“Não mais
haverá a humanidade: Apenas a guerra e o poder e a
vitória.”
William
Blake De Jerusalém, capítulo 1
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Ninguém deu
muita bola quando a cidade e as redes sociais amanheceram cobertas por
propaganda. Um slogan rondava o dia: Ele chegará!
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Foi mais ou
menos meio dia que ele chegou. Era um monstro, ou uma besta? Não era humano,
não era máquina, mas uma foda entre os dois, talvez.
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Primeiramente
a besta profeta falou nas redes sociais. Vaticinou anos de servidão e vergonha
para a raça humana.
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Os
acadêmicos e cientistas eminentes ficaram felizes em poder publicar obras e
artigos sobre a besta profeta que ninguém leu. Já os jornalistas davam em
primeira mão as façanhas da besta profeta. No fundo ninguém levava muito a
sério a sua profecia. Tudo parecia um show transmitido ao vivo. Todos riam e
tiravam selfies com a besta profeta.
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Os
historiadores se apressaram a falar que não apenas um capítulo da história
estava acabado, mas a própria história estava morta. Todos vestiram preto no
dia do enterro da história.
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Os
burgueses, militares, políticos, e religiosos não demoraram em reconhecer que o
apetite por apocalipse de sua sociedade seria saciado por um único líder que
reuniria o rebanho disperso e o comeria vivo para o seu lucro. Mas estavam
enganados sobre a besta profeta.
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A besta,
metade homem e metade máquina, não viera trazer uma nova ordem, mas uma
desordem primitiva há muito recalcada. Arrastava consigo uma horda de tolos e
violentos, prontos para seguir suas ordens.
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A besta
profeta fez o roque do seu rei: uma bombardeio midiático feito por robôs atacou
a subjetividade mediana. Depois a besta profeta dominou o meio do tabuleiro:
destruiu a economia local. Em seguida capturou a dama: criou uma crise nas
instituições. E Cercou o Rei: gerou um o caos nos serviços públicos. E por fim
o xeque mate: não havia mais um terreno comum que poderíamos chamar de
sociedade, somente barbárie.
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Os mais
pobres foram oferecidos como sacrifício à besta profeta. Mas a besta tinha fome
e logo devorou a classe média e a elite se fodeu.
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Os joelhos
da humanidade estavam dobrados pela besta profeta. Os fuzilamentos eram
corriqueiros como os lixamentos nas redes sociais. Toda resistência era
ridicularizada ou simplesmente se deixava cooptar, seduzida pela imagem da
besta.
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Quando os
poucos que sobraram se deram conta já estavam mergulhados na escravidão e
vergonha que a besta profetizara. Acorrentados na desordem de suas pequenas
tiranias todos eram servos da besta profeta.
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Após a
grande escravidão a besta profeta partiu. Não se sabe o por quê. Não me
pergunte, eu também não sei.
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Aqueles que
sobreviveram pareciam orgulhosos de sua antiga servidão monumental. Celebravam.
Criaram uma festa anual que marca o tempo, exalta o passado e os relembra de
quando a besta profeta estava entre eles.
Rafael Caetano
Este conto será publicado em breve, ao lado de muitos outros contos do autor Rafael Caetano, no livro "Calendário de Distopias", pela Editora MultiFoco.
Este conto será publicado em breve, ao lado de muitos outros contos do autor Rafael Caetano, no livro "Calendário de Distopias", pela Editora MultiFoco.
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