quinta-feira, 31 de julho de 2025
Recado
Não dizer que a voz veio do vento
ou que o vento tornou-se voz
Nem que era um sussurro mudo
que como alma pairou entre nós
Não sou alguém para supor
o que o suor dos olhos diz
Só sinto pena dos nãos
quantos deles já existem
Mariana Teixeira
quarta-feira, 30 de julho de 2025
Platão e a Metáfora
noite a adubar o mar
estrelas cadentes no cio,
garças brancas prometiam...
fragueiro, faroleiro,
Platão fazia sinais, tocava sinos
para a palavra unhar naquelas águas.
lua cariada de desejos,
parar não podia, respondeu a palavra:
havia perdido as âncoras.
Lasana Lukata
terça-feira, 29 de julho de 2025
Um poema de Cesar Kiraly
antes da soltura
ímpar
o que nos resta é sândalo
sonhâmbulos
encordela
meu pescoço
peço para não ter ruídos
Cesar Kiraly
segunda-feira, 28 de julho de 2025
escarlate
Meus dias se tornaram vermelhos
viscosos, delirantes, difíceis de interpretar
nem meus pés, sempre ardentes
são efetivos em me fixar
uma realidade escorregadia me engloba
e eu deslizo
dançando pelo salão
Marcela Sperandio
A Arte de Perder, poema de Elizabeth Bishop — tradução por Paulo Henriquess Britto
A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas
coisas contêm em si o acidente
De
perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca
um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
A
chave perdida, a hora gasta bestamente.
A
arte de perder não é nenhum mistério.
Depois
perca mais rápido, com mais critério:
Lugares,
nomes, a escala subsequente
Da
viagem não feita. Nada disso é sério.
Perdi
o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
Lembrar
a perda de três casas excelentes.
A
arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi
duas cidades lindas. E um império
Que
era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho
saudade deles. Mas não é nada sério.
—
Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que
eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que
a arte de perder não chega a ser mistério
por
muito que pareça (Escreve!) muito sério.
Elizabeth Bishop
Tradução de Paulo Henriques Britto
Poema de Lucas Viriato
como atingir o espaço sideral
sem ter meu habitual
Cabo Canaveral?
como cumprir o que se fala
ir à Meca dar três rodadas
sem ter ao centro minha Kaaba?
como sentir o vento leve
Iansã outros seres na pele
sem uma guia que preste?
Lucas Viriato
GORDO
Sou um sapo tocando sax
Um baiacu excitado
Os remédios me engordaram
Remédios fazem muitas coisas
E ainda não curam
Mas não há melhor companhia
Para uma noite vazia
Alguns miligramas de você
Talvez mudassem tudo
Rodrigo de Souza Leão
domingo, 27 de julho de 2025
Brasília, de André Giusti
Materiais
A utilidade da pedra:
fazer um muro ao redor
do que não dá para amar
nem destruir.
A utilidade do gelo:
apaga tudo que arde
ou pelo menos disfarça.
A utilidade do tempo:
o silêncio.
Paulo Henriques Britto
sábado, 26 de julho de 2025
A paixão de Nelson Rodrigues ecoa em cena na voz e na alma de Fernanda Montenegro
Quem conta esse episódio é a própria Fernanda no palco do Teatro Multiplan, onde a artista carioca fica em cartaz até este sábado, 26 de junho, com a leitura do texto “Nelson Rodrigues por ele mesmo”, antes de partir em turnê pelo Brasil. O espetáculo vem arrebatando multidões desde 2014, em apresentações alternadas com a peça em que a artista lê texto da escritora francesa Simone de Beauvoir (1908–1986), ícone do feminismo.
Essa passagem do texto “Nelson Rodrigues por ele mesmo” adquire humor involuntário, uma fina ironia, por ser contada pela própria atriz que protagonizou a ocorrência dramatúrgica. Escrita por Nelson em 1960, “O beijo no asfalto” chegou à cena em 1961 em marcante montagem dirigida por Gianni Ratto (1916–2005) para o Teatro do Sete, grupo integrado por Fernanda com Sergio Britto (1923–2011), Ítalo Rossi (1931–2011) e o companheiro de vida, palco e coxia Fernando Torres (1927–2008), entre outros dos grandes pioneiros do teatro brasileiro.
Quatro anos depois da estreia da peça “O beijo no asfalto”, Fernanda Montenegro cruzou novamente seu caminho profissional com o de Nelson Rodrigues ao estrelar, em 1965, o filme “A falecida”, dirigido pelo cineasta Leon Hirszman (1937–1987), a partir de outro texto para teatro escrito pelo dramaturgo com o rótulo de “tragédia carioca”.
Contudo, na leitura de “Nelson Rodrigues por ele mesmo”, essas interseções biográficas importam menos do que a habilidade extraordinária da atriz para captar todos os sentimentos do mundo impressos nas linhas e sublinhas do texto em que Nelson Falcão Rodrigues (23 de agosto de 1912–21 de dezembro de 1980) recorda trechos fundamentais da vida gerada no Recife (PE), mas vivida desde a infância no mesmo subúrbio carioca que pariu Arlete Pinheiro Esteves da Silva, nome de batismo de Fernanda Montenegro, nascida em 16 de outubro de 1929, há quase 96 anos.
Arlete virou Fernanda em cena, a partir de 1950. É com a técnica e a alma distintivas de uma atriz inigualável que Fernanda lê Nelson Mas ler é verbo insuficiente, impreciso, diante da imensidão da cena, do vasto mundo amplificado pelas palavras do dramaturgo na voz grave da atriz. Mesmo que o espectador desconheça por completo o universo da obra de Nelson Rodrigues, ele sairá do teatro com a percepção de que o escritor foi um espírito em desassossego, atormentado, entre outras coisas, pela “visão já conhecida” do assassinato do irmão Roberto Rodrigues (1906–1929), falecido com 23 anos de idade. Então, Nelson tinha apenas 17 anos.
A sombra da morte permeou a vida de Nelson, aquele cujo destino parecia ser exaltar o pecado na escrita. Fernanda diverte o público ao contar do tema da primeira redação escolar do futuro escritor (o adultério), comove a plateia ao mencionar os retiros do escritor em cidades como Campos do Jordão (SP) para tentar escapar da sanha assassina da tuberculose e surpreende os espectadores ao realçar a vaidade aflorada do dramaturgo a partir da aclamação unânime com a segunda peça, “Vestido de noiva”, marco da modernidade do teatro brasileiro na encenação de 1943 orquestrada sob direção de Ziembinski (1908–1978).
Todos esses acontecimentos parecem ganhar vida na voz, no corpo, nas inflexões e nos olhares de Fernanda Montenegro. Não é uma leitura o que se vê e ouve no palco, mas uma intepretação enriquecedora da obra escrita pela filha de Nelson, Sonia Rodrigues, e apresentada em 2012 com a reunião de declarações do dramaturgo em entrevistas.
A seleção de Fernanda Montenegro torna ainda mais fina a costura da obra. Há princípio, meio e fim na transposição de “Nelson Rodrigues por ele mesmo” para o palco. Há sobretudo o ritmo dado pela atriz, senhora dessa cena aliciante em que desvenda obsessões e delírios de Nelson Rodrigues, cujas angústias dores e lágrimas podem até gerar na plateia nervosos sorrisos de ironia, como sugerem os versos da ária “Vesti la giubba” (1892), tema da ópera italiana “Pagliacci” ouvido em cena como espécie de prólogo para tudo que será lido pela atriz.
No circo de ilusões e horrores da vida, Nelson Rodrigues nunca foi um palhaço, mas um escritor de alma atormentada e assumidamente reacionária que se redimiu pela obra magistral, pela revisão da postura política (a partir da prisão e tortura do filho Nelson Rodrigues Filho na década de 1970) e que, no resumo da ópera, deu o máximo de si mesmo, como sublinha ao fim Fernanda Montenegro, dama da cena, ao alimentar a eternidade do escritor na magia do palco.
Mauro Ferreira
Saudade — poema de Manuelle Rosa
Saiba,
às vezes
a ausência da tua presença
me assalta
e quase me rouba umas lembranças boas...
umas memórias caras...
justamente aquelas que me farão mais falta.
Manuelle Rosa
sexta-feira, 25 de julho de 2025
Resposta — poema de Laura Assis
Acho que enfim ouvi
o click do nosso encaixe:
eu sigo o sim sem vontade,
você sabe — todo segundo é o último.
será tarde?
Laura Assis
Buttons: poema visual de Ingrid Bittar
É
com alegria que o Plástico Bolha retoma a parceria de longa data com
a artista visual Ingrid Bittar (1989), que atuou como ilustradora de
diferentes edições impressas do jornal. Carioca radicada em Berlim,
na Alemanha, Ingrid, também conhecida como Britta, realiza trabalhos
com colagem, bordado e aquarela. Aqui, repostaremos alguns dos
“buttons” que a artista vem divulgando em seu perfil de
Instagram: @ibbritta . Essas pequenas peças em microcolagem compõem
uma forma híbrida, tensionada de texturas, palavras e imagens, que
delineia uma topografia íntima e coletiva, em que o alheio e o
doméstico, o estranho e o familiar, são friccionados, incitando o
pensamento crítico e o prazer estético.
Pierre, o flâneur — texto de Eduardo Moraes
Pierre
acorda sempre às 5h em ponto já tirando a regata e as cafonas meias
compridas. Suando, como de costume, por se recusar a ligar o ar
condicionado. Pelo menos tinha aprendido a abrir as janelas para
entrar um ar. Já solta duas ou três bufadas quando ouve o barulho
da rua, corre à janela para espiar o que os transeuntes estão
fazendo no estimado bairro da Glória. Resmunga enquanto sorri
por dentro pela visão familiar de cada dia. Ele
era um daqueles branquelos com
a pele queimada do sol e, por mais que morasse no Brasil há muitos
anos, sempre ficava com a bochecha vermelha, denunciando a sua
cara de gringo. Usava aquele chapeuzinho de malandro que
ornava perfeitamente com a sua barriguinha de chope, que, de
fato, tinha muita história para contar.
Quando
chegou da França, vinte anos atrás, não tinha escolhido o bairro
para morar, foi a Glória que o escolheu. Pelo menos era isso
que ele contava quando queria romantizar a sua história no Rio de
Janeiro. A verdade é que veio ao Brasil a convite dos sócios de
Gaston Lenôtre para comandar a cozinha de um bistrô na Zona Sul
carioca, métier que
não vingou pela sua falta de assiduidade no trabalho. Rapidamente
deram a cozinha na mão do ainda não tão conhecido Claude
Troisgros, e Pierre ficou de mãos abanando.
Com
dinheiro apenas para mais um mês no apartamento que estava no
Flamengo, descobriu uma pensão simpática e barata na Glória, cuja
dona, Jussara, hoje uma grande amiga, aceitou recebê-lo em troca de
serviços gastronômicos até que ele encontrasse um emprego. Para
ele, estava ótimo, ainda mais considerando que aquele quartinho na
pensão era mais que o dobro do chambre
de bonne no 9ème
arrondissement de
Paris em que vivia antes de chegar ao Rio. E a localização era
ótima, bem perto do metrô da Glória, onde hoje funciona o hotel
(motel) Love
Time.
Só
que ele não parava em um emprego sequer, de modo que seus pagamentos
eram inconstantes e raros, mas assim foi levando por alguns meses.
Sorte dele que Jussara aceitava, porque o motivo era simples: ele
era um flâneur incurável.
Não
andava com tempo cronometrado ou preocupado com o caminho mais
rápido. Pierre ia vagando, passeando sem pressa pelas ruas, vendo a
vida acontecer diante dos seus olhos, contemplando cada detalhe e se
inspirando nas belezas que o Rio tinha a oferecer a ele diariamente.
E
Pierre desempenhava com louvor todas as modalidades de flâneur.
O vagabundo de Baudelaire. O flâneur investigador
de Allan Poe. Ou o “cronista da cidade” descrito por Walter
Benjamin. O azar é que nenhuma dessas modalidades era admirada pelos
seus chefes.
Enquanto
perambulava pelas ruas, nada mais importava. Ele só queria
bater perna, dar um borboleteio e flanar, ora! Foi
ficando mais simpático com o passar dos meses e por todos os lugares
pelos quais passava lançava um sorridente “Bonjour,
Monsieur”.
Como a rotina era diária, para os mecânicos da oficina, os padeiros
da rua e para o apontador do jogo do bicho, Pierre virou o “Seu
Mêsiê”.
O
pessoal brincava, mas no fundo gostava da sua formalidade, que nunca
o deixou tratar os outros sem ser por “vous”, que, com o tempo,
acabou virando "você".
Dizia
a todos que tinha parado de fumar quando completou mais tempo de
Brasil que de França. A exceção era quando estava irritado. E,
mesmo sem muitos motivos para estar, todo dia ele dizia que alguma
coisa o tinha tirado do sério, o que obrigava o homem a dar um
traguinho no seu cachimbo. Sempre na surdina, para ninguém notar. Só
que todo mundo notava. Quando
alguém o acusava, já apontava para o pôster amarelado do “La
trahison des images”
de
Magritte que tinha nos fundos da pensão dizendo “Ceci
n'est pas une pipe”.
Quando
ganhava um cascalho a mais, pagava o que devia à dona Jussara, que
nunca cobrava nem aplicava juros ou correção, e ia ao restaurante
da esquina, que era simples, mas delicioso, para pagar uma cerveja e
um jantar a ela.
Quem
comandava o boteco e morava no charmoso apartamento que ficava em
cima era Elba. Pierre, como 80% dos frequentadores, se apaixonou
por ela. Classuda, inteligentíssima e muito bonita.
“Elle
est très jolie, cette femme, mais bien plus que ça”.
Ele
achava muito irônico estar apaixonado por uma mulher que levava o
nome da ilha italiana em que Napoleão foi exilado.
Ainda
mais pelo fato de seu nome ter sido escolhido justamente pela raiva
de sua mãe, Hilda, professora de História na rede pública, pelo
pai, Seu Napoleão, um cara muito bonito que parecia que não
envelhecia, e conhecido por ser um grande cafajeste por todo Rio
Comprido e adjacências. Não era Bonaparte, mas também era um
conquistador. Seu
apelido? O Príncipe Etíope, pela sua semelhança com o craque
Didi, da Seleção Brasileira, e que fez história no Fluminense e no
Botafogo.
Elba
começou a trabalhar muito cedo, sem nunca largar a escola, algo que
sua mãe não perdoaria. Formou-se na escola e, a duras penas, também
na faculdade de Administração. Depois de graduada tocou alguns
negócios bem-sucedidos com uns colegas de faculdade, até tomar um
golpe de um sócio.
Perdeu
tudo.
Ficou
mais cascuda, e também bem amargurada, de modo que perdeu o sorriso
fácil, que só aparecia quando alguém tocava alguma do Paulinho da
Viola ou do Jorge Aragão. Decidiu que seu novo negócio seria um
restaurante simples, agora sem sócios. E que toda sexta e sábado
teria samba. Afinal, no samba ela sabia que podia confiar. E
deu certo. Muito certo.
Bancava
a casa da mãe, que atualmente morava com seu novo marido, e também
os remédios do pai, que tinha dinheiro para tudo, menos para os
remédios do vitiligo, que o afetava muitíssimo por influenciar sua
aparência, apesar de não diminuir em nada os casos que arrumava
pelo Rio de Janeiro.
Um
dia, bem na hora de fechar o recinto, Pierre apareceu por lá dizendo
que era a décima vez que ia no restaurante e que queria chamá-la
para jantar. Mas que nunca tinha tido coragem.
Ela
disse que não era assim que funcionava, mas gostou da
ousadia. Falou
que ia pensar e subiu para casa com um sorriso no rosto, que Pierre
não achou que tinha sido por sua causa, já que ao fundo tocava
“Timoneiro”. Sorriu porque viu que as palavras eram sinceras
e não mais um papinho de um gringo fetichizando uma mulher
preta brasileira, como já tinha vivenciado dezenas de vezes.
Na
décima primeira ida ao bar, ele renovou o convite, agora com mais
convicção. Ela curtiu, mas disse que preferia um café da manhã.
Ele topou, é claro, porque não podia perder a oportunidade, mas por
dentro pensou não entendia muito bem essa história
do petit-déjeuner se
chamar, em português, “café da manhã” e ser mais do que apenas
um café.
O
romance vingou.
E,
conforme evoluía, Pierre percebeu que não sustentaria por mais
tempo nas condições de vida que levava. O nome de Elba era
trabalho e o sobrenome, hora extra. Ela
valorizava demais a labuta. E também não dava para levá-la para a
pensão de Dona Jussara dia sim dia não. Ao mesmo tempo, não
conseguia abandonar sua alma de flâneur.
Enfim, tomou uma decisão: por Elba, acordaria mais cedo ou dormiria
mais tarde para poder flanar antes e/ou depois do horário comercial
e provaria a ela que sabia e podia trabalhar bem.
Elba
falava pouco com palavras, mas muito com o olhar e percebeu a
movimentação de Pierre, até que decidiu fazer uma proposta de
trabalho. Ele comandaria a cozinha da birosca e lhe daria aulas de
francês em troca de um salário mais do que justo, que o ajudaria a
pagar suas dívidas na pensão. E tinha um bônus: se desse
certo, ela o colocaria para dentro de casa definitivamente. Ele
aceitou na hora.
— Ça
va aller, mon cœur -
puxando o “r” de propósito, porque sabia que ela gostava.
A
convivência diária não começou fácil. Mesmo depois de muito
tempo de curso, Pierre seguia jogando lixo no vaso, para terror de
Elba, que ficava louca quando o via lançar na latrina os papéis que
usava para sua higiene matinal. Os gastos com pão, manteiga, queijo
e geleia aumentaram demais, e ela detestava abrir a porta do banheiro
e se surpreender com ele fazendo xixi sentado, costume que pegou de
seu pai alemão.
Falando
em pai alemão, ele, que sabia a sua árvore genealógica de cor até
a quarta geração, aprendeu que, no Brasil, que vive até hoje as
mazelas dos 300 anos de escravidão, era normal que uma pessoa
preta da sua idade não soubesse o nome e muito menos a origem dos
bisavós. No caso de Elba, nem o nome dos avós maternos.
Pierre
foi aprendendo a viver com Elba e botou na rotina os dois banhos
diários. Tudo bem que eram banhos de gato, gelados e rapidíssimos,
mas pelo menos tomava. Foi a condição imposta para ganhar um beijo
quando descesse no bar, onde Elba já começava a todo vapor
coordenando as rotinas do recinto. Antes mesmo das suas flanadas
matinais.
Outro
problema foi a mania de Pierre com tigelas. Ele usava todas da casa
para as mais diversas utilidades. Sopa, geleia com pão e até café,
que tomava apenas um por dia, acompanhado de um shot de pastis
marseillais, sempre
depois do almoço para não dormir em pé.
Apesar
de algumas alfinetadas, ela o amava muito. E sabia disso pelo simples
fato de seu lindo sorriso ter voltado para o rosto.
Amava
o seu audível “bon
appétit”,
que desejava para todos que servia. Achava uma graça o fato de fazer
questão de comer na mesa posta e sempre esperar todo mundo se sentar
para comer nas clássicas feijoadas de sexta-feira que serviam no bar
para todos os funcionários, dona Jussara e outros amigos do bairro.
Só detestava a nojenta mania de assoar o nariz à mesa e pediu para
ele parar. Ele parou.
“Pas
de problème, mon chou!”
Eles
viviam situações inusitadas nessa dinâmica franco-brasileira.
Quando ele disse que ia “faire
le ménage”,
ela deu um tapa na sua cara, sem ver que ele estava com o aspirador
de pó na mão pronto para fazer uma faxina na casa. Ela pediu
desculpas e explicou o porquê. Ele não só entendeu como concordou
com a reação dela. Sempre romântico, antes de beijá-la, cravou:
“J’ai
envie de toi et seulement de toi”.
E
nessa de ficar falando português e francês misturados, acabou se
surpreendendo com a safadeza de Elba quando, em um momento íntimo, a
moça, querendo dizer um “Beija Eu”, no melhor estilo Marisa
Monte, lançou um “baise-moi”,
que acabou de fato se concretizando no final da noite.
Mas
essa, no caso, foi uma confusão boa.
Fora
as clássicas de gênero. Era “a carro” (la
voiture)
pra cá, “um árvore” (un
arbre)
pra lá e o lindo erro de falar “a mar” (la
mer),
que fazia o coração de Elba vibrar já que achava que o
equívoco era a palavra “mar” ser um substantivo masculino.
Uma
que amava também, e que Pierre continuava errando de propósito, era
o uso dos verbos prendre e offrir em
tradução literal.
Quando
ela passou a flanar com ele, volta e meia paravam para “pegar um
café da manhã” (prendre
un petit-déjeuner)
ou paravam em alguma loja em que ele “oferecia um presente”
(offrir
un cadeau)
a ela, mas não só oferecia, dava!
E
nessas andanças, Elba só se apaixonava ainda mais por Pierre, que
militava pela flânerie dizendo
a ela que seus antigos chefes o chamavam de vagabundo porque não se
adequava ao sistema. Mas reconheceu que sem Elba, nunca teria entrado
no prumo e que sua disciplina o fez ser um homem melhor.
Por
isso, acorda para trabalhar com um sorriso no rosto. Todos os dias.
Com
Elba, ele aprendeu a trabalhar. Com Pierre, ela aprendeu a flanar. E
assim vão levando, na labuta ou flanando.
E
amando.
Eduardo Moraes
Oficina de texto infantojuvenil na PUC-Rio!
Legado
Teu cheiro e tua dor,
teu cheiro e teus olhos,
a memória da tua voz
ainda pulsam sobre minha nuca;
ainda me perseguem pelos bosques
das minhas novas desventuras.
A cinza do teu soluço
entranhou-se em minha pele
há semanas infindas.
Teu amor
é crime
que não esqueço.
Thássio G. Ferreira
Espaços
Nos cadernos de faculdade
Os poemas
Lutavam
Por espaço
Entre as matérias
Minhas poesia
Nunca foi covarde
Fillipe José Diniz
quinta-feira, 24 de julho de 2025
O chapéu de Beckett — Helena Martins (trecho)
Helena Martins
Se você gosta de Teatro e também quer simplificar a vida, basta ler o texto completo da professora Helena Martins, pulicado no número 26 da Revista Gragoatá, de Niterói, clicando aqui!
Um poema de Fabrício Carpinejar
Não sei me despedir
da vida, do trabalho,
dos pais.
A indiferença cobre-nos de igualdade.
Não me enraizei,
muito menos presto para ser colocada fora.
Minha razão é inferior ao desejo
Penso com os pés.
Fabrício Carpinejar
O rei do gado
Na ficção
como na vida
o rei só é rei
e o gado só é gado
por um acordo tácito:
o poder é dado
àquele que já
parece ostentá-lo
de antemão.
Mas rei e gado
só cristalizam
sua natureza
numa relação
viciada:
o rei precisa do gado
para ser rei,
e o gado precisa do rei
para ser gado.
Henrique Duarte Neto
GERAÇÃO COCA-COLA — Rodrigo de Souza Leão
os óculos quadrados
para ver o horizonte
as lentes claras
para ler nos rostos
a alma da geração
que não se perdeu
nunca se encontrou
Rodrigo de Souza Leão
A palavra imediata — de Roberta Lahmeyer
Um feixe de luz
Refletido na parede
Despertou a palavra infinito
Roberta Lahmeyer
quarta-feira, 23 de julho de 2025
BRAZILIAN DREAM
I am what I am, and that's all what I am?
Popeye de santo é o marinheiro
the Marines invadem algum Oriente Médio
todos herdeiros do sangue haitiano
da Hemocaribbean Company
um biscoito por um litro do seu sangue
nosso espinafre
Popeye de santo
pitando seu cachimbo
Popeye o caolho estourado
sub-Camões aparvalhado
rei do terreiro
jogando búzios
para seu rebanho de cavalos
onde montam Exu, Oxossi, Saravá
Popeye de santo
e seu despacho guerra santa
Olivia Palito de burca Talibã
marinheiro desembarcando no deserto
ao som de uma Britney Maria Padilha
Popeye de santo is the sailorman
Well, blow me down!
O petróleo é o meu espinafre!
O petróleo é o meu sangue!
Domingos Guimaraens
A parte do fogo
Como retirar palavras
De uma fogueira
Que arde e
Depois se extingue?
Como retirar das cinzas
palavras novas?
É preciso perceber
As formas do silêncio
Ou talvez
Nunca parar de falar
Roberta Lahmeyer
Lançamento do novo livro de Jozias Benedicto
Lançamento
no Rio de Janeiro:
Local: Capitu Café – Rua Cosme Velho, 174
Data: 29 de julho a partir das 18h
Lançamento na FLIP – Feira Literária Internacional de Paraty:
Local: Casa Caravana
Rua Tenente Francisco Antônio, 319 (Rua do Comércio)
Centro Histórico de Paraty
Data: 31 de julho a partir das 20h
Título: “As vontades do vento”
Caravana Grupo Editorial
Autor: Jozias Benedicto
Gênero: ficção, romance
Páginas: 200
1ª. edição: 2025
Editor: Leonardo Costaneto
Apresentação: Andreia Fernandes
Título: “Nada permanece nunca”
Caravana Grupo Editorial
Autor: Jozias Benedicto
Gênero: ficção, contos
Páginas: 148
2ª. edição: 2025
Editor: Leonardo Costaneto
OS HÓSPEDES: Dante — de Adriano Espínola
Exilado em mim mesmo e do país,
sonhei a fera e Virgílio companheiro.
No céu, de mim ausente, a Beatriz.
Depois, no inferno pus o mundo inteiro.
Adriana Espínola
terça-feira, 22 de julho de 2025
4 VEZES BECKETT — de Anésio Pereira Dutra
Eu vi a queimada grassando o papel,
sem lume, sem som,
sem busca, sem dor.
A forma fumaça
contorcida em pontas acesas
no rigor das feridas.
Lastro escuro, plenitude mortal.
Anésio Pereira Dutra
Pranto — poema de Anésio Pereira Dutra
O choro é delicado:
encosta e espera,
não força nem se revela.
Anésio Pereira Dutra
Viagem — poema de Anésio Pereira Dutra
Inédito — poema de Anésio Pereira Dutra
Vendo o já visto,
descubro visitas
que não fiz.
Anésio Pereira Dutra
Frouxo — poema de Anésio Pereira Dutra
Laços fora, não.
Desata o rigor,
afrouxa
o gatilho,
libera a dor.
Depois, de
mansinho,
latejando a esperança,
acordar as
estrelas,
degela o amor.
Anésio Pereira Dutra
Verdade — poema de Anésio Pereia Dutra
Todo mundo faz seu verso, e isto é muito bom.
Mas a palavra,
rastro laminado
na cor da incisão
(verdade encruada),
não dá prêmio de consolação.
Anésio Pereira Dutra
África — poema de Anésio Pereira Dutra
Homens de recusada mortalidade
esfregam tiros e risos
na pele da criação.
Enlutam cores,
riscam o sangue,
rasgam e ferem
a mãe do futuro.
Desaquecidas do sol,
imoladas bocas negras
cospem o espanto
e protegem as velas
com o arco das mãos.
São como pedras
sem seu destino mineral.
E, quando o chão murmura
os nomes e as dores lavadas,
homens de recusada mortalidade
amputam sementes,
remarcam sonhos,
embriagam o presente
e fazem chorar a mãe de criação.
Anésio Pereira Dutra
Um poema de Carlos André
poesia não é
rima
esqueça
prima da mímica
irmã da música
filha do capeta
que mora dentro da
cabeça
Carlos André
Parem de falar mal da rotina, com Elisa Lucinda
Um poema de Paulo D'Auria
a linha do equador é imaginária
a linha da pobreza, não
a linha do horizonte é uma linha imaginária
a vida sem horizontes, não
figuras de linguagem nem sempre são bonitas de se ver
a poesia também nem sempre são bonitas de se ver
a poesia também é um lugar selvagem
Paulo D'Auria
segunda-feira, 21 de julho de 2025
Lançamento do livro "Enquanto elas crescem no escuro" de Laura Assis, em JF, RJ e SP 💘💘💘
"Os poucos minutos que passava naquele elevador — um modelo dos mais antigos, com duas paredes que imitavam de modo ordinário a textura de madeira, uma porta sanfonada lenta e ruidosa e um enorme espelho cuja opacidade denunciava a passagem do tempo e a falta de cuidado — não eram lá muito agradáveis, mas isso era o de menos. Claro que não era fácil se fechar naquela velha cápsula de aço barulhenta, que subia e descia no espaço escuro do poço, pendurada por um cabo em que ninguém parecia querer pensar muito, mas que há tantos anos sustentava todos os dias o peso de dezenas de corpos e poderia, como tudo no mundo, se romper de repente. Entretanto, ela sabia que a verdadeira provação viria depois."
[trecho do conto "Vida em Marte"]
Laura Assis
Poema de Claudia Roquette-Pinto
Então é isso:
essa série de imprevistos
rondando o imaginado
enquanto em alguma baía,
istmo ou íntimo
acidente geográfico
uma cerejeira, inteira em flor
queima de abelhas
arma o seu buquê de ruídos.
Claudia Roquette-Pinto
nenhuma gentileza nas mãos
acabei de descobrir
tenho um corpo nele tem: palavras
cômodos, lâmpadas uma casa inteligente orgânica
toda dinâmica se batem palma é para que algo se acenda.
meu antigo problema de esquecimento foi solucionado.
um corpo nunca esquece onde estão as chaves
descobri que tenho um corpo
há sinais: desastres hídricos geológicos incêndios
emanações vulcânicas menstruações inundações
descobri que todo corpo é horta-praga
assim se faz uma vizinhança. confusão
entre vizinhos: o seu telhado sobre o meu
Maria Emanuelle Cardoso
Copacabana
Esboço — poema de capa da edição do PB #30
no pé do caderno
comecei a tracejar
esse caminho
quase acabado.
sonhei com rampas
e prédios incendiados
esbocei que era Nero.
Natalia Eme
Uma análise do poema "Portuñol/Portunhol", de Ivana Vollaro — por Rafaela Albernaz
Foi somente aos doze anos, quando comecei a estudar francês na escola, e fiquei fascinada por suas semelhanças e diferenças com o português, que eu mergulhei pela primeira vez na linguística, e me surpreendi ao aprender que quase todas as línguas europeias (e algumas asiáticas) possuíam uma origem comum, tendo evoluído a partir do Proto-Indo Europeu.
Também descobri o conceito do contínuo dialetal, que descreve um conjunto de dialetos falados numa área geográfica. Em tais contínuos, dois dialetos vizinhos são facilmente compreensíveis, como o português e o espanhol, enquanto dois extremos, como o português e o romeno, são de mais difícil compreensão. Existe até uma famosa expressão descrevendo a dificuldade de definir se duas línguas próximas são distintas ou dialetos de uma língua só, e como a política está bem envolvida neste processo: “Uma língua é um dialeto com um exército e marinha.”
Ao descobrir essas complexidades e entender que línguas são primeiramente um meio de comunicação, e que a gramática não é uma lei sagrada, passei a me sentir bem envergonhada a respeito de minhas opiniões infantis e ignorantes sobre o portunhol, que, como todas as línguas misturadas, serve como uma ponte entre dois povos. Ao ver este poema, lembrei dessas antigas emoções, e fiquei me perguntando como teria me sentido se o tivesse visto ainda possuindo aqueles preconceitos.
Quanto aos modos de compreensão, apesar de ser classificado como um poema, esta obra, assim como muitas outras presentes na revista “Artéria”, poderia ser classificada como um quadro/obra de arte visual. Afinal, a poesia visual é uma síntese destes dois meios, e esta obra foca mais no aspecto visual do que verbal, tendo como palavras completas apenas as duas versões do título.
O til/h pequeno brinca com a própria origem do eñe espanhol. Originalmente, o fonema /ɲ/ era representado pelo dígrafo “nn”, que representava um n longo em Latim. Já que pergaminho era um material bem escasso e caro na era medieval, escribas desenvolveram um sistema extenso de abreviações para certos dígrafos e palavras, que costumavam envolver ou colocar uma letra minúscula em cima de uma letra de tamanho normal, ou um acento, como o próprio til. Neste poema, o til/h faz referência a ambos os métodos. Ademais, o til/h parece o símbolo matemático “≉”, que significa “não é quase igual a”.
Há ainda uma estratégia de oralidade nesta obra: a brincadeira oral deste poema surge do fato de ambas as línguas pronunciarem o título da obra da mesma forma, apesar da grafia diferente: o eñe espanhol, e o dígrafo nh, que aqui representa o português. (Interessantemente, ele originalmente surgiu na lingua occitana, outra integrante da família românica, e mãe do trovadorismo.)
Além de representar o fenômeno do Portuñol/Portunhol de uma maneira concisa e memorável, o poema me fez pensar sobre como sua premissa, retratando as diferenças marcantes entre duas línguas irmãs, e como elas se misturam, poderia ser adaptada para outras línguas. Por exemplo, a língua russa tem pelo menos dois “portunhóis”: o Surzhyk (mistura com o ucraniano) e a Trasianka (mistura com o bielorrusso).
Além disso, também me lembrei do Galego, a língua mais próxima ao português, descrita por muitos que a encontram pela primeira vez como “portunhol oficial”, ou “brasileiros tentando falar espanhol”. Embora o poema não tenha qualquer ligação proposital com esta língua, outra coincidência interessantíssima é o fato de ela usar tanto o ñ (representando o mesmo som que em espanhol) e o dígrafo nh (representando o som /ŋ/, o “ng” do inglês.)
Rafaela Albernaz
Rafaela Albernaz é aluna do curso de Letras da PUC-Rio, onde se destaca pelo seu amplo conhecimento linguístico e interesse encantador pelo mundo das palavras!
Bucólica, de Paulo Henriques Britto
Ordenhar as vacas
menores, mais fracas,
mais magras do pasto,
que dão o leite ralo
com que me regalo.
Das gordas me afasto:
a coisa que abunda,
é nauseabunda,
rançosa, nefasta.
O escasso, no entanto,
cabe no meu canto
e basta.
Paulo Henriques Britto
domingo, 20 de julho de 2025
Um poema de Pedro Tostes
você é tão bela
quanto o balé das parabólicas
no céu de são paulo
Pedro Tostes
Latinoamérica — canção de Calle 13 ✊
Soy, soy lo que dejaron
Soy toda la sobra de lo que se robaron
Un pueblo escondido en la cima
Mi piel es de cuero, por eso aguanta cualquier clima
Soy una fábrica de humo
Mano de obra campesina para tu consumo
Frente de frío en el medio del verano
El amor en los tiempos del cólera, mi hermano
El sol que nace y el día que muere
Con los mejores atardeceres
Soy el desarrollo en carne viva
Un discurso político sin saliva
Las caras más bonitas que he conocido
Soy la fotografía de un desaparecido
La sangre dentro de tus venas
Soy un pedazo de tierra que vale la pena
Una canasta con frijoles
Soy Maradona contra Inglaterra anotándote dos goles
Soy lo que sostiene mi bandera
La espina dorsal del planeta es mi cordillera
Soy lo que me enseñó mi padre
El que no quiere a su patria, no quiere a su madre
Soy América Latina
Un pueblo sin piernas, pero que camina, ¡oye!
Tú no puedes comprar al viento
Tú no puedes comprar al sol
Tú no puedes comprar la lluvia
Tú no puedes comprar el calor
Tú no puedes comprar las nubes
Tú no puedes comprar los colores
Tú no puedes comprar mi alegría
Tú no puedes comprar mis dolores
Tú no puedes comprar al viento
Tú no puedes comprar al sol
Tú no puedes comprar la lluvia
Tú no puedes comprar el calor
Tú no puedes comprar las nubes
Tú no puedes comprar los colores
Tú no puedes comprar mi alegría
Tú no puedes comprar mis dolores
Tengo los lagos, tengo los ríos
Tengo mis dientes pa' cuando me sonrío
La nieve que maquilla mis montañas
Tengo el sol que me seca y la lluvia que me baña
Un desierto embriagado con peyote
Un trago de pulque para cantar con los coyotes
Todo lo que necesito
Tengo a mis pulmones respirando azul clarito
La altura que sofoca
Soy las muelas de mi boca mascando coca
El otoño con sus hojas desmalladas
Los versos escritos bajo la noche estrellada
Una viña repleta de uvas
Un cañaveral bajo el sol en Cuba
Soy el mar Caribe que vigila las casitas
Haciendo rituales de agua bendita
El viento que peina mi cabello
Soy todos los santos que cuelgan de mi cuello
El jugo de mi lucha no es artificial
Porque el abono de mi tierra es natural
Tú no puedes comprar el viento
Tú no puedes comprar el sol
Tú no puedes comprar la lluvia
Tú no puedes comprar el calor
Tú no puedes comprar las nubes
Tú no puedes comprar los colores
Tú no puedes comprar mi alegría
Tú no puedes comprar mis dolores
Não se pode comprar o vento
Não se pode comprar o sol
Não se pode comprar a chuva
Não se pode comprar o calor
Não se pode comprar as nuvens
Não se pode comprar as cores
Não se pode comprar minha alegria
Não se pode comprar minhas dores
No puedes comprar el sol
No puedes comprar la lluvia
(Vamos caminando)
(Vamos caminando)
(Vamos dibujando el camino)
No puedes comprar mi vida (vamos caminando)
La tierra no se vende
Trabajo bruto, pero con orgullo
Aquí se comparte, lo mío es tuyo
Este pueblo no se ahoga con marullos
Y si se derrumba yo lo reconstruyo
Tampoco pestañeo cuando te miro
Para que te recuerde' de mi apellido
La Operación Cóndor invadiendo mi nido
Perdono, pero nunca olvido, ¡oye!
Aquí se respira lucha
(Vamos caminando) Yo canto porque se escucha
(Vamos dibujando el camino) Oh, sí, sí, eso
(Vamos caminando) Aquí estamos de pie
¡Qué viva la América!
No puedes comprar mi vida