quarta-feira, 5 de junho de 2013

A Fisioterapeuta


Seus ombros, um pouco finos e um tanto quanto largos para sua estatura baixa, pareciam carregar um daqueles antigos vestidos usados nos anos sessenta, muitas vezes confundidos com os clássicos uniformes de empregada, branco e preto, justamente por serem amplos nos ombros e nas ancas de suas portadoras, mas que, afinando delicadamente a cintura, dava um ar de sensualidade, como a mulher violão do poetinha; não clássica e divina como um Stradivarius, nem pesado e grave como um violoncelo, mas sublime e poética como um violão.

Seus olhos, embora castanhos, possuíam um brilho de um diamante negro recém forjado que condenavam muito mais do que os próprios olhos, chamados por muitos de janelas da alma, poderiam, ou deveriam, demonstrar naturalmente. Condenavam, por trás de toda a segurança de uma mulher no cimo de sua maturidade, uma fragilidade infantil que suplicava, através do forte brilho, como uma criança recém nascida que só tem o seu choro para exigir o quinhão de leite, por um socorro, um abrigo, ao menos um colo onde pudesse repousar sua angústia. Como o brilho encarregara-se de exibir suas aflições, seus olhos, em segundo plano, ficaram responsáveis de demonstrar, através de sua bela e singela silhueta, não só a força de uma mulher sonhadora, movida pelo mais puro sentimento cristão, mas também a imagem de uma mulher sentimentalmente firme. E para provar esta firmeza, aliava-se a eles um lindo e inerte sorriso. Inerte, não por uma falsa simpatia geralmente vista nas atrizes diante das câmeras jornalísticas, mas por uma serena chama de esperança que nunca lhe faltara oxigênio.

Sua voz, nem grave e nem aguda, mas branda, como se servisse de base a uma grande orquestra de Mozart, fazia-me entrar numa espécie de encantamento do qual nasciam os sons dos demais instrumentos, e assim, fazendo completa a orquestra. Rica em parciais harmônicas, sua voz se tornou uma peça principal em minha orquestra vital, pois eu obedecia ao menor sopro dado por ela, copiando os demais instrumentos de um concerto que se afinam ao comando de um oboé.

E foi exatamente assim, naquela pequena sala de espera do terceiro andar do instituto Geni Faria, que eu me senti completamente enaltecido ao conhecer a bela fisioterapeuta que me atendera, logo após ser chamado a sua sala de atendimento. O dia agitava as cortinas, e entre as arestas formadas pelas suas longas camadas, o sol tentava, com seus raios de luz, admirar toda a beleza daquela mulher. O atendimento foi rápido e prático, como toda a primeira consulta de avaliação de um paciente. Quando sai de lá, senti um grande prazer por tê-la conhecido, misturado com uma imensa dor, causada pelo medo de que o destino, por algum acaso infortunado, impedisse-me de vê-la novamente.


Voltei à rotina de meus dias insossos, mas não mais vagos, pois quando lembro-me de tudo, principalmente dela, este antigo vazio é preenchido com a sublime suíte número três em ré menor de Bach, que começou a tocar desde o primeiro momento que a vi, naquele hospital e que, ironicamente, parece ter “concertado” a minha máquina de sonhos...

Augusto Procópio