quarta-feira, 2 de março de 2016

Pessimismo


Dor de dente,
Febre de
Catapora.
Nova escola
De manhã cedo.
E todo dia
E ainda o medo
E dever de casa,
Quando se quer brincar, e brincar.
Mãe a falar:
Come tudo!
Primeira espinha
Empregada de saia na cozinha
Banho longo
Cabelo na mão
Videogame no chão e
N’algum lugar
Uma Capitu a chamar.
Primeira frustração.
A filha-da-puta então...
De mim nem gostava!
Baseado e álcool,
E o perigo das substâncias
No primeiro dia de trote.
Uma morena de rebote,
Que outro talvez não quis
O pinto de capote
A deslizar feliz
E quando acaba
Logo o primeiro romance
“Dane-se; era uma meretriz”.
E sem grana no bolso
Ou álcool na garganta,
Toma o ônibus pro trabalho
E arruma alguns trocados.
Faculdade e meio-expediente
Falta de garota e todos os ingredientes,
Faz as malas e sai de casa
E vai pros bares bater asas,
Qual gaivota suja de petróleo.
Tranca matrícula e se perde
Um ano nos albergues
De novo as substâncias
E xoxotas que enchota
Logo no dia seguinte.
Sem dinheiro, mulher, ou futuro,
De casa bate à porta
E, os pais, cristãos que são,
Lembram Mateus 15.
Enfim a formatura
E um emprego numa fábrica
De gazes e ataduras.
Ótimo contador
Futuro promissor.
E aparece uma estagiária
Falante e de beleza
Muito pouco ordinária.
Um namoro e um noivado
E logo tudo se tem por arrumado.
A moça engravida
Então nova vida!
E dor de dente
E febre
De catapora
E espinha
Empregada na cozinha
E as substâncias e...
Um desastre de automóvel.
Um filho morto nos braços
Sepultamento e os números
Agora são todos baços.
A mulher não aguenta
E na loucura se afugenta.
(Os avós a chorar)
E mais trabalho
Pro tratamento pagar.
Depois ela melhora
E quando enfim chega
Essa aurora,
Súbito uma pergunta:
“Isso é tudo?”
Sim.
Isso é tudo
E isso não é tudo;
Pois isso dói

Afrânio Santiago

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