terça-feira, 14 de novembro de 2023

Thereza, um poema de Guilherme Zarvos

Visito minha mãe no Jardim Botânico
Faz dois anos que ela morreu
Parece que faz uma vida
Tenho tanta saudade
Das conversas
Do uisquinho, até do barulho nervoso do gelo
O excesso de uísque ajudou a matá-la
Pena que os excessos matem
Já conheci quem morreu de amor
De excesso e falta

A árvore que eu e minha irmã escolhemos para
              depositar suas
Cinzas não tem nada de excepcional
É um Tiliacea da Malásia
Ela me parece velha
Foi um descuido espalhar as cinzas numa
Árvore que pode tombar logo
Mesmo antes da minha morte
Me parece um canto agradável
Ela deve estar contente no céu
Estou aqui na terra

Depositar cinzas de cremação no Jardim Botânico
É proibido. Tirar fotos de casamento pode
Imagino se todos depositassem seus mortos no
Jardim Botânico se assemelharia ao Ganges
Todo humano deveria passar uma tarde
Olhando uma cremação do Rio Ganges, na Índia
Depois de pôr fogo no morto, com a presença da
Família, com um pedaço de pau dilaceram-se os
Ossos e o crânio que são muito resistentes ao
Fogo. Tudo é calmo e sagrado. As cinzas vão para o rio

Minha mãe não sofreu muito ao morrer
Eu e minha irmã ficamos contidos. Nossa família é
Assim. Fatalista. Já me falaram que é um resquício
Aristocrático. Sempre nos orgulhamos da
República. Em volta da Tiliaceae nasceram cogumelos
Cada vez que visito minha mãe tem novidade
Em volta da árvore. Minha mãe está sempre
Presente e o chão sempre apresenta surpresas
Os cogumelos formam um ajuntamento
              como uma ninhada
Do meio salta uma flor! É da raça das Therezas.

Guilherme Zarvos

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