"Um
dia um sujeito disse:
"Cidadão
é aquele que fala e
mulher
não pode ter opinião!
Conhecimento
não é necessidade,
é
desejo." "
Não
podes opinar!
Não
podes conhecer...
Não
saberás desejar plenamente!
Cortar-te-ei
teu mais forte desejo!
Desejas,
acaso, conhecer corpos celestes?
Pensas
conhecer para tocar as estrelas?
Toques
apenas teu corpo e te limites a isto!
Um dia
tu envelhecerás e, com teu corpo,
um
desejo inexistente!
Nada
verás, mutilarei teus olhos!
Nada
verás que eu já não tenha visto!
Não
ouses opinar!
Não
ouses conhecer nada fora de teu corpo!
Mutilarei
teu corpo, teu prazer, tua mente!
Mutilarei
teus pés com meus próprios dentes.
Que teus
pés delicados
desconheçam
teu chão!
Porque
em nada opinas,
nem tens
instrução!
Mas, que
teimosa és tu!
Já te
pisei os sonhos
estendidos
em meu tapete!
Tapas
levaste da vida.
Vida que
já perdeste!
O que
ainda queres, mulher?
Que
ousas, ainda dizer?
Tens
direito a um último desejo
antes de
morrer!
Quero
tocar as estrelas, o firmamento!
Quero as
chuvas, as cinzas e o vento.
Quero o
chão, quero cimento!
Quero
conhecer.
Conhecimento!
Quero o
desejo que não morre com o tempo.
Conhecer
aquilo que não só o meu corpo.
Porque
sou mulher (e não um lamento).
Porque
sou mais que ventre e mais que rebento!
Porque
sou eu mesma o meu próprio fomento!
Conhecimento
é desejo!
Não me
roubes meu momento!
Não
quero tocar só o meu corpo!
Quero o
meu pensamento!
Os meus
olhos e a minha mente.
O desejo
que é permanente!
(o meu
desejo mais ardente)
E para
eu cantar meu canto,
não
preciso criar evento.
Não
preciso colocar manto.
Não
preciso estar ao relento.
Quero
adubar meu solo,
com meu
próprio excremento.
Ser
minha arte a palavra escrita.
E sem
ressentimento.
Cantar
porque desejo.
Não
quero falecimento.
E,
agora, dê-me licença,
que
estás no meu assento.
Quero só
ser!
Ser só.
Eu.
O meu
instrumento.
Raquel
Scarpelli
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