sábado, 17 de abril de 2010

retrato n.2

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minhas raízes são remotas,

desvanecidas, elas remontam

assassinatos diários entre famílias

que se comunicavam aos gritos

em dialetos mortos, sob lava,

com machadinhas sem fio,

que faziam sua modesta lei

partindo ossos sem valor.

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talvez daí venha a atração

por ruelas com mal cheiro

onde a qualquer momento

há possibilidade de morte.

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daí talvez as letras firmes,

sem forma muito definida,

que denotam transtornos

psicológicos preliminares.

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ademais, a testa proeminente,

ossos que, restantes, estalam

encaixotados em carne dura

.

e dizem qualquer coisa do sangue

volátil, que sobe rápido às idéias,

passos curtos na direção duvidosa,

passos curtos, de pernas amarradas

que apenas apontam trilhas, pedras,

que fundam feridas abstratas, leis.

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a saúde dos olhos indica apenas

lascas de tempo sobre chão frio.

da incomunicabilidade selvagem

arregalada em suores trêmulos,

fiz a sala onde vivo dos restos.

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as uvas do prazer, invariavelmente

elas terminam em restos gástricos.

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fui revelado no atropelamento

de anotações absurdas, pautadas

livremente pelo ritmo das ruas.

há que se endurecer ainda mais

após a revolução sem ternura,

ser o balaio mediterrâneo feito

do calor córsego, que escorre

pela incompreensão enojada

.

do mistério que avança frente à face

e enche os livros de tédio e filosofia

enquanto, em quartos acarpetados de

paredes lisas, cadeiras de assento duro

premeditam a ambivalência teimosa.

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os pés já não tocam mais o chão.

de partir, não suportam mais dançar

um sapateado divertido em brasa,

do agrado dos calvos de braguilhas

abertas, dos senhores recomendados,

enfileirados nas prateleiras públicas.

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uma vez o Fred Astaire, hoje a ponte

desfeita a cada passo diante do nada.

como nos filmes ruins de aventura,

sem ter permissão para olhar atrás,

enquanto moedas brotam dos esgotos

da moral cívica – uma vez o maníaco

agarrado em alto-mar a gelados remos.

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vejo que perdi coisas, isso é notável.

mas me faltam as marcas da escolha

conflitante – ainda acredito em deus.

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não alimento escrúpulos,

sou um homem correto.

não exatamente um dândi,

operário com unhas limpas.

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muito difícil é prever a amputação,

falar sem voz pela geração festiva

quando os pés se agitam em doença.

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uma vez a superfície da lua, hoje a porta

escancarada – nenhum pedido de retorno.

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o fracasso é o hábito,

disse aquele homem

que morreu de amor.

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Leonardo Marona

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Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei desse. O desfecho foi foda!

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Felipe Ribeiro