terça-feira, 12 de março de 2019
segunda-feira, 11 de março de 2019
Poema protesto
Saí do papel branco pautado
e pautei as ruas da Cidade
com as cores do meu verso de revolta.
Eu era um poema e cabia num livro,
arquivo doc. ou pdf.
– tanto faz –,
pois já não caibo mais
em quase lugar nenhum.
Agora tanto faz tudo,
porque eu deixei de ser mudo e fui
pra rua mostrar ao mundo
que a vida é mais do que eu sou.
Borracha não me apaga.
Gás não me sufoca.
Eu sou a letra sem forma
Da mentira que me escreveu.
Borracha não me apaga.
Gás não me sufoca.
Eu sou a escrita nova
da verdade que eu conquistei.
Dênis Rubra
quarta-feira, 6 de março de 2019
terça-feira, 5 de março de 2019
segunda-feira, 4 de março de 2019
entre livros e litros
sirvo-me dos livros
como sirvo-me
dos litros, assim sendo
tenho alguns bons
amigos.
– pra não citar
Voltaire
Eduard Traste
quinta-feira, 28 de fevereiro de 2019
Do Feminino na Arte - Oníricas, Exposição coletiva, no Ingá, em Niterói
ONÍRICAS
Exposição Coletiva
Curadoria: Desirée Monjardim
Organização: Karenina Marzulo e Mariana Rocha
Do Feminino na Arte
O público vai poder ver obras variadas, entre desenho, colagem digital, pintura, fotografia e técnica mista, como aquarelas feitas com água do mar. “Oníricas” remete aos sonhos, à fantasia, a algo que foge do ‘mundo real’. Elas, oníricas. Os trabalhos selecionados, de alguma forma, te levam a um mundo fantástico. Os espectadores podem se distanciar de suas realidades e se transportarem quadro a quadro para outras dimensões como lhe aprouverem.
Artistas
Ana Luiza Moraes
https://www.instagram.com/a.luizamoraes
Bruna Pelúcia
https://www.instagram.com/brunapeluciaartes
Graci Kaley
https://www.instagram.com/ateliergraci__kaley
Josiana Oliveiras Art
https://www.instagram.com/josianaoliveirasart
Karenina Marzulo Art
https://www.instagram.com/tatudoaaqui
Luiza Scarpa
https://www.instagram.com/luizascarpart
Marcelle Fagundes Art's
https://www.instagram.com/marcellefagundesarts
Mariana Rocha
https://www.instagram.com/anairamachor
Nicole Peixoto
https://www.instagram.com/nicapeixoto
Vanessa Ximenes
https://www.instagram.com/vanepinturas
https://www.instagram.com/encomenderetratos
Abertura: 12 de março, terça-feira, 19h - 22h
Local: Sala José Cândido de Carvalho
Visitação: de 13 de março a 13 de maio de 2019
Segunda a sexta, das 9h às 17h
Endereço: Rua Presidente Pedreira, 98, Ingá, Niterói-RJ
Informações: (21) 2719-6939/ 2719-9900
Entrada gratuita
Mais informações: https://www.facebook.com/dofemininonaarte
segunda-feira, 25 de fevereiro de 2019
Cacos
Teus espelhos refletem aquilo que temo
as pedras e os espinhos que conversam em minhas costas…
As vozes que gritam
implorando pelo fim do que talvez nunca tivesse sido real,
ecoam nos goles que dou entre um suspiro e outro.
Me aqueço em minhas chamas
nestas noites de inverno em que prometi a mim mesmo
que nunca te deixaria queimar,
e não deixei.
Me afogo nessas doses diárias de autodepreciação,
me fazem desmaiar uma ou duas vezes ao dia.
Me iludo com meus olhos que refletem o que temo
nos espelhos que a ti se estilhaçam em cacos de vidro,
como meu coração,
enquanto me reparto em mil pedaços
sussurro a mim mesmo
“Eu não quero mais ser você…”
Ian Veink
quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019
placas
derrubar placas
é divertido
e chacina o tédio
o sossego
a paz
tudo se revigora.
derrubar placas
te faz pensar na vida.
te faz querer somá-las.
talvez ficassem boas na parede.
no saguão ou na sala de estar?
hum, tanto faz.
derrubar placas é divertido,
mesmo que o motorista morra
por não enxergá-las
na pista.
Matheus Felipo
Matheus Felipo nasceu em 1986, em Mogi das Cruzes, no interior de São Paulo. É formado em História pela Unesp. Escreve, tira fotos de bonecos e faz malabares como hobby.
quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019
Cão de Asas
Sérgio Monteiro de Almeida
Sérgio Monteiro de Almeida é um poeta e artista visual, mora em Curitiba, Brasil. Investiga a poesia não convencional, independente do papel. Seu trabalho foi publicado no Brasil, México, Argentina, Portugal, Londres, Bélgica, Holanda e nos Estados Unidos. Destaque para as revistas Cult, Nicolau, Oroboro, The Lost & Found Times, Plot, Rampike (University of Windsor), La Manzana Poética, Fleursdumal magazine for art & literature, Candido, Relevo. PVs expostos em vários locais do mundo: 51° e 53° Bienal Internacional de Veneza (Ilha da Poesia, 2005; Virtual Mercury House, 2009; ambas com curadoria de Caterina Davignio); Bienal Internacional de Poesia Visual e Alternativa do México (1987, 1990, 1992, 1996, 1998); Harvard’s Visual Poetry exhibition (2004, 2005); VII e VIII Salón International de Arte Digital, Havana, Cuba (2005, 2006).
segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019
Sobre a multiplicação do amor
A vida humana é a tensão que se dá entre veste e nudez. (E. Coccia)
“Recepção”
quero me despir de toda a hipocrisia da saudade
e te sofrer como um espelho
“Partilha”
eles querem limpar as nossas ruas
eles querem duplicar as avenidas
eles querem acabar com todo o amor
mas nós nos absteremos da política
como de uma coisa infecta
e abjetamente desprezível
meu coração não é um motor
“Cogito”
penso em você
logo
o amor existe
“Fânero”
veste
meu corpo nu
a sua imagem e semelhança
“Matéria estranha”
sou o amante e a coisa amada
o meu corpo e o seu
o nada que ergo em sua falta
a forma que devolvo como a lei
o nosso amor
nessa guerra anunciada
defenderei defenderei defenderei
“Reprodução”
aquém da alma
além da pele
habito a matéria estranha do seu meio
e penso
que se vivo sem você
quero perder-me
“Amor”
tumor
“Como foi”
minha imagem era a sua
sua imagem era a minha
você não teve alegria
eu tampouco tive alguma
“Despedida”
você
voa agora daqui
para lá
onde tudo
sempre
se perde no passado
mas diariamente ainda
nasce
e se põe
como o sol
“Envoi”
preciso aceitar a ideia
de que a negação
não
significa um nada
que quando os espelhos
não devolvem a nossa imagem
não
quer dizer que não há nada a se observar
“Nachleben”
meu corpo é o que restou de nós dois
“Encerramento e gran finale”
só você me interessa
só me interessa o que não é meu
Rafael Castro é mestre em estudos literários pelo Pós-Lit/UFMG com a dissertação “A vida sensível do mito na literatura Huni Kuĩ”. É indigenista na Fundação Nacional do Índio.
sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019
Estranheza Ansiosa
Como um mero terceiro
Observo a escuridão tomando conta de
Pensamentos já, há tempos, obstinados.
Como um mero espectador
Clamo pela impaciência dos fótons, para
Que possam se intrometer nas loucuras
Visuais e mentais que nos assolam.
Como um simples cidadão
Perco-me nas imensidões à minha disposição.
Com mãos calejadas, horas e horas se esvaem em poucos minutos
Até o momento em que a deusa dos mares nos preenche com sua presença
Indicando sutilmente o repouso.
Como um simples ser
Noto a irregularidade cotidiana dos fantoches
e meus pensamentos me acentuam questões
que me fazem pensar se não sou apenas mais um.
Em um delírio pós-moderno
Fragmento-me. Dilacero-me. Reconforto-me
em saber que um dia tudo acabará.
HISTORY
quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019
x
é uma entrada de luz por um furo
que pode ser um poro
e a luz pode ser um touro
o amor pode ser um apuro
uma brutalidade
e pra retirar o bicho cirurgicamente
pode ser duro
pode ser duradouro
uma eternidade
tecnicamente uma fraude
um silogismo indecente
há um sismógrafo no escuro
que pode ser um soro
o sangue sumidouro
daí o amor pode ser puro
novamente (e novamente)
calí boreaz
segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019
Discurso de formatura Letras 2018
Bom dia a todas e todos.
Primeiramente, uma ressalva: escrevi este discurso, principalmente, como um ou uma estudante de Letras, e não para o ou a estudante de Letras.
Toda e todo estudante de Letras sabem que os tempos não vão bons para nós, os vivos. Já faz um tempo que eles não estão bons. Fala-se demais nestes tempos (e, inclusive, cala-se). As palavras se esmagam entre o silêncio que as cerca e o silêncio que elas transportam. É cada vez mais pesada a paz do dia-a-dia (há paz no dia-a-dia?). Mas o que é feito das palavras senão as palavras? E o que é feito de nós senão as palavras que nos fazem? Todas as coisas são perfeitas de nós até o infinito — somos, pois, divinos. E uma maneira trivial de exercer nossa divindade é por meio de nosso poder de escolha.
Podemos escolher o que fazer após sair daqui, onde almoçar ou até mesmo se vamos dar um pulo na praia. Isso também é importante. Mas o essencial é que podemos escolher o que pensar. E nosso trabalho é destruir, aos poucos, e com muita intensidade, os pensamentos dominantes que promovem abismos sociais, preconceitos, desrespeito, desamor — e morte. Vamos imaginar que você saia daqui e resolva almoçar. Ao chegar ao restaurante, você pede seu prato favorito: um filé, mal passado, com fritas. Quando a comida chega, você percebe que sua carne está bem passada. O que você faz? Provavelmente, você reclama com o garçom.
Da mesma forma que você reclama, mesmo que internamente, do motorista que não te dá passagem na pista da esquerda ou da caixa de supermercado que insiste em conversar com os clientes e que, por isso, atrasa todo o andamento da fila. E assim, no tédio da rotina cotidiana, no tédio disso que as pessoas chamam de Vida, você vai, automaticamente, esgotando a si mesmo e aos outros.
Mas você pode escolher o que pensar. Você pode escolher pensar que o cozinheiro poderia estar tendo um dia estressante, muito parecido com (mas muito distante do) seu, após ficar mais de uma jornada de trabalho dentro de uma cozinha fervendo e entupida de gente, tendo saído de casa às 04:00 da manhã, fazendo uso de todos os meios de transporte público possíveis para chegar ao trabalho, pontualmente, às 08:00. E quanta história nas costas do motorista à sua frente não segura o carro dele; quanta coisa no peito da caixa de supermercado não a leva a puxar assunto com desconhecidos e retardar o andamento da fila?
Aqui chegamos a um ponto importante — mas muito, realmente muito mal visto e muito, muito pouco considerado atualmente: vou chamar esse ponto de “O Outro”. “O Outro”: essa entidade que, neste exato momento, por exemplo, está ao lado de cada um de vocês e também está bem aqui, no centro de toda beleza, lendo este discurso. Quem diria: logo eu, que quando criança sempre brincava sozinho.
Hoje, eu não estou sozinho. Quem me olha agora vê não um, mas muitos. Neste discurso, inclusive, há outras escritoras e outros escritores presentes. E eis o grande segredo que mantém as estrelas no céu, eis a unidade mítica de todas as coisas: nós não estamos sozinhos. Eu sou todos vocês. E todos vocês são eu. O coração de vocês bate pelo meu coração. Mas somos filhos da época e toda época é política. Essa é a verdadeira educação que devemos levar de agora em diante. Para entender isso, é preciso coragem, amigas e amigos. Afinal, a vida é coisa perigosa — é feita de escolhas, e escolher requer coragem.
Encerro este breve discurso agradecendo a todas e todos que participaram desta caminhada: cada professora e professor, homenageada ou não, famílias, amigas e amigos, que compartilharam momentos, alegrias e agonias. De uma coisa vocês podem ter certeza: somos gratos pelo que aprendemos e pelo que vivemos e saímos daqui prontos para seguir a boa luta. Obrigado.
Alexandre Bruno Tinelli
sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019
Episódio saturnino
Persuadido pelo insondável
Transponho o tédio matinal
E o espectro rastejante da labuta
Trava com a indolência sua luta;
Coagido pela ventura inescrutável
Reconheço o pendor bestial
Projetando múltiplas representações
No rascunho torto das imperfeições;
– Ainda respiro, digo em solilóquio
E o existir dura em seu imbróglio
Como a dor de um convalescente;
A consciência inflada de paradoxos
No irremediável niilismo – tóxico
Submerge em fluxo decrescente.
Cássio R. Alves da Silva
Cássio Robson Alves da Silva nascido em Fortaleza - CE, é doutorando em Filosofia pela Universidade Federal do Ceará, tem seus poemas publicados em algumas coletâneas e, gradativamente, está aperfeiçoando a técnica para fabricar caleidoscópios artesanais.
quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019
Boleto - Um quadrinho de Linhas Tremidas
Reno
Quadrinista e ilustrador, Reno aborda dramas e conflitos psicológicos em seus trabalhos, frequentemente fazendo uso da ironia e do bom humor.
segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019
Ainda por cima
todos
por baixo de suas carnes cálidas
maçãs coradas istmos
ajambrados peles adornadas
contêm os alicerces respectivos
de um esqueleto surrado e frágil
que em sua fria feiúra
sustenta todas as energias
líquidos e músculos
todos
nos subterrâneos de seus sorrisos
francos falas encadeadas firmes
apertos de mão
guardam dispersas dentaduras
resistentes cucas hesitantes
tremores controláveis
à espera do comando
convincente
sob cada mecha doirada e leve
paira a aridez de um couro
cabeludo pálido e reticente
no contraponto da retina ubíqua
a breve cegueira das manhãs mal
despertas
à revelia de cada nome cada
mãe cada manhã
o número incontável de
fragmentos de poeira estelar
na ausência de cada presença
incógnita certeza de vida
acima de cada corpo inteiro
um espírito anêmico pronto para
a qualquer momento
flanar
Clidevar Araujo
sexta-feira, 1 de fevereiro de 2019
Ulisses
Depois de tudo
deixo o teu leito
com tudo
o mais de óbvio:
molhado de suor,
com a face relaxada,
e uma ferida
encravada no dorso.
Deixo o teu leito
como quem
cumpriu uma promessa,
esperando o pão com manteiga
que chega com o cheiro do café
perpassado pela alvorada,
Deixo o teu leito
com a incerteza
de um retorno tranquilo
à minha Ítaca sonhada
— barco sem porto
faço de ti meu ancoradouro.
Deixo o teu leito
com um adeus
desacenado
de quem procura te
encontrar,
— após batalhas
contra troianos, ciclopes e
sirenes encantadas —
na próxima
dedirrósea manhã.
William Soares dos Santos
William Soares dos Santos (1972), é carioca, professor da UFRJ e escritor. Dentre os seus trabalhos literários se destacam o livro de contos Um Amor (2016) e os livros de poesias Rarefeito (2015), Raro - Poemas de Eros (2018) e Poemas da meia-noite (e do meio-dia), livro ganhador do Prêmio PEN Clube do Brasil para livros de poesias em 2018 e finalista do 3° Prêmio Rio de Literatura 2018.
Página do autor: http://williamsoaresdossantos.com.br/index.html
quarta-feira, 30 de janeiro de 2019
Zoometarquia
Chinelos vermelhos
Tramas na geladeira
Quinta da carne
Terça das verduras
Papai e mamãe perderam a posição
Há sangue nas gavetas
Quarta do frango
Sexta da cerveja
Há umbigos roçando desonestos
Cristina chora no quarto escuro
Ao lado da goteira, afirmando:
“O mundo perdeu-se por andar em círculos”
Domingo teatro
Segunda folga
Feriados, sacolas cheias de água
Chico empresta dinheiro para a esposa
Com juros abusivos
Há um frasco de remédio vazio
Pendurado como um guarda-chuva
Na hélice do helicóptero
Urubus são anjos que deram certo
Sábado
A colheita, a colheita, a colheita
Dias, sabores
Quinta da carne
Terça das verduras
Kama sutra além do livro de receitas para colorir
Ingredientes sem giz de cera
Carnes, verduras
Tramas na geladeira
Chinelos vermelhos
O palhaço do semáforo
Após deixar seu nariz de plástico cair
Embute:
“Contudo,
Com nada
Se perde tudo”
Eu deixei as moedas em casa hoje
Ramon Carlos
Ramon Carlos (Santa Catarina, 1986). Escreve no site: www.estrAbismo.net. Sua carreira literária resume-se a dois contos publicados em uma antologia, além de materiais diversos em revistas como: Mallarmargens, InComunidade, LiteraLivre, Subversa, Philos, Escambau, Bacanal, Ruído Manifesto, Literatura & Fechadura e Jornal Plástico Bolha.
segunda-feira, 28 de janeiro de 2019
Patifes e Sherifes
Que Deus abençoe a América!
Terra de patifes
e sherifes.
De Marlon Brando
a Omar Sharif.
Finalmente, quem impera
é a cultura da burrice.
O sonho americano
se transforma em um verdadeiro monstro
quando você acorda.
Você não!
Aqui não pode mais!
Obrigado por tudo,
mas não te devemos nada.
Hahahahahahahaha
Hahahahahahahaha
Desculpe pela risada.
Esqueci que não “hablas” a minha língua
e não consegue
entender a piada.
Márcio Kozlowski
sexta-feira, 25 de janeiro de 2019
Acontecido
Saudade tenho dos bons dias
em sua linha
vejo sorrisos e amigos.
Quanto a mim,
que penso em ti
admiro a imagem desses sorrisos
como se nada tivesse acontecido.
Olho para mim e vazio
minha linha
é um daqueles, imenso.
Quanto ao outro
que vai-se aos poucos
reconsidero, mas parece cinismo
como se nada tivesse.
E meu peito esfarela.
Não quero, mas me pulverizo…
E não adianta lutar,
eu vou somente fluir
como se nada.
Essa felicidade tão intensa
você vai explodir em luz
overdose de plenitude
em sua linha
como, se…
E passo adiante
só o necessário
como?
Geovani Gomes
quarta-feira, 23 de janeiro de 2019
Amazona
Teu corpo vagando nu pela mata intocada da minha alma.
Você, guerreira, imponente, potente. Grandeza e força.
Eu que não sou poeta, nem poetisa.
Sou poema, rima e verso.
Sou língua macia, certeira, inquieta.
Teu corpo suado revela as mensagens que a tua boca faminta insiste em engolir.
As pontas dos meus dedos fazem uma leitura exata do teu ser pelo avesso.
Avesso da tua profundidade molhada e morna, caminhos ora conhecidos, ora cenário escuro para que eu possa tatear, apertar, amassar, morder e me perder.
Sigo deslizando pelas plumas das tuas asas que me embalam, me tiram o ar e, então, me devolvem a vida.
Vida que se concentra nas gotas de suor instaladas nas dobras dos teus joelhos, na curva do teu pescoço e nas linhas perfeitas dos teus seios.
Andas nua pela mata banhada de sol da minha alma. Amazona, grandiosa e desenvolta, me guias para dentro do teu templo, enlaças meu corpo com tuas pernas velozes, me derretes e transformas minha fome em deusa que descansa no sagrado do meu ser. Ser este – que agora e há vidas – possuis na palma de tuas mãos.
1. Amazona S.f.(a) 1. Na mitologia grega, membro de uma tribo de mulheres caçadoras e guerreiras que teriam vivido na Europa oriental. 2.P.ext. Mulher alta e resoluta. de ânimo agressivo e varonil. 3. Mulher que pratica a equitação 4. Traje especial feminino, para montaria.
Mari Cê
segunda-feira, 21 de janeiro de 2019
sexta-feira, 18 de janeiro de 2019
Poema prosaico
Rasgada esta candura das palavras
sobeja-se o falso amargor reprimido.
Prévio conhecimento, tolo, em lavras,
puramente utopia costurada ao tecido.
A limitação do cérebro sem oxigênio
privado, então, teu principal sentido,
iludido, crendo num dom, feito gênio,
ignorando àquilo realmente contido.
Compondo meras anedotas rimadas
Nomeando-se poeta; repreendido!
Dessa eloquência vil de outrora, cada
dor ou vício terminou por esquecido.
Lucas Luiz
Lucas Luiz nasceu em Guararema - SP, em 1991. Iniciou publicando crônicas no “Jornal D’Guararema” e depois poemas no site de variedades “Guararema Tem”. Recentemente colaborou com as Revistas Literárias: Avessa, Inversos, LiteraLivre, Ser Esta e Mallarmargens. Participou da Antologia “Além do céu, além da terra” da Editora Chiado.
quarta-feira, 16 de janeiro de 2019
atacados os atabaques
sim, atacados os atabaques
certos timbres de couro proibidos
certos nomes de entidade
doces de Cosme e Damião
lá onde rasga insistente o motor da moto
e empinada a roda toca a lua
na madrugada de morros e encruzilhadas
e a luz azul neon na cruz da matriz
e no letreiro próximo do motel
e o pisca-pisca no manto da virgem
e seu rosto imaculado de manequim
alvo como o da modelo de peruca
na loja do outro lado da rua
um troféu de cimento e latão dourado
da altura de uma criança de dez anos
garrafas de cerveja derramando-se dentro
da copa, do grande cálice
a ser passado de lábio em lábio
mas primeiro nos do goleiro
que em seu salto de jaguatirica
afastou o último pênalti
garantindo o campeonato inédito
atual maior herói da galáxia
e no perímetro não há balde ou bacia
que já não tenha virado tambor
em contra-ataque indiscutível dos atabaques
e da música liberada dos terreiros.
Tomaz Amorim Izabel
Tomaz Amorim Izabel é doutor em Letras e poeta. Publicou recentemente "Plástico pluma", seu primeiro livro de poesia.
segunda-feira, 14 de janeiro de 2019
Homenzinho
O homem caminha lentamente. Seu tamanho chama a atenção. Melhor dizendo, não chama, pois quase não se nota. Ele não passa de centímetros. E mesmo assim é uma perfeita miniatura humana. Braços, pernas, tronco, cabeça, ombros, joelhos e pés, tudo bem formado.
Sua origem é um tanto desconhecida. Nascera daquele tamanho ou encolhera? O certo é que estando nessa condição de homenzinho, muitas dificuldades ele enfrenta. Complicações essas que fazem parte já do seu cotidiano de desprezo e insignificância.
Mora numa pensão. Conseguiu nela uma vaga. Mas ali ninguém interage com ele, ninguém conversa com ele, em suma, ninguém o nota. Muitas foram as suas tentativas de fazer amizade. Entretanto, não obtivera sucesso. Sempre que puxava ou se lançava pela roupa de algum morador dali, logo o expulsavam. Era confundido com mosquitos, com insetos. Será que nunca ouviam o seu clamor?
Quando sai às ruas não é diferente. É como se ele fosse invisível. Em lojas não pode entrar, pois não haverá quem o atenda, não conseguirá comprar qualquer produto que seja. As prateleiras são altas, tudo é muito grande e pesado quando se tem poucos centímetros. É difícil sua locomoção, seu andar, sua vida é difícil. Nada é para ele adaptado. Não há cama de centímetros, não há chuveiro em miniatura, não existem sequer roupas que satisfaçam seu tamanho.
Apesar de tudo isso, ele não cansa de buscar uma utilidade. Sim, porque ele poderia muito bem passar horas, dias, meses, sem nada fazer e ninguém notaria. Mas em seus momentos reflexivos, ele se inquieta e examina em que pode ser útil. Certamente, em pequenas coisas, pois em grandes falharia, sequer conseguiria. O homem junta pequenos papéis deixados pelo chão, estica tapetes chutados, dentre outros feitos.
Aguardam na pensão a chegada dum novo morador. Haviam preparado um quarto para a ocasião. O homem, vendo naquilo oportunidade duma possível amizade, planeja como se aproximar do novo hóspede. Já sabe. Ficará em cima da cama. E o incomodará, caso o desavisado deite ou sente sobre ele. Depois disso, se apresentará, contará sua história. E serão amigos.
Assim acontece. O novo morador ao chegar no quarto, não demora a depositar o corpo na cama. Ali está ele, muito pequeno, muito ínfimo. Baterá nele até que o hóspede recém chegado o note. Ao sentir um incômodo em seu pé, o morador inexperiente se aproxima dele.
– Mas o que é isso? – assusta-se.
– Ah... Oi! Oi! Meu nome é...
– O que está fazendo aí? – interrompe o outro.
– Bom, eu moro aqui.
– Aqui? Como?
– Cheguei aqui, fui ficando, ficando.
Conversam muito. O novo hóspede ao ganhar proximidade, coloca o homem sobre seu peito. Ele por sua vez, por ali caminha, desviando-se dos pelos. Na presença dele, procura demonstrar sempre satisfação. Não quer desagradar o quase amigo. Relatado o drama, ele tinha conseguido o que queria. Pelo menos alguém, única pessoa que fosse, havia dado atenção para ele. Havia-lhe escutado a história de desprezo e insignificância.
Agora eram bons companheiros. Ele resolve mudar-se para o quarto do amigo, que por sua vez havia adaptado alguns objetos para seu uso. Agora, com a permanência de bancos que serviam de escalada até a pia, o banho estava fácil. Girava a torneira e se refrescava nas águas. Depois descia e se vestia, podendo escolher entre calças e blusas, costuradas à mão por seu gentil amigo.
Rara é a vez que seu mais novo amigo o nega conversa. De vez em quando, é tratado como sempre. Nem mesmo o seu companheiro de quarto o reconhece. Desprezo ele até entenderia, o que não suporta é ser confundido com pernilongos ou coisa do tipo. Como poderiam fazer aquilo? E faziam muito. Ao menor sinal dele puxando a calça ou blusa de alguém, ou mesmo tocando braços ou pernas, recebia bem perto uma palma de mão ou dedos que escorriam sobre onde estava. Obrigava-se então imediatamente a desviar-se, indo para outras superfícies, outros corpos.
Quando saem para passear, é colocado no bolso. Aí, quando o amigo quer mostrar-lhe algo, retira-o cuidadosamente e coloca-o em sua grande mão. Satisfeito como criança, valorizado como um homem, só volta à tristeza quando precisa regressar ao bolso. Mas essa é uma condição quase necessária para que ele veja o mundo de outro ângulo. Ora, afinal não custa muito aguardar dentro de tecido sombrio, o momento de ver a luz do sol, o movimento da gente, tudo isso numa boa altura.
O seu parceiro de aventuras, decide apresentá-lo aos demais moradores da pensão. Mas não o avisa de nada. Num habitual jantar, após levar-lhe várias vezes, grãos de arroz e pequenos pedaços de carne até a boca, fazendo repetidos e discretos movimentos entre seu prato e seu bolso, chega a hora.
– Quero apresentar pra vocês o meu amigo – diz retirando o homem do bolso.
Todos olham com admiração.
– Ele mora aqui há muito tempo – aponta para a mesa.
O homem que agora está sentado na borda da tigela de feijão, fica todo sem jeito e não consegue dizer palavra. Transtornado com tantos olhares, cresce ligeiramente.
Dum instante para outro, surge na mesa um homenzarrão de quase dois metros.
Felipe Feijão
Formado em Filosofia. Blogueiro em portal de notícias. Escreve para jornais de Fortaleza.
sexta-feira, 11 de janeiro de 2019
Amazonidas
Somos filhas da ribanceira
Netas de velhas benzedeiras,
Deusas da mata molhada,
Temos no urucum a pele encarnada,
Lavando roupa no rio, lavadeiras,
No corpo o gigado de carimbozeiras,
Temos a força da onça pintada,
Lutamos pela aldeia amada,
Mas, viver na cidade não tira o direito de ser
Nação, ancestralidade, sabedoria, cultura,
Somos filhas de Nhanderú, Senerú, Nhandecy
O Brasil começou bem aqui...
Não nos sentimos aculturadas,
Temos a memória acesa,
E vivemos na certeza de que nossa aldeia
Resistirá sempre ao preconceito do invasor,
Somos a voz que ecoa. Resistência? Sim senhor!
Marcia Wayna Kambeba
quarta-feira, 9 de janeiro de 2019
Índia Makusi
Escorro diamantes imprecisos
Do leito da trilha.
Lágrimas índias da tribo Makusi
Minha cintura vale mais!
Makunaima passou pelo meu ventre
Fez morada ali
Subiu a Serra Grande e ventou a Cruviana
Assustou seus irmãos que tinham inveja
De sua pele castanha
Mas não esqueceu que seu azul se confunde com o olhar de outro céu,
Que seu Branco são areias de outro rio
Ensinei que são meus cabelos que enegrecem a noite
Embalam o sono da rede do curumim
Deixei que brincasse com meus colares
Ao longo da Ponte Laranja
Do céu é mais bonito o espetáculo dos homens
Na terra de Makunaima
Sou índia Makusi
Sou filha e mãe de Roraima.
Sony Ferseck
segunda-feira, 7 de janeiro de 2019
Presépio
Começaram a cavar um precipício entre nós
[mais do que nunca o wifi cria ilhas no lugar de redes]
e o buraco é alimentado agora por nossas próprias mãos
se servindo de memes e de “lacração”
Urge ri da desgraça
saber tudo é imperatório
ser inteligente e engraçado soa mais curtível
do que abrir a cortina
do que combater a confusão
Cada qual do seu lado do precipício
dá ao mundo uma mostra
do quão eficaz é manusear o medo
o desamparo, a afetação
Viva o mal entendido!
Alucinação acima de tudo!
Não importa o quanto isso custe
é vital o gozo da presunção
Das mãos e bocas cheias de goiabas
[e laranjas]
as respostas já vem prontas
Control C - Control C - Control C
Tudo está sob controle – indicam em gestos e sinais
enquanto esbanjam sorrisos e cochicham:
“eles já não enxergam as pautas, não escreverão nada mais”
e gritam aos quatro cantos
[e contas e contos]
que serão visíveis as imprescindíveis mudanças
Nesse grande acordo nacional
nossas ilhas e mínimos salários e barulhos
[curtida não se mede em hertz ou decibéis]
casam bem com os máximos privilégios dos que circulam no tribunal
julgando quem merece e quem não merece
ser cidadão de bem ou do mal
Renata Rosa
sábado, 5 de janeiro de 2019
Klimt Kat - Karenina Marzulo
Klimt Kat é uma das vinte obras expostas em ILUSTRADORAS! - Exposição Coletiva, que estará na Galeria SESC Engenho de Dentro até o dia 25 de janeiro de 2019. Essa exposição, elaborada pela iniciativa Do Feminino na Arte, traz ilustrações com temáticas e técnicas variadas para que a visão particular de cada ilustradora possa ser evidenciada sem imposições aos seus processos criativos.
Período da Exposição
25/10/2018 - 25/01/2019
Horário de Funcionamento
Ter a Sex – 09h a 21h
Sáb e dom – 09h a 18h
Faixa Etária: Livre
Entrada: Gratuita
sexta-feira, 4 de janeiro de 2019
armadilha
armadilha da noite de natal,
sob o signo de destilados anônimos, diz adeus e morre de delicadeza.
essa noite o céu parece uma
piscina vazia, pontilhada por estrelas de streptomyces.
a tevê acentua essa ausência,
cospe um crime com vodka na minha cara, me leva pra perto de portas intocadas.
Ígor M.
Ígor M. tem o ensino fundamental incompleto, trabalha em uma fábrica de ferramentas, corta o próprio cabelo e tem um gato chamado Ubu Rei.
Prêmio MTD de Fotografia
O Prêmio MTD de Fotografia: Walter Firmo é uma iniciativa pioneira cuja essência é a valorização do “olhar”, a difusão da arte fotográfica e o incentivo a todos os amantes da fotografia, de toda a cidade do Rio de janeiro, por meio de um concurso que premiará os vencedores em uma inédita Cerimônia de Premiação e Mostra fotográfica na Zona Oeste do município, em Santa Cruz, no Casarão Imperial Palacete Princesa Isabel que abriga o Ecomuseu de Santa Cruz.
Para mais informações, acesse:
sábado, 29 de dezembro de 2018
O Galo gago - Clara Gavilan
O Galo gago é uma das vinte obras expostas em ILUSTRADORAS! - Exposição Coletiva, que estará na Galeria SESC Engenho de Dentro até o dia 25 de janeiro de 2019. Essa exposição, elaborada pela iniciativa Do Feminino na Arte, traz ilustrações com temáticas e técnicas variadas para que a visão particular de cada ilustradora possa ser evidenciada sem imposições aos seus processos criativos.
Período da Exposição
25/10/2018 - 25/01/2019
Horário de Funcionamento
Ter a Sex – 09h a 21h
Sáb e dom – 09h a 18h
Faixa Etária: Livre
Entrada: Gratuita
quarta-feira, 26 de dezembro de 2018
Exposição "Arruar Tapacurá", de Joana Passi
“ARRUAR é sentir a cidade. Evocar seu passado, partilhar do seu presente, sonhar com o seu futuro. Conhecer e recordar. Pisar e querer adivinhar os que pisaram. Ser ao mesmo tempo a geração de agora e as gerações de outrora. Regalo dos olhos e entendimento dos espíritos.” (Mario Sette)
“ARRUAR TAPACURÁ”, a ser realizada na Torre Malakoff, é uma exposição dos trabalhos de Joana Passi, com data de abertura para o público no dia 04 de janeiro. A artista ocupará as 6 salas do centro cultural com trabalhos resultantes de uma pesquisa sobre Tapacurá – antiga região de São Bento, onde atualmente é localizada a Reserva Ecológica de Tapacurá e a Barragem de Tapacurá, situada a poucos quilômetros do Recife e protagonista do maior boato que entrou para a história da cidade – “Tapacurá Estourou".
A exposição apresentará videos, desenhos, mapas, pinturas e instalações: trabalhos que surgiram do esforço da artista em vislumbrar a paisagem submersa, lembranças e narrativas sobre Tapacurá.
A parceria com a Torre Malakoff teve início em julho, com uma ação na data em que o boato completou 43 anos. No dia 21 de julho de 2018, a artista realizou uma espécie de “monumento efêmero” e percorreu as ruas da cidade do Recife com um carro de som relembrando o grito que correu as ruas em 1975.
A ocupação na Torre Malakoff ocorrerá durante todo o mês de dezembro, com a montagem de um laboratório no espaço do centro cultural para distribuir seus trabalhos nas salas de exposição. A artista realizará, também, um encontro com estudantes e professores da rede de ensino da Secretaria de Educação do Estado para realizar trabalhos sobre memória e histórias locais.
Sobre a arista:
Joana Passi é artista plástica e seu trabalho consiste em investigações realizadas no ateliê, sobre histórias e paisagens. Suas ferramentas investigativas são de diferentes mídias, como pintura, desenho, vídeo e escultura. Formada em Belas Artes da Universidade Federal do Rio de Janeiro, atualmente é doutoranda do departamento de Literatura da PUC-Rio. Atua como professora de desenho e artes visuais, já lecionou na UFRJ e ocupou o cargo de arte-educadora do Instituto Moreira Salles. Desenvolveu trabalhos em cinema e teatro, onde obteve premiação como cenógrafa e foi indicada a prêmios como figurinista.
A curadoria da exposição é de Juliana de Moraes.
Co-criações artísticas:
Os videos que fazem parte da exposição contam com a fotografia de Bento Marzo, a criação musical de Jam da Silva, e sound-design de Gian Ciminelli, gravados no estúdio da Áudio Rebel.
ABERTURA:
04 de janeiro de 2019 às 19 horas
SERVIÇO:
Local: Torre Malakoff - Praça do Arsenal, s/n - Recife, PE.
Visitação: 04 de janeiro à 28 de fevereiro de 2019
Horários: terça a sexta, de 10h às 17h; sábado, de 15h às 18h; domingo, de 15h às 19h30
Narciso
Cinéreo Gris
Cinéreo Gris é Bruno Oliveira Fernandes: formado em Letras pela UERJ; músico licenciado; skatista aposentado; escritor não publicado; poeta por necessidade da alma; professor por necessidade do corpo. Ele é, também e principalmente, marido devotado; pai apaixonado; esquerdopata congênito e crônico; punk rocker que sofre da síndrome de Peter Pan e vive a crise da meia-idade.
sábado, 22 de dezembro de 2018
Deixar para trás - Márcia Monteiro
Deixar para trás é uma das vinte obras expostas em ILUSTRADORAS! - Exposição Coletiva, que estará na Galeria SESC Engenho de Dentro até o dia 25 de janeiro de 2019. Essa exposição, elaborada pela iniciativa Do Feminino na Arte, traz ilustrações com temáticas e técnicas variadas para que a visão particular de cada ilustradora possa ser evidenciada sem imposições aos seus processos criativos.
Período da Exposição
25/10/2018 - 25/01/2019
Horário de Funcionamento
Ter a Sex – 09h a 21h
Sáb e dom – 09h a 18h
Faixa Etária: Livre
Entrada: Gratuita
sexta-feira, 21 de dezembro de 2018
Achados & Escritos 1
Na medida do impossível ela caminhava entre os escombros de sua sanidade.
Aos tropeços se equilibrava em devaneios para não se perder na realidade que a consumia.
Os dias já não eram suficientes para preencher o vazio que transbordava de suas vestes.
Esquecer tornou-se uma necessidade que a afligia a cada estalar de suas memórias.
Ricardo Dantas
Artista sonoro e visual, participa do Coletivo inTRANSEgente! – “Hibridismo das Artes” (poesia, microconto, nanoconto, vídeo poema, intervenção sonora, etc). Aluno do Curso de Música da Universidade Estadual de Londrina integra os Projetos de Pesquisa e Extensão “Botequim de Música Contemporânea” com um projeto de Iniciação Científica sobre Instalação Sonora. Participa também do Grupo Armila, pertencente ao CLIC (Coletivo de Livre Improvisação Contemporânea).
quarta-feira, 19 de dezembro de 2018
karma sutra
uma estranha sensação
de que já vi este cu.
ou de outra encarnação,
ou é mero deja vu.
Vinni Corrêa
segunda-feira, 17 de dezembro de 2018
Korean Woman #3 Hanbok - Helena Carneiro
Korean Woman #3 Hanbok é uma das vinte obras expostas em ILUSTRADORAS! - Exposição Coletiva, que estará na Galeria SESC Engenho de Dentro até o dia 25 de janeiro de 2019. Essa exposição, elaborada pela iniciativa Do Feminino na Arte, traz ilustrações com temáticas e técnicas variadas para que a visão particular de cada ilustradora possa ser evidenciada sem imposições aos seus processos criativos.
Período da Exposição
25/10/2018 - 25/01/2019
Horário de Funcionamento
Ter a Sex – 09h a 21h
Sáb e dom – 09h a 18h
Faixa Etária: Livre
Entrada: Gratuita
Incandescente
Corpos nus, sua chama ereta; nós fundimos e nossas retinas se aliaram.
Nossos gemidos deram um tom desconcertante, a madrugada fria e aparentemente silenciosa.
Banhados e emaranhados em suor, nos tornamos unos e nos flagramos sorridentes...
Diante do gozo – passado e futuro viraram borrões e o presente resplandeceu.
Rosa Maria
sexta-feira, 14 de dezembro de 2018
Dèjá vu
A Bahia da minha lembrança,
onde me banho
desde o princípio,
corre por ladeiras à boca do céu,
escapa,
mas não passa de mim.
À distância,
no encalço da imagem indefinida,
ganha a forma de um
desejo íntimo.
Alcança meu tamanho,
de mim não passa,
bate no teto dos
meus (quase) trinta anos.
Trago seu canto sem saber palavra.
O saber das ruas e das coisas,
de olhá-las
e guardá-las. Onde mais
o esquecimento, mais o amor,
não palavra,
irrompe de um gesto,
que é todo o movimento,
das folhas aos pássaros,
de perder e achar e
querer e não falar.
Tem essa Bahia o viço
da pele ingênua debaixo da barba,
donde brota já
o primeiro fio de cabelo branco.
Terra sempre nova
que por algum feitiço
hesito pisar.
Põe-se a meio caminho, noutro plano.
Bahia que é minha e
dos baianos.
Daniel Marones
Daniel Marones tem 35 anos, nasceu e mora no Rio de Janeiro, e já leu seus poemas em alguns saraus, apesar de nunca tê-los publicado.
quinta-feira, 13 de dezembro de 2018
quarta-feira, 12 de dezembro de 2018
Granada
Da mancha no olho casto
Do prurido na pele branca
Dos calos relevantes no pé 33
Das paisagens que sobram na cama
Leio Azevedo por 3,99
O primeiro livro vendido no bazar
Segundo a caixa
Pedido de ordem nas cruzadas
Não sei a capital do Líbano
Sugiro Lindóia do Sul
Muita letra
“Não sei”, por fim, nos une
Uníssonos
Tocamos cabelos e formigas
Nas paredes mofadas
Nos panos de pia
No pacote de lixo
Na folhagem que atrai abelhas
Nas folhagens que nos une
Que regamos com suco de limão
E adubamos com erva molhada
Assim sentamos à margem
Das tristes notícias do erro comum
Das traças viciadas em naftalina
Dos equívocos das tesouras com ponta
Do nome no lápis sem ponta
Da taça trincada por um erro comum
Dos beijos si-lá-bi-cos
Voltamos a caminhar
Torcemos nossos corpos
Na quina do sofá
Na porta do box
Achamos engraçado esse porte de arma
Quebramos, esparramamos
Os cacos da porcelana verde por dentro
Vamos embora, vamos embora
Nosso chão tem carvão em brasa
Nossos símbolos vestem chapéu
Nossa ternura usa bigode
Nossas extravagâncias estão no sótão
Deixo a toalha de banho marcada de cera
Uso dois pingos de gel
Repito a cueca
Corto as unhas dentro do cinzeiro (um pote de metal para presente)
Cheio de ilustrações geométricas
Mas saem voando, capazes de orbitar
Vamos embora, vamos embora
Ela deixa rastros de primavera pela casa
Ela queima como um verão bêbado
Ela é outono quando sonha e inverno quando chora
Suas toalhas de banho têm cheiro de pêssego
Seus cigarros ardem como incenso
Damos nomes aos insetos que respiram pela boca
Das patrulhas pelas travessas
Do mendigo que fala chinês e mendiga em espanhol
Da noite que embrulha a ópera
Dos centímetros que separam metros
Do último furo no cinto
O álibi como um simples não
À margem, à margem
De um confuso ato
Os espelhos podem marinar
A recompensa que nunca acaba
Ela já está dormindo
Minha lira de 29 anos
Ramon Carlos
Ramon Carlos (Santa Catarina, 1986). Escreve no site: www.estrAbismo.net. Sua carreira literária resume-se a dois contos publicados em uma antologia, além de materiais diversos em revistas como: Inutensílio, LiteraLivre, Subversa, Philos, Escambau, Bacanal, Ruído Manifesto, Literatura & Fechadura e Jornal Plástico Bolha.
segunda-feira, 10 de dezembro de 2018
Plástico Bolha no evento Edição comentada: estudos sobre o livro
No dia 12 de dezembro, quarta-feira, João Moura Fernandes, membro da equipe do Plástio Bolha, estará no evento do Selb falando sobre edição de poesia.
Para mais informações, clique aqui.
Figurando um planeta
Houve um tempo em que tudo era mais simples e plano. Até o planeta era plano. Um mundo do tipo match column A and column B:
(1) céu ( 1 ) conecta duas unidades em uma oração
(2) da ( 3 ) para muitos, representa onde tudo começa e onde muita coisa termina
(3) boca ( 2 ) frequentemente aparece em caso de posse inerente
Nesse mundo, correspondências eram óbvias. Os nomes dados às coisas eram seus nomes certos, e era possível dizer por meio da palavra o que era e o que não era. Quanto às orações, não a todas cabia um julgamento entre verdadeira ou falsa: às orações, por exemplo, não cabia. Assim, os habitantes desse mundo não eram deixados cair na tentação de misturar da linguagem suas parcelas racional e poética; amém.
É importante (?) declarar qual seria a parcela racional e qual seria a poética, porque, estando em outro mundo hoje, pode ser que não tenhamos esses aspectos tão evidentes – não sei bem se algum dia alguém os teve de fato, mas sei que acreditavam ter. À parcela poética correspondem todos os usos metafóricos da linguagem: os usos escorregadios, bêbados, incertos, deslizantes. Um óbvio exemplo desses casos seria “Aqui minha nave se deteve”. Não pelo uso hoje bastante estranho da palavra nave (não significando uma nave espacial, mas sim um navio), ou por dizer que a própria nave se deteve, quando ela certamente foi detida por alguém, mas pura e simplesmente pelo uso do verbo deter-se. Sabemos, é claro, como falantes da língua, que deter-se é um termo genérico, e que a este caso melhor caberia o uso específico. Não sabemos? “Aqui minha nave ancorou” seria a forma literal de dizer tal frase; o fato de a nave ser personificada nesse caso deve ser, tal qual a resistência do ar, desprezado.
A outra parcela de linguagem, aquela que é racional, opera de modo diferente. Ela é simples, direta, e pode sempre ser julgada em verdadeiro ou falso. “Michel Temer exerce seu poder de modo ilegítimo”. Essa é uma declaração, puramente racional, suscetível a julgamentos subjetivos, desprendida de qualquer termo figurativo. Diferente de quando se diz que “Michel Temer, tal como um vampiro, suga nosso sangue”. Apesar de me parecer que essa também pode ser julgada como verdade, analogamente à primeira. Mas vai saber. Se são padrões tão bem delimitados e indiscutíveis, melhor não ficar procurando chifre em cabeça de cavalo.
Reasseguro aos leitores a certeza que esse mundo trazia de que as metáforas da linguagem são o simples transporte de nomes de uma coisa para outra. Claro, inteiramente controlado e regrado. O fato de a palavra “transporte” aqui ser usada também personificada e fora da sua forma mais tradicional e literal deve novamente ser descartado pelos leitores, mais perspicazes e atentos do que desejamos para o momento. Por enquanto fiquemos agarrados à impressão de que falas figuradas são erros em meio a um sem-número de absurdos, insinuadoras de ideias erradas e consumadas fraudes. Fora do meio poético, só servem para enganar e persuadir. Que nem os sofistas.
Mas eis que um dia o mundo arredondou. As pessoas também. Os entendimentos também. A linguagem também. Assim, ficava difícil definir tudo em termos diametralmente opostos, porque nada parecia ter só dois lados, como são as coisas planas. Ingenuidades precisaram sair de cena para dar lugar a dúvidas. E como dúvidas não têm valor em lugar nenhum, as explicações precisaram passar a ser tantas quantas pudessem ser as ocorrências. Precisamos das caixas. De muitas caixas. Nos munimos de um arsenal de caixas para fazer tudo caber e ser devidamente categorizado. Nunca esperamos nos deixar soterrar pelo excesso de possibilidades, nunca esperamos não estar num ponto alto o suficiente para recortar a onda e observar seu único movimento. (O leitor atento pode aqui observar que a ingenuidade nunca nos deixou inteiramente.)
A língua também foi vítima das caixas. A parcela racional foi lacrada e uma etiqueta que dizia GRAMÁTICA NORMATIVA foi colada bem na sua frente. Suas possibilidades de movimento foram lançadas ao mar aberto (e Palomar nem viu). Lá dentro dessa caixa, vários compartimentos foram colocados para delimitar bem o funcionamento de cada uma das partes. Tolinhos, nem viram que os conteúdos se liquefaziam e passavam por entre os compartimentos com muita facilidade. Os que não
se deram conta disso em momento algum seguiram firmes, acreditando terem resolvido todos os problemas da linguagem racional, sóbria e orientada, e partiram para a outra parcela.
A parcela poética, figurativa, periférica da linguagem também foi encaixotada. Na caixa, um papel que dizia METÁFORAS já vinha de fábrica colado. Consideravam que elas fossem um gênero do qual todas as ocorrências seriam apenas espécies; o guarda-chuva sobre o qual todas as emissões bêbadas se abrigavam. Depois parece que repensaram, encontraram mais umas classes que mereciam se juntar ao gênero, e mudaram para um nome mais genérico: FIGURAS DE LINGUAGEM. Diz-se também que no estágio inicial da caixa, não sentiram necessidade de colocar compartimentos, mas
depois viram que podia ser melhor ter lá um ou outro. Traçaram a princípio três: metáfora, metonímia e sinédoque.
Depois disso, parece que perderam o senso. Tudo desandou. Saíram dividindo e redividindo, e então dividindo uma vez mais para tentar abrigar caso a caso com a maior distinção e o maior detalhamento possível. Explodiram não sei quantas definições, e nunca deixam de surgir mais. Lembro-me que certa vez, pelos treze anos, dediquei dias ao esforço de redigir um resumo de toda a matéria do ano. Constavam lá as famigeradas. Eram, à época, onze: comparação ou símile (quem diria que comparar duas coisas era na verdade um recurso estilístico decorativo); metáfora; prosopopeia ou personificação; hipérbole; eufemismo; disfemismo; antítese; ironia; sinestesia; metonímia; antonomásia. A maioria delas era facilmente percebida em discursos correntes do dia a dia, portanto foi curioso perceber que seriam assunto de prova e tema de aprofundado estudo nos anos escolares.
Quando concluí que até tinha certo sentido debruçar algum olhar cuidadoso sobre esses fenômenos esquisitos, descobri que tinham mais casos: paradoxo; anáfora; pleonasmo; coisificação ou reificação. E mais: aliteração; pleonasmo sintático. E mais: silepse, catacrese, elipse, zeugma, quiasma. E hipérbato apóstrofe gradação assonância paronomásia onomatopeia polissíndeto assíndeto anacoluto perífrase e por aí vai aparentemente sem poder nem parar para respirar. Pausa.
Ouvi quinhentas vezes e disse aqui quinhentas e uma (hipérbole; zeugma) que as figuras de linguagem pertencem à parcela da linguagem poética. Ornamental. Figurativa. Decorativa. Talvez os habitantes do mundo plano olhassem hoje para o que fazemos com as metáforas e as enxergassem como golpistas que se apropriam de um lugar da linguagem a que não deveriam pertencer. Diriam: Não é certo que não encontremos outro nome para dizer pé da mesa ou céu da boca ou braço da cadeira sem que pareçamos ridiculamente desconectados da nossa própria língua. Não é certo que não encontremos força nas expressões literais para comunicar o que desejamos. Não é certo que não vejamos saída e forma de estar na língua que não envolva esta parcela que antes julgavam tão descartável. Não é certo que o inútil, recusável e imperfeito canto a que relegamos as figuras se misture e de repente seja tão racional quanto o campo racional.
Há algo que parece muito engraçado, curioso ou patético da parte dos que legislam sobre a língua (e aqui digo dos que de fato legislam, não de uma possível analogia com certo tear de que certa vez ouvi falar). Eles seguem buscando o estrito caroço de um conceito. Já existe uma palavra para falar sobre casos em que designamos a um ser um outro nome próprio para que se o reconheça, por exemplo. Não digo por isto chamar Montecchio de Capuleto; digo chamar Pelé de Rei do Futebol, chamar Rio de Janeiro de Cidade Maravilhosa. Mas alguém um dia achou que era bagunça colocar pessoas e tropos sobre a mesma classificação, e bipartiu: perífrase e antonomásia. Fez assim também para elipse e zeugma; metáfora, metonímia e sinédoque; e um bocado de outras variantes. Aliás, parece que fez assim para tudo. Explodiu em pormenores aquilo que nenhuma divisão ultradetalhada será capaz de encerrar.
Vazam. Vagam. Vagueiam. Esvaziam. Escorrem por entre os dedos as línguas os ares as mentes sem que sequer nos demos conta. Não damos conta. Nada dá conta. Talvez tentemos controlar a língua quando na verdade ela nos controla. Talvez tentemos chamar de metáfora uma parcela da língua quando ela é o todo e mais um pouco. Talvez pensemos no substitutivo em lugar de aditivo. Vai saber. Não sei. Concluo nada e penso muito. Deixo aqui em suspense o suspense de lidar com a linguagem figurada que talvez melhor seria dita linguagem protagonizada. Vai saber.
Caramba! Já agora, indo embora, me dei conta de uma falta gravíssima! Desculpe, leitor. Sabe o que é? Não me curei dessa doença de ser artista. Isso faz mal, a gente acaba imitando um pouco as coisas do mundo real sem nem perceber. É por isso que acabei copiando aqui uma frase ou outra de Platão, Aristóteles, Locke, Hobbes, Calvino, Eco, Helena Martins. Seria uma pena se eu ficasse de fora da República por um deslize desses... Mas, afinal, quem no Brasil hoje não está?
Yasmin Barros
sábado, 8 de dezembro de 2018
Corpo de Carne sobre um Corpo de Água - Lari Arantes
Corpo de Carne sobre um Corpo de Água é uma das vinte obras expostas em ILUSTRADORAS! - Exposição Coletiva, que estará na Galeria SESC Engenho de Dentro até o dia 25 de janeiro de 2019. Essa exposição, elaborada pela iniciativa Do Feminino na Arte, traz ilustrações com temáticas e técnicas variadas para que a visão particular de cada ilustradora possa ser evidenciada sem imposições aos seus processos criativos.
Período da Exposição
25/10/2018 - 25/01/2019
Horário de Funcionamento
Ter a Sex – 09h a 21h
Sáb e dom – 09h a 18h
Faixa Etária: Livre
Entrada: Gratuita
Edição comentada: estudos sobre o livro
Desde a sua inauguração, em março de 2016, o Laboratório de Publicações Lima Barreto vem trabalhando ativamente na difusão das práticas editoriais no Instituto de Letras (ILE) da Uerj. Mantendo-nos sempre alinhados à missão de fomentar, produzir e editar projetos acadêmicos e literários, exercemos nossas atividades com o objetivo de oferecer capacitação teórica e prática aos estudantes de Letras e de áreas afins para a atuação no setor editorial.
Em 2016, numa tentativa de atender ao interesse dos estudantes do ILE e de trazer de volta a uma Uerj em crítica greve alunos, professores, técnicos, estudos, discussões, produções, realizamos o ciclo de debates Mercado editorial: inserção, atuação e análise, um evento-teste, experimental em muitos aspectos. Neste ano, retornamos com um evento repensado, reestruturado, renomeado, o ciclo Edição comentada: estudos sobre o livro.
10 a 14 dezembro, manhã, tarde e noite
Universidade do Estado do Rio de Janeiro
Campus Francisco Negrão de Lima (Maracanã)
Rua São Francisco Xavier, 524
Maracanã – Rio de Janeiro, RJ – 20550-900
Para mais informações, clique aqui.
sexta-feira, 7 de dezembro de 2018
Jardins
Quando no outono das tardes sombrias,
Entre a caligem, nos gráceis abrigos,
Eu me recordo dos tempos antigos
De auras divinas, porém, fugidias...
Pelas soturnas ruelas esguias,
Na soledade dos ternos jazigos,
Jogo-me sobre os relvedos pascigos,
Molho teu leito de lágrimas frias...
Neste semoto moimento das dores,
Onde adormecem os nossos amores,
Desta fulgente e fugaz mocidade...
Ali, me perco e me encontro, em meus sonhos,
Na realidade dos tempos medonhos,
Nestes soturnos jardins da saudade...
Sérgio Márcio
segunda-feira, 3 de dezembro de 2018
O torneio
Foi na esquina da Marnoco e Sousa com a Dr. Júlio Henriques, no Bar do Borges. O ano, penso que 2015. Era a final do campeonato de sinuca e o pequeno estabelecimento mal suportava a quantidade de estudantes que se apinhava ali, uns em cima dos outros, ao redor da mesa. O barulho intenso de risos, gritos e choque de copos invadia a rua silenciosa, às duas da manhã, e ecoava por pelo menos dois quarteirões acima, subindo na direção do Penedo. Quem entrasse por último não acharia possível dar um passo a mais em meio aos corpos que se apertavam, mas no final, sempre cabia mais um. Uma vasta e densa fumaça de cigarros se acumulara no teto, dando ares de neblina às fracas luzes da casa. Todo ano seu Borges colocava os móveis nos cantos e trazia a mesa que jazia sob o pó da garagem. As bolas, de tão velhas, perdiam a tinta, e a branca tinha traços pretos e indeléveis que algum inconsequente havia desenhado.
Durava cada vez mais aquela confusão, porque todo ano aumentava o número de participantes. Havia estudantes, professores e funcionários da Universidade de Coimbra tentando a sorte. Neste ano cinco finais de semana foram necessários para se chegar aos dois últimos contendores. Arthur, detentor do título, graduando de História, jogava com os incentivos da namorada, a francesa Delphine, que com a cabeça cheia de imperiais consumidos ao longo de pelo menos cinco horas, soltava, vez por outra, palavrões em sua língua pátria, logo encobertos por uma saraivada de impropérios lusitanos. Jorge, quarto ano de Medicina, argentino alto como um tronco de árvore, nunca participara de uma final, mas tinha naquele ano eliminado com extrema eficiência todos os seus adversários, que não foram poucos, diga-se de passagem. Ao contrário do seu oponente, que começava a ficar um tanto vermelho por conta das taças de vinho consumindo ao longo do torneio, Jorge não ingeria álcool. Em compensação fumava um cigarro atrás do outro.
A excitação era intensa. A partida ganhara ares de final de copa do mundo. Delphine, namorada de Arthur, de postura selvagem por trás dos olhos pequenos e pretos, explodia a aproximadamente cada vinte minutos, para reclamar dos cigarros: Mais arretez cette fumée de merde, connards!, ao que se seguia um murmúrio incompreensível de expressões confusas, oooooeeeoopáááá, ôôôôconarda é tu, ó parva! – e a fumaceira continuava. A gritaria só se suspendia um pouco em duas ocasiões: quando chegava uma nova rodada de cerveja, que Maria trazia a muito custo equilibrando a bandeja acima da cabeça, sob as orientações já não tão seguras do velho Borges, bêbado, os cotovelos no balcão, a observar a partida com seus olhos turvos; ou quando um dos competidores se preparava para dar sua tacada. Era um instante de silêncio, como se estivessem todos na quadra de Roland Garros, só entrecortado pelas vozes da francesa, que nesse instante encontrava sempre o que dizer, ainda que ninguém a compreendesse. Depois tudo voltava ao normal, as mesmas vozes altas, o tilintar dos copos, os gritos e conversas intermináveis, a variação nos valores das apostas sendo lançadas aos gritos de uma ponta a outra do bar, com o Pedro, um sujeito de óculos embaçados pelo suor que se mantinha em pé em cima de uma mesa, a anotar no seu caderninho o aumento ou a redução de euros envolvidos na jogatina.
A partida estava difícil para Jorge. Nunca chegara tão longe no torneio e aquela euforia mexia um pouco com seus nervos. Começou sendo praticamente massacrado, o adversário distanciando-se com segurança na pontuação. Depois, da metade da partida em diante, Arthur perdera a concentração, permitindo que o argentino se aproximasse. De tal forma que a mesa agora se esvaziava com equilíbrio, bolas eram encaçapadas de ambos os lados. O nervosismo não permitia que qualquer dos oponentes se impusesse e terminasse o jogo de uma vez. Erravam-se tacadas fáceis, e em lances mais difíceis, algumas vezes, ocorriam pequenos milagres. A torcida seguia as emoções do jogo como o par de uma dança excitante, com rompantes de alegria e momentos de decepção, a depender das afinidades, e à medida que se reduzia quase a zero o número de bolas, a tensão atingia o ápice.
Os derradeiros movimentos eram a partir de então acompanhados por um silêncio profundo. A bola branca batia com violência nas outras, ninguém queria deixar de graça os últimos lances ao adversário. Além dela, só mais duas restavam no tapete verde. Na vez de Jorge, o futuro médico conseguiu pôr na caçapa a penúltima esfera e ainda deixou a branca numa posição perfeita para finalizar a última – a preta. Um murmúrio percorreu o ambiente, cabeças viraram para não ver e, sobretudo, para não ter que desembolsar quantias financeiras já estratosféricas. Arthur recostou-se no banco alto, segurando o taco encostado no chão, entre os dois pés, a ponta na direção do teto. Delphine segurava seu braço. Cochichavam-se comentários técnicos. Jorge se concentrava, a boca contraindo-se em meia palavra dita para si mesmo.
Contaria mais tarde que refletira bastante sobre aquela jogada pouco antes de executá-la. Deveria colocar suavemente a bola, como exigia, certamente, a situação, ou finalizar com violência, para causar um efeito na plateia? A proximidade da vitória, o rush de sangue que lhe correu pelas veias foi decisivo: terminaria com uma forte batida de mão esquerda (era canhoto), tomando cuidado, claro, para posicionar o taco de maneira a que a bola branca não seguisse a preta no buraco, mas retornasse de onde partira. Posicionou-se. Jorge pôs a mão direita firme sob o taco, fazendo um “v” com o polegar e o indicador, ao passo que com a esquerda movimentava, num pêndulo preciso e concentrado, o instrumento da vitória.
Tudo ocorreu muito rápido – muito mais do que o ritmo de qualquer narração. A pancada veio violentíssima, acompanhada por um estalo característico, mas decuplicado em intensidade sonora, e pelo grito de Delphine: nom de Dieu! A bola branca não se movera um milímetro. Não é que Jorge não a tenha tocado, ao contrário: acertou-a em cheio, justo onde queria, mas ela se manteve ali, imóvel, sólida como uma rocha, e o resultado foi o estudante sofrer o imediato contragolpe daquela imponente inércia: foi jogado para trás com a mesma força que havia usado para atacá-la, o taco partindo-se em dois e o jogador caindo de costas no chão, não sem antes atropelar uma cadeira, cujos quatro pés se quebraram como frágeis palitos de fósforo.
O estrondo de um trovão fez tremer os alicerces do Bar do Borges. Era a gargalhada dos torcedores, misturada a copos estilhaçados no chão e a gritos ensurdecedores de gozo incontido. Riam a plenos pulmões, apontando para o infeliz, como teriam feito de alguém que vissem tropeçar e cair no meio da rua. O argentino, estatelado no chão com as mãos apoiadas para trás, olhava o pedaço de madeira partido com ar assustado. Fixando a bola branca percebeu, pela primeira vez e antes do seu lendário desmaio, que o desenho que nela fizeram eram dois olhinhos pretos e uma boca. Os olhos o encaravam; a boca sorria.
Bruno Mendonça
sábado, 1 de dezembro de 2018
Retrato de Família - Laura Loyola
Retrato de Família é uma das vinte obras expostas em ILUSTRADORAS! - Exposição Coletiva, que estará na Galeria SESC Engenho de Dentro até o dia 25 de janeiro de 2019. Essa exposição, elaborada pela iniciativa Do Feminino na Arte, traz ilustrações com temáticas e técnicas variadas para que a visão particular de cada ilustradora possa ser evidenciada sem imposições aos seus processos criativos.
Período da Exposição
25/10/2018 - 25/01/2019
Horário de Funcionamento
Ter a Sex – 09h a 21h
Sáb e dom – 09h a 18h
Faixa Etária: Livre
Entrada: Gratuita
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