta-feira, 13 de junho de 2025
São João da Varjota_pi
bem acima da sombra das árvores
em frente ao mercado municipal
o voo solitário das tardes de outubro
desliza pela vastidão do firmamento
pelos galhos secos espalhados pelos campos
alheios ao silêncio minguante dos cursos d'água
Adriano Lobão Aragão
quinta-feira, 12 de junho de 2025
Transplante, de Jovino Machado
se o meu coração não bastar
te dou meu riso e meu rim
se o meu coração não bastar
te dou meu fígado e o meu fim
Se o meu coração não bastar
te dou meu olho e o meu olhar
é pegar ou largar
Jovino Machado
quarta-feira, 11 de junho de 2025
A procura
O dia amanhece na minha solidão
Tento alcançar coisas que não vejo
Se estiver errado, procuro no tempo me encontrar
O tempo, as lembranças, são retratos que se apagam
Mas a palavra ministra a nossa alma
Guiada por um coração
Pulsante e enraizados por atitudes de quem procura ser feliz.
Sou a boca da noite, e vou mastigar o mundo!
Mery Onírica
terça-feira, 10 de junho de 2025
Sereiando, texto inédito de Indira Kupfer
Indira Kupfer
segunda-feira, 9 de junho de 2025
Química cerebral
Bom dia Lexotan
Bom dia Prozac
Bom dia Diazepam
Bom dia coquetel
Bom dia Amplictil
Bom dia Fenergan
Bom dia eletrochoque
Bom dia Piportil
Bom dia Lorax
Bom dia Lithium
Bom dia Haldol
Boa noite Rodrigo
Rodrigo de Souza Leão
domingo, 8 de junho de 2025
Líquen e pedra
A pedra cala.
Sabe que no empenho
do líquen para aderir
se esconde um drama atroz.
Não está claro
se recusa essa vizinhança
ou bem a propicia
em uma imperceptível dança.
Néstor E. Rodriguez
sábado, 7 de junho de 2025
burra, um poema de Anelise Freitas
burra feito porta
ainda lembro dela
vendo as siamesas:
— são irmãs?
Anelise Freitas
sexta-feira, 6 de junho de 2025
Café, um poema de Raquel Naveira
Dê-me café,
Quero escrever.
Uma xícara desse tônico
E terei forças renovadas,
Encontrarei a palavra perdida
Que caiu como folha
Da árvore da vida.
Dê-me café,
Quero escrever.
Sou aristocrata,
Poeta,
Basta o aroma
E cantarei a luta de amor e fé
Nesta página aberta.
Dê-me café,
Quero escrever.
Estímulo para meu cérebro,
Investigarei pensamentos,
Sentimentos,
Decretos divinos
E registrarei tudo
Com dedos ágeis sobre as teclas.
Dê-me café,
Quero escrever.
Um pouco mais
Dessa infusão das Arábias
E não terei mais sono,
Revelarei segredos,
Juntarei letras em estranhas galáxias
E mergulharei num outro universo.
Dê-me café,
Quero escrever
Até morrer.
Raquel Naveira
quinta-feira, 5 de junho de 2025
Um poema de Thiago de Freitas Peixoto
Se a opinião
estiver na capa da VEJA
reveja!
Thiago de Freitas Peixoto
quarta-feira, 4 de junho de 2025
terça-feira, 3 de junho de 2025
segunda-feira, 2 de junho de 2025
a figueira de Auroville
a figueira
finca fundo
fura o solo
faz de tudo
a figueira
filtra a luz
feito fibra
flora-teto
a figueira
fica em foco
fala muda
infinita
Lucas Viriato
domingo, 1 de junho de 2025
Sangue Português
Fiz jus
Ao meu sangue português,
Este foi meu fado:
Deixar o passado,
Arremeter-me contra o desconhecido,
Acima da minha pequenez.
Desejei tudo:
Uma nova estrela,
Uma nova sorte,
Atribuí ao fado
O meu cansaço
De alma forte.
Estaria morto,
Absorto em mim mesmo,
Se não tivesse partido;
Velas ao vento
Entre cruzes,
viajei em busca do meu ideal,
Bem ou mal,
Não sei quando chegará minha hora,
Minha vez,
Mas sei que fiz jus
Ao meu sangue português.
Raquel Naveira
sábado, 31 de maio de 2025
Um poema de Flávia Muniz Cirilo
Só eu escuto a voz do meu desejo
Somente eu ouço os ecos dos sentidos
Talvez os anjos e os hiatos da noite escura.
Meu corpo estremece inteiro em segredo
Minha alma, sedenta de acolhimento, me procura.
Flávia Muniz Cirilo
sexta-feira, 30 de maio de 2025
Cada osso
Quando nossos corpos fundirem-se,
cada osso se desintegrará,
o gozo irá surgir aos poucos,
até que nossas almas se toquem,
meus olhos não chorarão de prazer,
meu corpo não soluçará dor,
mas reagirá forte,
a qualquer tentativa de cura.
Carlos Cardoso
quinta-feira, 29 de maio de 2025
Pequena orgia em Berlim
As duas dão-me o colo subalterno
quarta-feira, 28 de maio de 2025
A todo o tempo
as coisas vêm
a um lume frio
zumbindo corredor fora
aos tantos cinemas
desta estação balnear
ex machina
(as coisas vêm)
infalivelmente
aos fortes torres
descosem nuvens
em franco exílio do quadro
Ismar Tirelli Neto
terça-feira, 27 de maio de 2025
Acontecimento
à altura do impossível da Marginal
Tietê
lugar acessível à ponte da Casa
Verde
travessia em direção a
Marte
naquele preciso local quando abriu o
sinal
em um meio-dia de insolúvel
dia
quando enfim abriu-se o
sol
uma ocorrência sem igual: o
tempo
se casou com o
espaço
gerando então uma
flor
Luciana Tonelli
segunda-feira, 26 de maio de 2025
domingo, 25 de maio de 2025
Um dia
Francisco Caruso
sábado, 24 de maio de 2025
"Mais quatro peças fáceis", poemas inéditos de Paulo Henriques Britto
I
O tempo sempre responde
a pergunta nunca feita.
Mesmo não se sabendo de onde
veio a resposta, ela é aceita,
pois que a pergunta em questão
não foi feita por ninguém.
Ignorá-la? Não é opção.
Reclamar? Como? Com quem?
II
Ser incompleto, e só, é ser.
O ser completo é só ter sido.
E mesmo assim o que se busca
é a sensação do concluído,
acreditando (por ingênua
superstição gramatical)
que o “in” de “incompleto” implica
que a completude é o natural.
III
Tudo entender, nem tudo perdoar.
Sempre se pode perdoar mais tarde,
mas entender requer velocidade
e precisão, pra derrubar do ar
a ave em pleno voo. Já o perdão
(tal como a vingança) nunca tem pressa.
A ave pousou, pôs ovos à beça
e os chocou — sim, perdoar. Por que não?
IV
Um dia ainda vou rir de tudo isso.
Mas serei eu mesmo a rir nesse dia?
O eu novo estará rindo do antigo
ou daquilo de que
hoje eu não riria?
Paulo Henriques Britto
sexta-feira, 23 de maio de 2025
Purgatório, de Gabriel Silveira
Gabriel Silveira
quinta-feira, 22 de maio de 2025
Êxtase
Aprecio
o tempo
do amor
em estado de latência.
Ser perfume
antes de exalar o aroma
Aguar a boca
antes de tocar com a língua.
Permaneço em vertigem.
Entro em êxtase
ao recordar nossos olhos
contemplando-se mutuamente.
Flávia Muniz Cirilo
quarta-feira, 21 de maio de 2025
O Bitcoin furado
Ẹgrium Tạdrel
terça-feira, 20 de maio de 2025
Resumo de vida
encontrei um telefone
tocando no meio do nada
quando atendi, desligaram
era engano
Mr. Oculus
segunda-feira, 19 de maio de 2025
Negócio ódio
tinha esse negócio esse ócio esse ódio
lodaça embófia empáfia
esteroides estereótipos
glúteos e crânios
carapuças carapaças
esse negócio todo
oco
mortiço globo ocular
natimorto símio
semente chocha
essa barafunda surda
esse ócio negócio esse ódio
essa turba essa surra essa burra
e eu aqui
estudando
diplomacia
Paulo D'Auria
domingo, 18 de maio de 2025
Ventania
Iluminar a sombra
e torcer pelo sol
até que venha a chuva,
sapatear pela escuridão
com trovões e ventania,
molhar os dedos
sentir o frio e o arrepio
que é estar.
Carlos Cardoso
sábado, 17 de maio de 2025
Eu também quero
Eu também quero
mentir bastante
eu também
gritar céu-silêncio
eu
(impossível controlar)
quero que você sirva
ao ponto cego
se entregue à fúria
não acredito
num deus que desmancha
Marilia Kubota
sexta-feira, 16 de maio de 2025
quinta-feira, 15 de maio de 2025
El Duende
O dia lapida
o lado mais raro
da dor.
A mulher transpira
pelos poros iridescentes
dos dias.
Há dias
em que um homem
tem o tamanho de uma flor.
Rodrigo Garcia Lopes
quarta-feira, 14 de maio de 2025
Aportar
Meu corpo àvido
À deriva
Na rota do desejo/deseja
Embarcar em seu porto/corpo
Na turbulência das sensações
Ancorar minha excitação
Cláudio Márcio Barbosa
terça-feira, 13 de maio de 2025
Cóssegas
Corro suas mãos
por minhas risadas
que não se envergonham
ao seu olhar,
aprenderam: namorar
Jade Prata
segunda-feira, 12 de maio de 2025
Deusas
poucas mulheres
já me deixaram
com o pé
atrás, na dúvida
quanto à existência
desse tal Deus
e suas obras
divinas...
você, Raissa
sem dúvida alguma
é uma delas.
Mr. Oculus
domingo, 11 de maio de 2025
ciúme
Flecha vazia
de além-mar
pego um barco e vou te ver?
peito vazio em flor.
Papéis rasgados,
cartões-postais que escondo
chegou a carta?
chegou meu amor?
Beatriz Bastos
sábado, 10 de maio de 2025
Um poema de Carlos Orfeu
rubra árvore
no parque público
acena suas mãos sinuosas
aos navios de brisa
dispersa folhas como ave
na epiderme do ar
plácidas
ásperas
como cadáveres
em tons
de
outono
Carlos Orfeu
sexta-feira, 9 de maio de 2025
quinta-feira, 8 de maio de 2025
aquele que nada faz
magro forte
o asceta
na beira
do Ganges
contorce-se
é uma seta
silente
que aponta
um norte
sabe a sorte
abjeta e rasteira
que os homens
ignoram
é uma seta
silente
maior
que a morte
Lucas Viriato
quarta-feira, 7 de maio de 2025
Na Faixa de Gaza
Na Faixa de Gaza
o eterno estopim do ódio se acende,
Entre israelenses e palestinos!
Na Faixa de Gaza
não há tréguas, ninguém se rende,
ante o brilho dos mísseis assassinos!
J.S. Ferreira
terça-feira, 6 de maio de 2025
simples
Nuvens cheias
de chuva boa,
céu negro de canções.
Vento que gira
o mundo
no sopro do desejo
de estar junto.
Colo fértil
de futuro.
Horizonte
nos braços do amor.
Jade Prata
segunda-feira, 5 de maio de 2025
Passagem
O braço pranteava o que não era papável.
A boca molhada beijava o desejo.
No rumo de casa José colheu a rosa no asfalto.
Imediatamente rosto em lágrimas
braço trôpego alcançou
seu desejo insaciadamente beijado.
Lucas Guimaraens
domingo, 4 de maio de 2025
Manhã de tijolos
do quarto escuto
abafada pelos cobertores
a sirene
rodopia
tua voz
vermelha
rouba-me as maçãs
do rosto.
Lorena Martins
sábado, 3 de maio de 2025
Arco-íris
O Cavalo não é olavac
O Pássaro não é orassáp
E
O Menino não é oninem
Mas o menino é um olavac
E quando vira cavalo
V
ira arassáp
Wilmar Silva
sexta-feira, 2 de maio de 2025
quinta-feira, 1 de maio de 2025
Vitrais
Não ser útero do inútil
E o sacrifício
Fechar-me no templo
A tempo de restar senão muralhas
Cobrir-me de peles e véus
Acender minha luz
E refletir na reflexão do pensamento lúcido
Minha cor no cosmos
Rosália Milsztajn
quarta-feira, 30 de abril de 2025
Jenipapo
Nada de ressentimentos. Senti minha cabeça girar e logo respondi: vamos! Escolhemos ir à praia das Flores. Enquanto estendia minha canga na sombra, Paulo corria para o mar. O vento estava agradável. Deitei e, olhando as folhas verdes da amendoeira, meus olhos começaram a fechar. Aos poucos fui lembrando do que tinha acontecido na noite anterior.
Estávamos felizes pelo festival de forró. Animados, paramos na primeira barraca. Eu sempre pedia o mesmo; licor de jenipapo!
Mais um copo de licor, dois, três...
— Banana com coco queimado!- Percebi que Paulo teve a intenção de perguntar: coco queimado? Mas desistiu.
— Betina, você é linda. - Agradeci com um sorriso.
Vamos! Mais um licor. Lá vem! Era o trio de forró. Seguimos felizes como se estivéssemos no carnaval. Paulo era tímido e não sabia dançar, mas bastava beber que a timidez ia embora. O trio parou na praça— Agora sim! Vem dançar Betina.— Apesar de estarmos bêbados, eu conseguia perceber as pessoas apontando em nossa direção e rindo.
Despertei às gargalhadas só em lembrar da cena. Olhei para o mar e lá estava Paulo me chamando para ir para a água. Mas tudo o que eu conseguia era rir ainda mais. De cansada voltei a deitar na tentativa de lembrar do fato principal, mas tudo o que vinha em minha memória eram “flashes". Depois de algumas horas dançando fomos até o bar do coqueiro, local em que todos vão depois que acaba a festa.
— Betina?
Indira Kupfer
terça-feira, 29 de abril de 2025
Um poema de Nadiá Paulo Ferreira
No teu aparecer antecipado
vieste príncipe imaculado
Cadáver apodrecido vivo
tornas-te sonho ruivo
dos meus gemidos fátuos
Corpo sem face
és puro regresso
dos meus pontos cegos
Nadiá Paulo Ferreira
segunda-feira, 28 de abril de 2025
A costura da passagem, texto inédito de Melina Galete
Melina Galete
domingo, 27 de abril de 2025
Palavras sublinhadas
sábado, 26 de abril de 2025
Pornorganicotube
filme pornô bom de se ver
era a árvore junto com o oxigênio
a natureza a se lamber.
Matheus José Mineiro
sexta-feira, 25 de abril de 2025
Um poema de Gyzelle Góes
Gyzelle Góes
quinta-feira, 24 de abril de 2025
Rosa desfigurada
Beatriz Bastos
quarta-feira, 23 de abril de 2025
O caçador, o encantador e o colecionador
terça-feira, 22 de abril de 2025
VALA DE INDIGENTE
Giovanna Ramundo
segunda-feira, 21 de abril de 2025
Em fim
Cremado o amor inconsútil, ela jogou as
cinzas da Ponte J.K Voaram sobre o
lago com o vento seco de Brasília. À
tardinha, assentaram não se sabe onde.
O que é leve em algum lugar pousa.
O que pousa em algum momento pesa.
Noélia Ribeiro
domingo, 20 de abril de 2025
+ um dia -
Terei o hábito de conversar com putas
Bruno Nöthlich
sábado, 19 de abril de 2025
Problema geográfico
Gabriel Silveira
sexta-feira, 18 de abril de 2025
Gramática
Luiza Mussnich
quinta-feira, 17 de abril de 2025
Coração fogoso
Mery Onírica
quarta-feira, 16 de abril de 2025
Memorial ao morto imaginário
Diego Mendes Sousa
terça-feira, 15 de abril de 2025
, a palavra que eu reúno em pequenas embarcações ,
Valéria Grassi
(Este é um trecho do livro Intermitências apenas, publicado pela editora Cambucá, e segue a diagramação proposta pela autora)
segunda-feira, 14 de abril de 2025
Mate, texto de Raquel Naveira
Raquel Naveira
domingo, 13 de abril de 2025
(i) lógica
a teleologia
hesitantemente
epistemologizando.
o relativismo
peremptoriamente
hermeneuticando.
Bianka de Andrade
sábado, 12 de abril de 2025
As bonecas só falam "mamãe", de Eduardo Moraes
Depois de uma hora e quinze no busão, Danilo chegou em casa da escola. Largou a mochila em cima da mesa — o terror de Perla: “trazendo sujeira da rua para a mesa em que a gente come, meu filho” — e foi para o quarto depois de mais um simulado para o ENEM. Ele tinha ido muito mal e sabia que seria salvo apenas pela redação e pela química. A primeira, pelo tanto que gostava de ler e escrever, a segunda, por tudo que aprendeu com a mãe, que tinha estudado só para ensinar a ele.
A pressa era tanta que nem reparou que no sofá, Perla estava prostrada, imóvel, mirando a televisão desligada.
Danilo percebeu que, ainda nos tempos atuais, seguia muito fácil ser pai.
Pela primeira vez, aos 16 anos de idade, pensou no quanto dá trabalho pensar no cotidiano de uma criança, desde o momento em que acorda até quando vai dormir. E também perguntar o que chateia, buscar na escola, levar ao médico, dar carinho e tudo mais que envolve o dia a dia de uma criança. E que isso parecia ser um extra aos pais, e não a obrigação que era às mães.
Acabou seu dia tentando acreditar que ainda podia ser amado. Tentando não pensar que a culpa era dele. E recuperar a confiança. E colocar na cabeça que não deveria ficar tentando recuperar a atenção e o amor do pai. Já que o amor nunca existiu do lado de lá.
Antes de pegar no sono, sem chorar um minuto sequer, cravou uma profecia a si mesmo: se um dia concretizasse o sonho de ter um filho, não seria pai.
Danilo queria ser mãe.
Eduardo Moraes
sexta-feira, 11 de abril de 2025
O amargo do homem no bordel da colméia
ferrões são letais
mas abelhas sensuais
fazem pólen dance
Matheus José Mineiro
quinta-feira, 10 de abril de 2025
Paragens
Jurema Rangel
quarta-feira, 9 de abril de 2025
Armandinho
Teresa Garbayo
terça-feira, 8 de abril de 2025
Oração a dois Senhores
Ave Senhor de todos os senhores,
Guilherme Ottoni
segunda-feira, 7 de abril de 2025
DIA-DE-SEMANA
Salto do trem.
Estação Glória.
Agarro a bolsa com a mão direita.
Com mais força, a esquerda segura o livro.
Rua do Russel, coração mil beats:
podem me assaltar tudo
menos a literatura.
Laura Liuzzi
domingo, 6 de abril de 2025
Técnica singular para inflar balões
Perce Polegatto
sábado, 5 de abril de 2025
Clivagem
Canto pra renascer
na pedra
com a semente que o mar
roubou dos náufragos; canto
para repartir com a brisa
a lúdica sesmaria da palavra.
Um atlas abriu seus galhos
para acolher meus reinos:
uma geometria de farrapos;
um tigre com o sol entre as patas.
E sigo esse rio de letras
como se chão em chamas:
a poesia me despiu
para explodir com astros.
Salgado Maranhão
sexta-feira, 4 de abril de 2025
Pressão e neblina
Ẹgrium Tạdrel
quinta-feira, 3 de abril de 2025
EU SÓ FARIA LAVA-PÉS EM PÉS DE GALINHA
negue meu nome três vezes
Ágatha Kreisler
quarta-feira, 2 de abril de 2025
Um poema de Paulo D'Auria
terça-feira, 1 de abril de 2025
1° de abril
Não sei de ontem,
ainda não tinha nascido.
Nasço todo dia de hoje,
mas ontem rebrota na memória,
pequeno cacto sobre escombros.
Querem tirar o cacto,
fantasiá-lo e dizer que é margarida.
— Não! O cacto é real,
e está aqui,
memória viva que fere hoje:
— golpe!
Jade Prata
Vers de Circonstance
I. imunidade de rebanho
A estupidez é sua própria recompensa.
Graças a ela, o mundo faz sentido,
um só, que é fácil de identificar.
E só o fácil satisfaz a quem não pensa.
Pensar é coisa trabalhosa. A ignorância
é o sumo bem dos cidadãos de bem,
é a verdadeira marca dos eleitos.
Ter sucesso é não ter que saber. Saber cansa,
e o objetivo central de qualquer existência
só pode ser não se cansar. Olhai
as vacas do campo: não lhes faz falta a ciência,
pastam em plena bem-aventurança,
sem que nenhuma antevisão do matadouro
perturbe a santa paz da ruminança.
II. Zeitgeist
Se te falta competência
pra amar, mas queres na vida
o condimento da paixão,
resta uma saída.
Pra quem nos duros embates
do amor jamais subiu ao pódio,
há um prémio de consolação
bem fácil: o ódio.
O ódio dispensa a razão
e seus meandros sutilíssimos,
a lógica, a estética, a ética;
só requer o fígado.
O ódio leva a emoção
a seu mais extremo ápice
sem amante e sem amigo:
basta-lhe um cúmplice.
Abraça com força teu ódio,
faz dele um belo romance.
Eis uma vera paixão
a teu alcance.
Paulo Henriques Britto
segunda-feira, 31 de março de 2025
Divórcio
a bandeja que serve o café
e serve a cerveja
só não serve para consertar
o que não tem conserto
nem com fé, nem com jeito
nem com pé, nem com peito
Mariana Teixeira
domingo, 30 de março de 2025
Re-criação
Des-construir a forma
des-membrar
des-estruturar o verbo
des-ordenar a estrutura
des-mitificar
ir além do provável
e — assim — instituído o caos
re-modelar
o imponderável
Ianê Mello
sábado, 29 de março de 2025
Rosalina In Flor
Tem uma rosa a desabrochar
Pelas bandas de cá!
Tem espinhos,
É viçosa
Mora em Jacarepaguá.
Pinta livre,
Fala em prosa,
Gosta de perfumar
Esta Rosa lina é linda
Não a queiram arrancar.
Vai perfumar a história
Com toda a sua memória
Que sementei no lugar.
Lá na terra fértil da cidade de Deus
tem a sua plantação,
há de ter roseiral, cheiro de esperança
nas mãos de nossas crianças
Para enfeitar a nação
Valéria Barbosa
sexta-feira, 28 de março de 2025
Um poema de Bruna Escaleira
neste mundo machofágico
toda mulher é sobrevivente
Bruna Escaleira
quinta-feira, 27 de março de 2025
Sem nome
Deu vontade de chorar...
Mas não vou, não posso...
Tenho que me libertar de mim.
Tudo está na minha cabeça,
passo a crer que não existe sentimento algum em meu coração.
É simplesmente minha mente funcionando a mil por hora...
A saudade, a falta, a tristeza,
essa necessidade imensa...
Tudo eu criei...
São frutos da imaginação.
Será que devo ficar melhor e feliz agora!?
A vontade de chorar ainda não passou...
Ainda não passou...
Fernanda Otoni
quarta-feira, 26 de março de 2025
abre-mundo
abre o futuro
o passado pretérito
abre língua, abre fome
abre túmulo, abre e soca
quando, de um pro outro
— muda cena —
troca o eu-lírico
Anelise Freitas
terça-feira, 25 de março de 2025
Ciclos, um poema de Thais Vicente
Como a folha que cai da árvore
e se decompõe, desmanchando-se
para que, no lugar, outra cresça,
continuamente, até que a árvore morra,
assim somos nós: frágeis e passageiros,
vivendo para cumprir o ciclo da vida,
até que todas as árvores morram,
o planeta morra e a vida se extinga
completamente
pra algum Deus ou explosão poder criar de novo.
Thais Vicente
segunda-feira, 24 de março de 2025
domingo, 23 de março de 2025
água-forte
singrando fantasia qualquer
freme um risco
olho azul
dardo ofegante rapto
de um lance
pego acaso
quanto mais faz-de-conta
vigília de bolas de gude
miramar miramar
lufada de cor
irrompe
— prova o Cais
Naila Rachid
sábado, 22 de março de 2025
Um poema de Numa Ciro
passarei a tarde toda
descascando cebolas
só pra chorar sem motivo
Numa Ciro
sexta-feira, 21 de março de 2025
Carrossel
de manhã na
praia eles combinam
o que farão à noite de
noite, na festa eles
combinam de ir à
praia amanhã
Ana Salek
quinta-feira, 20 de março de 2025
Um poema de Natasha Felix
logo farei 22 anos.
me recuso a ir embora antes.
até lá enterrarei um filho. isso não será triste.
não vou embora sem cruzar a fronteira
enterrar esse filho
profundamente
não ser triste.
Natasha Felix
quarta-feira, 19 de março de 2025
Rosa Luxemburgo
passei a maior vergonha
no dia que tu viesse me buscar
usando uma camiseta
rosa-choque
tu só usa preto
e eu sempre reclamo
digo "aff Lukas que tédio"
e eu adoro rosa-choque
a cor o nome
não sei o que deu em mim
certeza que não foi inveja
foi outra coisa mais feia
olhei pra tu e disse
"oxe que cor é essa menino?
e tu
oito anos mais novo
millennial
anos luz à frente
dissesse
"qual o problema? só quem pode usar rosa é tu?"
e eu não soube responder
porque de fato
não há problema
algum
cores são uma invenção
e não têm dono
"pertencem à vida"
(não fui eu quem disse, foi goethe)
Adelaide Ivánova
terça-feira, 18 de março de 2025
Querida
Queria ser homem político
Sujeito herói bom lutador.
Queria ser poeta maldito
Profundo gênio sofredor.
Pronto me Safo do burro querer
És filha da terra e mãe hás de ser
Toda poesia que te queira nascer.
Marina Laurentiis
segunda-feira, 17 de março de 2025
Teima, de Ana Elisa Ribeiro
domingo, 16 de março de 2025
Ungida
Vem,
Unge-me com santos óleos:
O corpo,
Os cabelo,
A pele,
O plexo solar.
Vem,
Unge-me
Com óleo bento:
A mente,
O espírito
Sedento
De azeite quente.
Vem,
Unge-me,
De cada poro
Transpiro
Gotas de luz,
Toda pura
E poderosa.
Raquel Naveira
sábado, 15 de março de 2025
Para a mão que escreve
A pele soltando da mão
Parece um paço de dança
Parece doença
(embaixo da atadura
há vermes silenciosos
muito empenhados no seu trabalho,
seriíssimos decompositores)
Se for contagioso a esquerda
Escreve estrahno um pequeno desvio,
não se preocupe:
Fim de festa é sempre assim
Freezer vazio
E alguns corpos podres espalhados pela casa
Ana B.
sexta-feira, 14 de março de 2025
O assassinato de Marielle Franco
como apaga um corpo depois
de correr nele um vinho de tanta
fruta gorda e suculenta
você segura nas mãos da vida
e nela há respiração timbre
a pisada de um búfalo
o fôlego vindo das raízes
o vento que bate na areia da pele,
você vê os pelos eriçados
você inclusive se arrepia
e de repente um outro sopro
morde
onde tudo sangra
como que pode
morrer às vezes
ser tão lento
como apaga um corpo depois
depois de a pele que temos
ser tão consoladora
fica um pouco mais
poderia ter dito
mas o vinho por dentro ardia
e mesmo que o corpo ficasse
o elo de ser um animal
já tinha se desfeito
o visgo inteiro vazado
a ponto de nunca mais
poder ser recolhido
como que pode
um corpo inteiro
quebrado
a gente estendendo a mão
que fica mais no vazio
a gente também um corpo
esperando seu quebrado
como pode um corpo inteiro
sumir
mesmo desmembrado
sempre pode ou deve
o desencanto ser admitido
morrer como adormecer
entre as ruínas
as bombas
perder
sopro sangue ar
barco e mãos
atracados mas
pendentes
nos filamentos do espaço
a mão última que acena
sabe porque dói
o impossível
não pode mais.
Tatiana Pequeno
quinta-feira, 13 de março de 2025
Teima, de Laura Assis
Correr ao contrário
o caminho mais claro.
Ciência da escolha
em oposta direção.
Desacreditar a equação
precisa das respostas.
Insistir em tudo
que não tenha
o peso da realidade.
Laura Assis
quarta-feira, 12 de março de 2025
Escuro, de Marilia Kubota
o olhar ficou frio e duro
o mar sem movimento
ondas rápidas, gaivotas sujas.
o tigre ruge
no lençol azul-marinho.
nuvens de fuligem
sobre o pergaminho enrugado:
é inverno no atlântico
a vida tomba diante
do punho fechado.
Marilia Kubota
terça-feira, 11 de março de 2025
Quadrado Vermelho
de banhar também insiste
escorrer a mão ao sexo
cegar o pássaro pela metáfora molhada
você sabe bem
apanhar um número caído
estourar a bolha sociopata:
hoje eu menstruei em desesperos homeopáticos
Carla Diacov
segunda-feira, 10 de março de 2025
Espelho
Indira Kupfer
domingo, 9 de março de 2025
Jogo de prefixos
Quero
unir
o inútil
ao agradável.
Os que
desejam
o útil
fiquem
também
com
o desagradável.
Bianka de Andrade
sábado, 8 de março de 2025
Mulher
Jade Prata
sexta-feira, 7 de março de 2025
Poema Imemorável, inédito de Noélia Ribeiro
Noélia Ribeiro
quinta-feira, 6 de março de 2025
Um poema de Nadiá Paulo Ferreira
Quando me abraças
quarta-feira, 5 de março de 2025
PUTA DA BABILÔNIA
sou apenas como são os passarinhos:
não tenho entendimento do silêncio
mas
sou como são todas as mulheres
também:
mais fera que gente
ainda que por filosofia,
maldição ou benção
Fera de colo
querer de besta:
amar, matar e deitar, depois
beber água
cuidar das plantas
acompanhar uma vela inteira queimar
pensar eventualmente na morte
porque
se o apocalipse se deu
pela Puta da Babilônia
chama-me Babilônia
chame-me Puta
Ágatha Kreisler
terça-feira, 4 de março de 2025
segunda-feira, 3 de março de 2025
Eva, de Laura Liuzzi
Eva também é ave
palavra voo
desde cima
o cimo da pedra:
tártaro
dentista do limo
escalavra
a pedra da palavra pedra.
Laura Liuzzi
domingo, 2 de março de 2025
Dama da noite, de Marilena Moraes
Naquela noite, não houve aula no curso supletivo. Os alunos comentavam, atônitos, a manchete do jornal popular que passava de mão em mão.
"Exorcismo na boate" — "Professora de dia, stripper à noite, Bernadete dos Santos, 30 anos, também conhecida como Lucimar, foi assassinada por seu aluno, José Tenreiro, inconformado ao descobrir a segunda identidade da professora do curso supletivo que frequentava. Apresentando sinais de desequilíbrio mental, Tenreiro foi preso em flagrante, tendo ainda nas mãos o punhal de prata que cravou entre os seios da bailarina/professora em meio ao show da boate Clamores."
Ar de beata, rosto lavado, poucas palavras, tinha nome de santa e cheiro de talco. Dava aulas no supletivo, num bairro de gente simples. Com os alunos, o relacionamento era apenas cordial.
Ninguém poderia imaginar que a professora pacata, de roupas discretas, saía dali direto para Copacabana, onde, às três da manhã, estrelava o show da boate Clamores.
"Sex alive" — anunciava o neon. Maquiagem pesada, óleo no corpo, Lucimar se roçava no parceiro, sem sequer olhar para o seu rosto e sem encarar a plateia de homens agitados, que gritavam palavras que ela fingia não ouvir. Uma amiga a levara para a Clamores, convencendo-a de que podia fazer bom uso do belo corpo. Se o dinheiro das aulas era pouco, as notas verdes dos turistas ajudavam bastante no orçamento.
Religião? Nunca tivera. Pudor? Há horas em que a necessidade fala mais alto. Ao fim de alguns meses, o prazer de estar no palco, nua e exposta, passou a ser a razão mais forte de sair toda noite do Méier direto para a Princesa Isabel.
Não poderia, no entanto, imaginar um aluno na plateia. Tenreiro voltou na noite seguinte e em outras tantas noites. Reconhecera a professora na mulher de roupa colante e meia arrastão que saía da boate quase de manhã, pendurada nos sete centímetros de salto, abraçada a um gringo qualquer.
Noite
saí tropeçando
fuligens.
rastro de pólvora
cola, descola
medo da sua língua
na minha — segurei.
a mão
quente
medrosas gotículas brotaram
do útero.
essa flor
é
para você.
Letícia Simões
sábado, 1 de março de 2025
Mês da mulher no Plástico Bolha
sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025
Clypeasteroida
Sob o rumor das ondas
irisadas pelo vento
uma bolacha-do-mar
oferece em seu centro
a solidão quase nua
despida pelo tempo.
Alexandre Bruno Tinelli
quinta-feira, 27 de fevereiro de 2025
quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025
terça-feira, 25 de fevereiro de 2025
Quando chove
Em São Paulo, quando
chove,
chovem carros.
Tudo para:
pontes, viadutos, Marginais.
E a água retoma
seu curso original:
Anhangabaú, Sumaré, Pacaembu.
Ruas onde eram rios,
ex-rios, caminhos de rato, canais.
Rios sobre ruas,
Elevado, Via Dutra, Radial.
Em São Paulo, quando
chove,
chovem apocalipses
de quintal.
Frederico Barbosa
segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025
Toda escola devia ser samba, a canção
Toda escola devia ser de samba
Toda escola devia ser assim
de cantar
de trazer você pra mim
Toda escola devia ter essa ginga
trazer essa parte
que é mais vida
que é arte
Toda escola devia ser criança
ensinando adulto
Toda escola devia ser silêncio
sussurrando música
Toda escola devia ser noite
tramando dia
Toda escola devia ser samba
toda semana devia ser seu
carnaval
Paulo D'Auria
domingo, 23 de fevereiro de 2025
Goela
Ágatha Kreisler
sábado, 22 de fevereiro de 2025
A tempestade
Canibal, palavra latina,
à maneira de canis, animal
de fidelidade canina.
Nas Bermudas, sublime ironia,
será um vento cão e vai se chamar hurracán.
E quando o mar de lã
de repente apontar terra à vista
Então será Caliban.
Rodrigo Garcia Lopes
sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025
Hanishira e a moto amarela sobre a mesa do imperador
Hanishira ouviu o ronco do motor e isso fez com que ela saltasse da cama, de um só pulo e se pusesse em frente ao espelho do banheiro. Jogou, com as duas mãos, água gelada no rosto para ativar-se.
Era ele, tinha certeza, acabara de dobrar a primeira ladeira, virara a esquina lá em baixo. Subiu e ela o ouviria mais uma vez quando contornasse a segunda curva. Ele contornou. Estava mais perto. É ele! Sem dúvidas é ele: ele e sua moto amarela. Pensou apertando involuntariamente as pernas. Que sensação gostosa que fazia o motor da possante amarela enquanto pousava nela sua buceta! Só de pensar nisso ficou com muito desejo. O que esse cara havia feito com ela? Que tipo de feitiço era aquele?
Ouviu o motor silenciar em frente à casa. Rapidamente aplicou um blush e um rímel, apenas para ressaltar o olhar e ganhar uma cor. Ele assobiou. Isso é bom, lembrou que a campainha está com defeito. É sinal que pensou em mim, que tá ligado. Hoje, nada daquele papo tântrico, hoje eu parto pra cima dele e com sorte ele será o cara que terei coragem de falar: Vai, come a minha buceta! Abre ela todinha! Pronunciar essas coisas lhe enchia de tesão. Mas raras foram as vezes que ousou pronunciar na hora do ato sexual a palavra buceta. Só na cabeça, pensava, mas sempre usava outra nomenclatura: periquita, pão doce, preciosa, nomes assim. Talvez porque julgasse que uma mulher não deveria gostar de buceta, que pega mal. Que esse é um direito apenas dos homens. Mas ela adorava essa palavra, ficava louca. Mas até então só conseguia pensar nunca falava.
— Tô acordada. Tava lendo na cama.
— Tem hoje tempo pra praticar?
Tomou Hanishira nos baços e a beijou. Quando esses lábios se desgrudaram ela pôde sentir, o gosto do abacaxi com hortelã e o celular de João vibrar no bolso. Ele desligou automaticamente o que fez com que ela se sentisse muito importante.
— Eu devo me trocar.
Ela adoraria ter coragem de montar na moto daquele jeito, mas não era assim tão descolada. Correu até o quarto e teve vontade de colocar o guarda roupa abaixo. Uma saia e uma blusa surgiram como num passe de mágica, meias e a calcinha. De volta à sala. João a tomou pela mão e a conduziu até a moto. Ele sabia a pressão certa ao lhe dar a mão. Na noite do último encontro enquanto dissertava baixinho em seus ouvidos as maravilhas do sexo tântrico. Ele segurava pressionando sua mão de tal maneira que a fazia delirar. E também teve aquele momento dos pés, onde se tocaram, pé com pé. Que só em pensar já fazia Hanishira ficar totalmente molhada. Ao sentar-se na moto, a sensação do motor
De vez em quando ele falava algo para ela gritado para tentar ser ouvido apesar do barulho infernal que produzia a possante como ele mesmo a havia apelidado.
— Se chegar alguém eu arranco a tua roupa toda.
Falava baixo, mas desejando falar para fora, enquanto se mantinha de bunda para cima abriu os olhos e deu de cara com os olhos de João. Ele estava agachado olhando para ela, o mundo de cabeça para baixo, ela o via e sentia a sua mão. Ele colocou na própria boca uma folha de louro que tirou do bolso e levou uma outra a boca de Hanishira.
Ela percebeu que ali, ele dava um salto a mais em suas etapas da conquista. O que ele poderia querer mais? Já estava semi nua, entregue. É por isso então, ele quer magia! E teve as mãos dele dentro dela. Enquanto mastigou o louro amargo.
Ela não teve tempo de falar nada, Ele tapou lhe a boca e ela gostou. E pedia para ela manter os olhos abertos e ela fazia esse esforço. E se esforçou tão bem que suas pálpebras pouco se mexiam, estavam fixadas nos olhos negros de João, que agora tinha olhos e pau. Para ela, ele tinha apenas olhos e pau. Ela deitada na pedra, ele segurou suas pernas no ar e com jeitinho nem muito delicado, nem muito bruto, certeiro, meteu seu pau que entrou deslizando, encaixando em cada curva por dentro dela. Momento já sonhado por Hanishira.
Ela então não conseguindo mais conter falou em boa altura: Mete na minha buceta! E ter dado esse grito à fez jorrar para fora, como se ele despertasse nela sua verdadeira vocação.
— Tô metendo!
Ele arrancou a moto ladeira abaixo. De vez em quando entre uma curva e outra ele dava gritos.
Na Jardim Botânico engarrafada, ela continuava seu ritual de roçar os peitos nas costas de seu condutor. Os dois riam de prazer.
Depois desta trepada nunca mais voltaram a praticar nenhuma das doze lições de sexo tântrico, mas enquanto juntos, mantiveram o habito de se devorarem em lugares públicos.
Luciana Bezerra