janelas são objetos que me atraem e acabo por fazer
associações: janela e cinema, janela e fotografia, janela e televisão, janela e
rua. eu gosto de entrar no ônibus e sentar na parte de trás pra ver todo o
corredor, mas melhor ainda é a ultima janela do lado oposto ao motorista - é
sala de cinema em movimento. centésimos de segundo, as pessoas ficam mais
bonitas vistas de relance, sem reconhecer os fatos e organizar as formas.
vejo as coisas passando e fico querendo passar com elas. chovia e o transito
estava mais denso que o comum na cidade. eu estava sentada na ultima janela do
lado oposto, como prefiro, mas a chuva não deixava a abrir. desenhei um
quadrado com o embaçado e aquele era o filme passando na minha frente, em dupla
exposição. na verdade eu já começava a me aborrecer com o transito quando você
me baixou das nuvens – foi a melhor cena do filme que nunca vi. não sou supersticiosa
e não acredito em amores a primeira vista, mas aquele quadro ploungée da janela respingada do ônibus
era o teu melhor retrato. o ônibus parecia imóvel em meio a todos os outros
carros. quis descer e ficar na sua altura. te ver dormir, sem te despertar. nessas
horas queria ser touro e não câncer, pra não ter que me rasgar mais. essa
aparição instantânea que existiu um só instante foi o suficiente para você nem
olhar pra mim até que o sinal abrisse de novo, sem nem ainda, sem nem ao
menos...
Mariana Lenzi
Nenhum comentário:
Postar um comentário