domingo, 13 de maio de 2018

Empedernização do eu



Choro para perimir meu choro. Estou à beira de um conluio comigo mesmo que visa  à maquinação da minha própria morte. Meu corpo é um mocambo que abriga a minha quintaessência em um cômodo obscuro de sangue denso e insosso. No intermezzo da minha loucura, antevejo incisivamente o desapercebido da coisa e me pego desbragadamente absorto em meus pensamentos. Algo em mim tornou-se impassível, embora haja uma afluência de delicadezas que me arrojam de bruços contra o travesseiro. Levanto-me e me apoio sobre a torça da janela, e sinto o vento que vem do longe e irrompe as minhas memórias, transviando-me para um encontro frontal do éthos com o "eu" do eu lírico. Golfo minhas bazófias e mergulho a minha cabeça na tina que se encontra no mesmo cômodo de sangue crespo. De ímpeto, suspeito de que a janela seja composta por uma torça falsa e de que o vento nunca existira, e de que o encontro comigo próprio também nunca ocorrera. Estaria esse "eu" na parte mais etérea da minha existência, na qual a fluidez de tudo confunde-se com a não existência do nada? Fui designinado por Deus à autocolusão. Estou a cada dia mais achatado, ressonando dias e noites sem ouvir os estrilos arfantes que o sonhar da  vida e da morte tem me causado. Sinto-me reificado, como se eu ainda fosse semelhante a uma coisa que já fui: como se eu fosse um  parônimo corpulento de alguma outra coisa de que sinto saudade. Culmino em balbuciação uníssona de frações impróprias de anamnese,  escrevendo-me errado, mal direcionado entre o real e o imaginário de uma essência que se ovalou nos meus passos. Sou copiosamente contencioso, conquanto aquele cômodo seja teso e me faça senti-lo sobre a pele flácida um pouco acima do estômago. Constranjo-me a felicidade e  transformo o meu músculo cardíaco em um objeto quadrilongo, senão  esquadriado. Visto-me de um sambenito contumaz, felpudo e lanoso, como se o estopim do mundo estivesse no porvir de me sugar a última gota de sangue chafurdada em humanidade. Atiro-me em minha própria arapuca... Que os Tupis, sangue primo da bandeira do  meu país, perdoem-me. Embora bravamente, luto para salvar a minha morte. Eis uma tapera à procura de habitação.

Augusto César

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