quinta-feira, 14 de abril de 2011

A puta

.
Sonho com um príncipe encantado. Sempre sonhei em estar perto de um homem que me tratasse bem, bonito, cavalheiro. Esse é meu desejo mais aberto, minha verdade mais divulgada. Nasci feia. Não tem jeito. Eu era um bebe feio, depois fui uma criança feia, continuei sendo uma adolescente feia e hoje, sou uma jovem feia. E sou feia não de gorda nem de torta, sou feia por proporções. Questão de relação entre nariz e boca, orelha e olho, peito e bunda. Não combino. Sou uma criatura que Deus fez com pressa.

A vida me permitiu adaptar-me aos homens de segunda categoria. Sou aquela que recupera os pedaços quebrados dos rejeitados. Sou a dona do colo que cala o choro de tantos meninos perdidos, envergonhados, medrosos. Não cabe, a mim, julgar com desdém aqueles que, como eu, nasceram assim, abaixo do normal. Nunca neguei um rapaz sequer. Estendo meus braços, para todo homem que busque carinho, afeto, prazer. Minha flor provém com todo o néctar que qualquer homem, renegado pelo mundo, precisar.

Todo homem que namorei, perdi. Talvez por ser puta, talvez por ser santa. Mesmo tendo pena do pobre que me enamora, mesmo sabendo e ignorando suas disfunções, suas deformidades, suas mais grotescas falhas, mesmo sendo um sacrifício aturar a criatura que se atrelava a minha carne tal qual carrapato, nunca fui eu quem terminei. Sempre cuidei, amei, sempre! Acredito que sou o fundo do poço. Sou o fim da linha. A partir de mim os homens se reconstroem. Eles renascem e me deixam.

Não posso negar o cansaço. Viver a espreita de um homem bom é duro. E olha que nem planejo tomá-lo para mim, do mundo. Nem casar, nem nada. Quero só ser adorada uma noite. De verdade. Que ele esteja triste, que ele esteja desolado! Mas que me queira! Meu sonho eterno como puta e como feia é ser desejada por um homem puro e bom. Ter um ser belo, cuidando, com o toque, meu corpo. Deixar-me ser guiada por um cheiro limpo de homem bom. Ah! Que isso seja por uma noite! Não queria mais do que isso. Sei que é pedir demais. Mas peço que seja! Quero estar banhada de gozo e suor daquele que vai fazer minha vida valer a pena. Preciso, quero, sonho, demais.

Mas sei que não é assim. Já me acostumei à ideia da miséria, da migalha... Ao menos tenho homens para que eu satisfaça. Homens ralos, de beijos duros, de mãos grossas, de vozes ou fracas ou roucas... Fedendo à cachaça, querendo minha graça, chorando de vergonha, querendo minha fidelidade, me ligando com saudade, me largando na sarjeta, esquecendo a gorjeta ou até pagando extra! Tanto faz. Não é o dinheiro que me agrada. Gosto mesmo é de ser amada.

Ah! Que nada... Tem vezes que eu até esqueço o que fazer com a vida. Eu sigo sem guia. Sou feia. Sou aquela. A sobra. A outra opção. Eu sou aquela que tem amor. E que quer ser como deus e ser fiel a todos que me amam. Pois sei, sou pouco, mas sou o consolo. Sou eu quem salvo aqueles que são o resto. O mundo é cheio de resto. Eu só quero um consolo... Sou pouca coisa, mas sou tudo que posso oferecer. Queria salvar o resto. Queria ser salva. Acho que o resto é feito para o resto. Deve ser isso. Dê a Cesar o que é de Cesar, dê aos feios o que é dos feios.
.
Thiago David
.

Um comentário: