Sou um caracol lunático
A espera desse sol que queima
Sou a vítima
Ou a bala que mata deixando no ar a pólvora
Meu quarto meu refúgio
Lugar em que me distancio de um cotidiano enjoado
E há gente enjoada me procurando
Sou um caracol que se esconde
Desse caminhar desenfreado de homens que procuram queimar
A energia
Sou eu a energia a povoar as quatro paredes que me prendem
Sozinho estou feito um caracol que anda sonâmbulo
Numa folha de verdura molhada de água de chuva
Sozinho
A sós
Sem compreensão e sem sorriso
Sempre na espreita do que pode acontecer...
Faço das coisas brinquedos
Meu membro ereto é um brinquedo que dilata
Dilata porque o sangue corre nas veias
Esse sangue de excitação e orgia
Desfaço em lágrimas
Meu corpo magro vai minando água urina e secreções
Daí a pouco serei uma poça indesejada
Como é difícil olhar para cima e não sentir vertigens
Como é difícil matar alguém e não deixar vestígios
Não carrego velas nem mastros
Afogarei num mar de descrenças e aceitações obrigadas
Quem me dera engolir-me
Evacuar-me
Evacuado não mais seria eu um caracol sonâmbulo a andar
Em meio a um jardim que desconheço
Evacuar-me perante os outros
Evacuar-me perante o que é sombrio
Evacuar-me diante de quem me deseja
Não ser desejado
Mas ser dissimulado
Feito um caracol lunático que caminha ás tontas numa folha
De alguma verdura
Lívia que me deixou no início da primavera
E sem falar em outras tantas que me largaram em cada estação
Sou o caracol lunático dessas mulheres que me apertaram
Com tanta fome e destruição
Sou e pronto
Um caracol que arrasta calmamente sua carcaça
Numa folha de vegetação molhada pelas gotas de chuva
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